TRADUÇÃO SIMULTÂNEA
NILO Emerenciano – Arquiteto e escritor Dia desses fiz uma atividade com jovens, uma experiência muito boa, a meu ver.
NILO Emerenciano - Arquiteto e escritor
Dia desses fiz uma atividade com jovens, uma experiência muito boa, a meu ver. Lá pras tantas falei uma palavra pouco usual - idiossincrasias - e percebi a garotada trocar olhares. Imediatamente emendei, manias, hábitos, excentricidades, esquisitices. Mais adiante cometi um ato falho ao me referir às mensagens de WhatsApp como torpedos. Risadagem geral. Pois é, expliquei, rindo também, sou
meio dinossauro mesmo.
Um garoto mais atrevido perguntou se eu era do século XIX. Mas aí entrei no modobrincadeira:
- Menos, um pouco menos. Mas sou sim, do tempo em que os dedos da mão eram o mindinho, seu vizinho, maior de todos, fura-bolos e cata-piolhos.
-Verdade, professor?
-Sim, e o cata-piolhos servia também para cafunés, o melhor remédio contra insônia que existe.
Consegui enfim, conquistar a atenção da galera.
- Professor, como era o namoro nesse tempo?
-Meu filho, começava com o flerte.
Mais risadas. Pois é. E antes era fazer a corte, vejam nos livros de Machado de Assis. A menina olhava de soslaio, o rapaz ia e vinha como um galo cego, até criar coragem de se aproximar. Depois foi a paquera. Hoje tudo rola nas redes sociais, nos sites de encontros, não é? O resto ia depender dos pais das moças. As mais recatadas namoravam em casa, primeiro na sala, sob olhares vigilantes do pai, mãe e irmãos. Depois evoluía para o muro (os muros eram baixos) e aí já rolava uns amassos.
Dependia da ousadia e criatividade do rapaz dar um jeitinho para ficar a sós com a menina e explorar a sua geografia aos poucos. Os mais venturosos tinham um fusca que chamavam carango, com tala larga,
kadron, toca-fitas, e se arrumavam ali no apertadinho, a alavanca da marcha atrapalhando, mas nada que impedisse a explosão de desejos contidos. Vocês não imaginam, eu disse, o avanço que foi o advento dos anticoncepcionais e dos motéis.
-Professor, e falavam gírias?
- Sim, meu rapaz. Algumas ainda hoje são usadas, outras caíram em desuso. É uma brasa, mora! Garota papo firme. O que vocês chamam “vazar” era passar sebo nas canelas, cair fora, se mandar, desocupar o beco. Aliás, canelas eram os tornozelos, chamados também cambitos. Assustados ou bailes eram o que hoje se conhece por balada. E balada era um gênero musical apenas. Amassos eram sarro, pegação, lustra-fivela.
Passando abacaxi, pois tomei leite, queria dizer sai dessa, não estou a fim ou coisa parecida. “Pão” era alimento, mas também um cara sarado. Fulano é um pão! “Barra limpa” queria dizer sem problema, descolada. “Papo firme” é fácil de entender, alguém de boa conversa ou de palavra.
No interior diziam: a palavra do compadre é como tiro de rifle. Já a de fulano é um risco n’água.
“Baurete” querendo dizer “umzinho”, “jererê”, "baseado” ou outras coisas mais, foi criado de supetão por Tim Maia. Em Bauru, no palco, desesperado por fazer a cabeça, dirigiu-se a plateia:
- Ninguém tem aí um…, uma presença…, um…baurete? E viralizou.
Aliás, viralizou quer dizer que a notícia correu nas redes. Antes era nas colunas sociais de Paulo Macedo ou Jota Epifânio. Ou já se comentava na calçada do Café São Luís de saudosa memória. Sacou? Ou precisa que eu desenhe? História ou relato, tornou-se narrativa. Mentira ganhou ares de fake.
Tiração de onda é bullying. Ah, bons tempos em que preto era preto, branco era branco e a mulata era a tal. E imaginem, não existem mais os bons e velhos cães vira-latas, pau pra toda obra e ótimos companheiros. Agora são SRD (sem raça definida). Eita, essa mania por siglas.
Flopar quer dizer fracassar. A gente dizia boiou, dançou. Ah e o que chamam “crush” já foi um dia amizade colorida. Ou um excelente refrigerante. Cafona, careta, mauricinho ou patricinha, alienado, são todos mais ou menos a mesma coisa, sendo que alienados eram os que não se tocavam, por algum motivo, para os rumos políticos do país.
O engraçadinho se meteu:
- Professor, o que era mauricinho?
Boa pergunta. Mauricinho era o careta, arrumadinho, cabelo bem cortado, calças de nycron, camisa “volta ao mundo”, tênis. Vocês hoje chamariam nerd, acho. Enfim, aquele jovem que as mães adoravam.
Ia esquecendo de falar nas serenatas. Dois ou três rapazes se reuniam e iam cantar na calçada em frente da casa das garotas visadas. As vezes o pai da moça abria a porta, oferecia alguma coisa e se juntava aos cantores improvisados. Outras vezes era diferente. O pai ofendido saia e perguntava, como aconteceu com meu amigo Azeitona:
- Quem tá tocando violão aí? Azeitona, modesto, disse que era ele, mas que não tocava, apenas arranhava e a resposta veio na bucha:
-Pois vá arranhar o c(*) da mãe!!! A carreira foi grande na madrugada fria.
Gostei do papo com a rapaziada. Passaria o dia inteiro. Me despedi e ainda tive que responder uma última pergunta:
- Professor, esses tempos eram bons?
- Sim, meu rapaz, sim. Foi do balacobaco!
Que crônica maravilhosa. Lembrei o tempo de jovem em Mossoró. Não volta mais . Adorava serestas s assustados. Tinha também o costumes de organizar tardes dançantes nas,casas dos amigos. As vezes a gente não avisava chegava de surpresa. Devia chamar-se assustados .precisavam ver as caras de assustados dos que recebiam a gente