O crossover Tarcísio e Cuoco

março 12, 2023

Alex Medeiros – Jornalista e escritor [alexmedeiros1959@gmail.

Alex Medeiros - Jornalista e escritor [alexmedeiros1959@gmail.com]

No último dia 10 deste fevereiro, contei parte da história da novela Cavalo de Aço, de 1973, quando as férias de Janete Clair na Globo permitiram que a Tupi assaltasse o sagrado horário das 20h com o talento de Ivani Ribeiro na trama de Mulheres de Areia. Encerrei a crônica dizendo de outra história no retorno de Clair, que para recuperar o ibope perdido juntou os astros Tarcísio Meira e Francisco Cuoco numa mesma aventura que ela intitulou O Semideus.

A novela estreou em agosto daquele 1973, meio século atrás, um mês depois de Daniel Filho, o diretor da produção de shows e novelas da Globo, dizer ao Jornal do Brasil que a emissora buscava conquistar um padrão cinematográfico nas telenovelas. E para isso, foram filmadas cenas no México (novelas A Rainha Louca e Sangue e Areia), em Veneza (A Ponte dos Suspiros), em Roma (O Cafona), em Paris (Selva de Pedra) e em Nova York (Carinhoso).

O Semideus, que viria a ser a primeira novela do gênero policial da Globo, entrou no ar em agosto de 73 com a missão de resgatar a audiência que a Tupi havia carregado na trama das gêmeas Ruth e Raquel, um show de Eva Wilma.

A emissora não poupou esforços, investiu pesado na superprodução, com filmagens em Portugal, e até usou a artimanha de Ivani Ribeiro com Eva Wilma, dando a Tarcísio Meira dois papéis, Hugo Leonardo e Raul de Paula.

Francisco Cuoco era o jornalista investigativo Alex Garcia, disposto a desvendar as sujeiras do império empresarial da família de Hugo. Aquele embate dos dois grandes astros da Globo era a aposta contra a concorrência.

Por coincidência, ou não, em 1973 o jornalista Alexandre Garcia, aos 33 anos, faria sua primeira reportagem internacional cobrindo a crise política no Uruguai. Oriundo do Jornal do Brasil, tinha o perfil semelhante ao Alexandre de Cuoco.

Um elenco de peso compunha O Semideus, com Glória Menezes, Yoná Magalhães, Nívea Maria e Maria Claudia sombreando a rivalidade entre Tarcísio e Cuoco. E tinha ainda Juca de Oliveira, Stênio Garcia e Miriam Pires.

Não foi fácil para Janete Clair tecer sua trama, tendo que enfrentar a censura federal, ao ponto de mudar por duas vezes o próprio título da novela, que primeiro se chamaria “O Selvagem”, depois “Cidade Nua”, até passar no crivo.

A autora voltou tão disposta a reinar de novo no horário das 20h que fez questão de interferir também na escolha da trilha sonora, temendo outro desastre como aconteceu em Cavalo de Aço. E convidou duas feras musicais.

Galã, Tarcísio Meira ajudou a popularizar motos com personagem de novela

Telefonou para o violonista Baden Powell e o compositor Paulo César Pinheiro (que dali dois anos casaria com Clara Nunes) e os chamou à sua casa. Eles foram dos primeiros a ler a sinopse da novela, e ela pautou todas as músicas.

Janete explicou que tipo de canção queria para cada personagem, confiava na pegada da dupla, pois era fã das canções feitas a partir de 1968 para os discos de Elis Regina. Havia alguma coisa pronta, mas a maioria foi feita pra novela.

A trilha sonora nacional transitava entre a bossa nova e o samba. Na faixa internacional, uma miscelânea de baladas românticas com Steve Wonder, Etta James, Marvin Gaye… E “Another Song”, que virou abertura do Jornal Hoje.

Uma curiosidade no enredo de O Semideus envolveu a atriz e comediante Renata Fronzi, a eterna irmã do Bronco (Ronald Golias). Seu papel de professora de dança influenciou garotas e fez abrir escolas de dança no país.

Quem teve participação na novela foi a potiguar Gracinda Freire (nossa maior atriz), que só aceitou o papel de Juventina desde que não atrapalhasse as gravações de Aladim e a Lâmpada Maravilhosa, filme dos Trapalhões que foi lançado naquele 1973. O RN deve a Gracinda um tributo do seu tamanho.

Gracinda Freire  com Castro Gonzaga e
Ary Fontoura em O Semideus 
Gracinda Freire

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