O adeus de Manassés

março 5, 2023

Alex Medeiros – Jornalista e Escritor [alexmedeiros1959@gmail.

Alex Medeiros - Jornalista e Escritor [alexmedeiros1959@gmail.com ]

A cultura potiguar ainda está sob o impacto da partida precoce do compositor e cantor Manassés Campos, falecido na última segunda-feira (27/02). Uma sombra de luto desceu sobre seus colegas de música, de jornalismo, de geração. Foram inúmeras notas de pesar das entidades culturais, como Fundação José Augusto, Conselho Estadual de Cultura, Funcarte, Academia Macauense de Letras e Arte e até o ABC FC (futebol é arte), o time do coração do compositor.

De uma geração mais jovem que a minha, Manassés compôs um agrupamento de talentosos artistas que ocuparam a cena musical natalense na alvorada dos agitados anos 1980. Na época, bicho noturno, eu vi sua tribo comandar as baladas das noites de Natal, os ritos das canções e a gana por cavar seus espaços no contexto. Uma profusão de bares fez história graças aos cantos e encantos daquela meninada invadindo palcos e conquistando seus públicos.

No meio dos anos oitenta, quando matava a saudade de casa ouvindo cantores dos movimentos Lira Paulistana e New Wave nas noitadas de São Paulo, rememorava as resenhas ao som da geração de Manassés na cidade-mãe.

Algumas vezes, nas jam sessions dos botecos do Bexiga e dos sebos de Pinheiros, espocava na lembrança os shows de Cleudo, Cida Lobo, Antônio Ronaldo, Sueldo, Raquel, Romildo, na Praia dos Artistas e Vila de Ponta Negra.

anassés Campos - Foto: Tribuna do Norte

E quando aquela saudade batia, compartilhava com alguns amigos, como Lincoln Moraes e Lenilton Teixeira, rabiscando besteiras e cometendo poemas em superfícies, de celulose ou não, encontrando Natal nas coisas sudestinas.

Na terça-feira, um fato deu maior dimensão à ausência de Manassés, um episódio incrível protagonizado por seu parceiro Galvão Filho, que por coincidência também é meu parceiro há zil anos. Uma história que me arrepiou.

No último dia 2 de fevereiro, Galvão recebeu dois áudios enviadas por Manassés pelo WhatsApp. Era uma resposta a uma encomenda feita exatamente um ano atrás, em 2 de fevereiro de 2022. Vejam que fantástico. 

O irmão caçula de Babal havia encaminhado ao agora saudoso parceiro um poema para que Manassés avaliasse e encontrasse a melodia adequada. Quem acessar a Jovem Pan News no YouTube pode ouvir os dois áudios.

Manassés conta que só naquele instante, com um ano de atraso, decidiu musicar a poesia. Parecia uma satisfação de quem não podia mais esperar para cumprir o compromisso. Diz que buscava “a estética musical de Galvão”.

E encerra o primeiro áudio dizendo que “a canção agora é do mundo, está aí”. Uma linda balada romântica, com uma pegada de xote ao gosto do parceiro. E depois veio a outra incrível coincidência, a ideia de um título para a música.

Galvão Filho me pede sugestão e também ao jornalista e compositor Roberto Homem, lá em Brasília. E separados por quase 1.800km e alguns minutos de diferença, nós decidimos por “Guardei Saudade”, termo contido nos versos.

Manassés com Roberto Homem - Foto: Sem Leriado

Eis a poesia de Galvão Filho que Manassés musicou (na foto, ambos com o compositor Rambolde Campos, do Amapá). É a sua última canção, um adeus de um artista que fez da música parte fundamental da sua vida.

Quando tu me tocas, me abro em janelas
No imaginário pinto o nosso amor
E a lua cigana, clara, branca e bela
De braços abertos vejo o redentor
Nunca feche a porta deixe o sol entrar
Eu te quero inteira aqui no coração
Se brinco com acordes pra melodiar
Brindo o que há em nós aqui nessa canção
Te dou meu sorriso sempre que te vejo
Interessa o agora, não o que passou
Marcas que ficaram, deixe no passado
Não deixe passar o bom do nosso amor
Joguei fora a tristeza e guardei saudade
E a felicidade me arrodeou
Teu amor é fonte de toda alegria
Teu amor me ensina o que é o amor.
Foto: Típico Local

Uma resposta para “O adeus de Manassés”

  1. Didi Avelino disse:

    Sou só saudade desse mais que amigo, irmão que a vida me deu.
    Partida precoce, perda irreparável para a música, para o esporte, para a cultural do nosso estado,e, especialmente, para nós, parceiros privilegiados da sua inteligência.
    Manassés Campos, um homem do bem e da luz.