Crônica do Retorno

agosto 4, 2024

Raimundo Brasileiro Augusto – Poeta residente na Casa da Pedra Oca (Praia de Camurupim/RN) Todo retorno é estranho! Quase nada no mesmo lugar.

Raimundo Brasileiro Augusto - Poeta residente na Casa da Pedra Oca (Praia de Camurupim/RN)

Todo retorno é estranho! Quase nada no mesmo lugar. As cores são outras, as janelas mudaram de forma, estão descoradas, foscas!

Voltando a São Paulo/SP após tantos anos, deparei-me com um vazio das minhas memórias!

O concreto é mais cruel que o de antes!

A praça deixou de ser apenas da Sé, e agora é também dos zumbis desesperançados, de mãos vazias, que rogam abraços acolhedores do padre Júlio e de outros corações amorosos que os acolhem e amparam.

Senti saudade ao caminhar na calçada do Teatro Municipal para ir tomar um chopp no Redondo. Olhei para o lado e cadê José Ramos Tinhorão naquela mesa cativa, rascunhando suas críticas musicais polêmicas e nacionalistas?

Desisti e desejei ir ao Parreirinha, só para relembrar os amigos poetas Franklin Maxado Nordestino, Hilton Acioli e Marcelo Soares, este último, com a alegria contagiante por ter ilustrado "O Bordado e a Pantera Negra", de Ariano Suassuna e Raimundo Carreiro.

"O Parrerinha sucumbiu, a clientela apavorada ante o caos, subiu pela Augusta!", me informou o garçom.

Tudo naquele pedaço deixou de fazer sentido para mim. Maxado, Hilton e Marcelo também se foram pelas veredas de volta às suas aldeias: Maxado para saborear carne de sol com pirão de leite em sua fazenda de Feira de Santana. Hilton para novas descobertas musicais, saboreando ginga com tapioca, em Natal e Marcelo para sentir a brisa pura das Mangabeiras de João Pessoa.

Subi a Consolação rumo à Paulista. Buscava qualquer pedaço prazeroso do passado, como se isso fosse possível.

Nem a bisteca do Sujinho me consolou, apesar de preservar o delicioso sabor acompanhada da inesquecível salada de repolho.

Fui até a Augusta, atalhando caminho pela rua Luiz Coelho. Cadê o Sebo do Cosme na Galeria?

Ninguém deu notícias!

Fui tentar um respiro em Pinheiros.

Cadê o Lira Paulista na Praça Benedito Calixto?

Voltei para a Consolação.

Não marquei hora no Riviera Bar com Vanderlei, meu parceiro de trabalho, pois este já se foi dessa! A mesa estava no mesmo lugar, quieta e vazia. Pedi um conhaque e entalei. Gotas salobras de lágrimas me chegaram aos olhos.

- Bebi a sua dose, sem graça, sem gosto, meu caro amigo. Nem Juvenal estava mais com a gravata borboleta desajeitada, para nos divertir com graças, gentilezas e presepadas provocando a criatividade de Angeli e embrigando Rebordosa, madrugada adentro.

Um largo e imenso vazio de esperança me abateu.

O Pacaembu está mudo, sem os gols do Casão, sem a elegância dos dribles do Magrão.

Aquele fim de tarde bateu em mim como marteladas nos olhos.

A voz poética das ruas perdeu a língua de tanto enfado.

Acabou o Língua de Trapo e só o tecladista e compositor João Lucas com suas crônicas maravilhosas, nesse admirável e frio mundo virtual, tem me acenado com elegância e generosidade.

Gastei sola pelos becos e ruas de Pinheiros e da Vila Madalena, sem arrego e sem Arrigo Barnabé, com seus Tubarões Voadores.

- Cadê a Clara Crocodilo?

- Sei lá, deve ter voltado para Londrina enfiada em uma sacola!

Téo Azevedo, o cantador de Alto Belo/MG, partiu antes do combinado, não teve tempo para a feijoada da madrugada na rua Aurora. Agora dedilha a viola e aboia os versos de Guimarães Rosa, nos Sertões encantados dos céus das Gerais.

Só me restaram o consolo e a graça do escritor e livreiro Alberico Rodrigues com sua verve nordestina no Espaço Cultural da Praça Benedito Calixto e a lucidez elegante e irreverente de Casagrande trucidando os "Seus Demônios", na Livraria da Vila!

Voltando para casa, trouxe na bagagem a minha "Canção do Silêncio", meu coração impresso em livro, editado pela Árvore Digital, sob a direção do competente professor de comunicação e escritor Edu Dieb, um novo amigo!

Já estou de volta à Casa da Pedra Oca, na minha praia de Camurupim!

Aqui, a vida é carregada de esperanças, curtindo minhas netas, meus escritos, minha nobre e doce labuta agrícola, minha praia, tal como nos versos do meu querido amigo Hilton Acioli: "Sem medo de ser feliz!"

Praia de Camurupim - Nísia Floresta RN - Foto Rota de Viagem

3 respostas para “Crônica do Retorno”

  1. Elza Maria Freire disse:

    Excelente crônica! Parabéns, Raimundo, pelo lançamento de mais um livro, que com certeza merece chegar à Livraria da Cooperativa Cultural da UFRN e à Livraria Manimbu da Fundação José Augusto, que primam pela divulgação dos escritores Norte-Rio-Grandenses.

  2. Raimundo Brasileiro Augusto disse:

    Bom dia,querido amigo José Alves!

    Grato por tanta generosidade de sua parte!

    O alerta, desde o c começo, a décadas, foi e continua sendo um referencial na comunicação, mesmo após tantos jornais impressos terem sucumbido pós internet.

    Meu amigo, você um grande e competente guerreiro!

    Abraço!

    Obrigado,amigo!

  3. Raimundo Brasileiro Augusto disse:

    Meu querido amigo, feliz com tanta generosidade de sua parte!

    Obrigado!

    Estou por aqui, teimando em ser feliz, ouvindo o mar de Camurupim e leio esse disparate imenso e belo que você enviou!
    Abraço, meu querido José Alves!

    *Feliz de mais da conta por ter publicado minha crônica!