Nilo Emerenciano - Arquiteto e escritor

Benjamin Franklin (1706-1790) é um ícone dos EUA. Foi tipógrafo, editor, cientista, diplomata, inventor, escritor, fundador de bibliotecas, além de ter participado ativamente da luta pela independência, sendo considerado um dos pais da pátria e tido sua efígie colocada na nota de cem dólares. 

A certa altura da sua vida ele resolveu, segundo conta, se tornar um homem melhor.  “Foi mais ou menos nessa época que concebi o ousado e árduo projeto de chegar à perfeição moral. Desejava viver sem cometer falta alguma em tempo algum.” Pretensioso? Talvez, mas ele não se limitou a traçar o projeto. Colocou em ação um programa de vida. Elencou várias qualidades que ele achava necessárias ao desenvolvimento da boa moral.

E explicou o que significavam e porque as escolhera: Temperança, Silêncio, Ordem, Resolução, Frugalidade, Diligência, Sinceridade, Justiça, Moderação, Limpeza, Tranquilidade, Humildade – e nesse item ele explicitava:  Imitar Jesus e Sócrates.

Daí riscou uma planilha em um caderno com os dias da semana de um lado e na outra coluna as virtudes desejadas. Abriu o caderno com uma anotação de Paulo aos Filipenses: “Tudo o que é verdadeiro, tudo o que é honesto, tudo o que é justo, tudo o que é puro, tudo o que é amável, tudo o que é de boa fama, tudo o que é virtuoso e louvável, seja tudo isto o objeto de vossos pensamentos."

E acrescentou uma prece, apesar de não ser vinculado a nenhum credo religioso: "Pai da luz e da vida, Deus supremo! Ensina-me o que é bom; salva-me da loucura, vaidade e vício, de todas as atividades baixas; e enche minha alma de conhecimento, paz consciente e virtude pura; bem-aventurança sagrada, substancial e eterna!"

Passou então a agir. Diariamente marcava na planilha as qualidades em que falhara e ao fim da semana, verificado qual tinha mais cruzes, passava a exercita-la com mais vigor. Fazia isso o ano inteiro. E afirma ter tido a alegria de ver as cruzes irem desaparecendo aos poucos. Afirma também dever à essa prática o sucesso da sua vida.

Aparece no século seguinte entre as personalidades Imortais que elaboraram a Codificação Espírita organizada por Allan Kardec como aparece assinado nos Prolegômenos em o Livro dos Espíritos, “João Evangelista, Santo Agostinho, São Vicente de Paulo, São Luís, O Espírito de Verdade, Sócrates, Platão, Fénelon, Benjamim Franklin, Swedenborg, entre outros.”

Interessante observar que na questão 919 da obra, Santo Agostinho afirma, mais de sessenta anos depois, ao falar sobre autoconhecimento: “Fazei o que eu fazia, quando vivi na Terra: ao fim do dia, interrogava a minha consciência, passava em revista o que fizera e perguntava a mim mesmo se não faltara a algum dever, se ninguém tivera motivo para de mim se queixar. Foi assim que cheguei a me conhecer e a ver o que em mim precisava de reforma.” Fascinante, não, as simetrias?

Porque falo em Benjamin Franklin e Santo Agostinho, no primeiro dia do ano? Certamente porque é o dia em que muitas pessoas traçam determinações: perder peso, malhar, aprender uma língua, guardar alguma grana, ler um livro que espera há meses, fazer aquela viagem, conviver com os filhos, ser uma pessoa melhor...  Muito embora logo nos primeiros meses do ano essas ideias possam se esvanecer, alguma coisa fica dessas boas intenções.

Então, porque não traçar nosso programa? Me atrevo a fazer algumas sugestões.

1. Ler ao menos um livro a cada dois meses. Estão acessíveis nas livrarias, na Estante Virtual, Amazon, e nos sebos da cidade. Mais uma dica: esqueça aquela lista dos mais vendidos da Veja. Aquilo é treta. Converse com os amigos, peça orientação aos livreiros ou sebistas. consulte o Google. Aos poucos você vai formando suas próprias preferências.
2. Vá ao cinema pelo menos uma vez por mês. Não podemos alegar falta de salas já que os shoppings dispõem de várias. Se puder, prefira a telona à Netflix, mas se preferir, compre pipoca, junte a família ou amigos em casa e curta o que talvez ainda seja a maior diversão.
3. Esqueça a aranha do bolso e de vez em quando vá a um bom restaurante. Vale a pena. Melhora o nosso humor e o apetite. E não falo de fast food, e sim do velho e bom la carte. A praça da alimentação das feiras também é uma boa se você tem gostos simples. Tem galinha torrada, carne guisada, carneiro, cuscuz, tapioca, macaxeira e, como antigamente, uma garrafa de vodca cheia de farinha de Brejinho. Sem falar naquele suco de mangaba super gelado que é vendido ali junto.
4. Se cerque de amigos. Depois da família, amigos são a coisa mais importante. Não seja exigente pois todos têm defeitos, inclusive você. Aprenda a ouvi-los e busque entendê-los.
5. Dê risadas e cultive o bom humor. Faz bem para a saúde, para a alma, para todos que o cercam. Não se leve muito a sério e ria de si mesmo. Nada mais desagradável do que uma cara fechada. Não se inspire em “seu” Lunga e sim em Fafá de Belém.
6. Exerça sua religiosidade. Perceba que não falo de religião institucionalizada, e sim daquilo que se passa em seu coração, esse sentimento inato que temos um criador de quem somos infinitamente devedores. Lembre-se, portanto, de agradecer e não pergunte pelo motivo. Agradeça por tudo, literalmente tudo! Tire alguns minutos do seu dia para isso, seja lá quais forem suas convicções. Se não tem Deus, agradeça à evolução, ao átomo, às algas azuis, ao big-bang.
7. Pense e faça alguma coisa pelos outros. Agora, já! Dentro dos limites de suas possibilidades, claro. Escute alguém. Empreste o ombro. Elogie, aconselhe, oriente, ampare. Saiba decodificar os sinais dos que precisam pois nem sempre as pessoas sabem expressar suas carências. Esteja disponível pois somos todos irmãos. Cuide-se. Mexa-se. Exercite-se. Zele pelo seu corpo e pela saúde. Você vai partir como todos, mas vai ter uma vida saudável e morrer cheio de saúde.
8. Amplie sua área de interesses. História, política (não confundir com politicagem), artes, filosofia, esportes. Abra a cabeça para tudo, principalmente para os pensamentos divergentes pois a gente aprende com eles. Faça projetos sempre, pois a vida está continuamente recomeçando.
9. Esteja atento, abra os olhos, levante a cabeça, olhe em redor, abra-se às possibilidades, veja o mundo a sua volta, respire fundo, e corra: um mundo novo se mostra à sua frente.
10. Por fim, mas não menos importante, veja o ano que começa hoje com otimismo, confiança e fé. Vai ser um ano melhor, com certeza, até porque, pior do que 2022 com todas as suas agruras, incertezas, lutas e dificuldades é impossível de acontecer.

Feliz ano novo para todos nós!!!