Tá descansando, heim, corno véio?
Valério Mesquita – Escritor Nos anos 60, a feira livre do Assu era mais desenvolvida e frequentada por feirantes de Angicos, Afonso Bezerra, Augusto Severo e vizinhanças.
Valério Mesquita - Escritor
Nos anos 60, a feira livre do Assu era mais desenvolvida e frequentada por feirantes de Angicos, Afonso Bezerra, Augusto Severo e vizinhanças.
O misto de Petronilo, um chevrolet gigante, rodava lotado, cobrindo o mato de poeira, mas à tarde estava de volta. Os feirantes soltavam pilhérias com quem cruzava.
O velho Neo Pinto, morador do sítio Quixabeirinha, todas as tardes, tirava uma soneca no alpendre à beira da estrada. Murilo Caiana, um passageiro presepeiro, gritava sempre: “Tá descansando, heim, corno véio?”. O riso era geral e a viagem prosseguia.
Um dia, o caminhão furou um pneu a poucos mais de quinhentos metros da casa de Neo Pinto. O grito de “corno véio” ainda ecoava no ar. Neo Pinto levantou da rede, apanhou uma espingarda calibre 36 e aproximando-se do caminhão, cumprimentou: “Boa tarde, pessoal!”. Responderam uníssonos: “Boa tarde!”. O velho interrogou: “Eu queria saber quem é o f.d.p. que grita toda vez: ‘Tá descansando corno véio?’. Todo sábado eu escuto isso!”.
E engatilhando a arma: “Fala gente! Quem grita isso?”. Ninguém falou. “Vamos bando de cornos!”, gritou Neo, já irado. “Não tem homem, não?”.
Todos olharam para Murilo Caiana, cobrando uma atitude. O engraçado, amarelo de medo, tentou remendar: “Meu patrão, quem falou foi eu... Porém, o senhor entendeu errado. Eu digo assim: Tá descansando, heim, corpo véio?”.
E ainda, meio trêmulo, concluiu: “O senhor desculpe. Daqui pra frente, não digo mais nada”.
A merda descia no mocotó…