Resoluções de ano novo (de novo)
Cefas Carvalho – Jornalista e Escritor – Texto publicano no Portal Saiba Mais Então é assim.
Cefas Carvalho - Jornalista e Escritor - Texto publicano no Portal Saiba Mais
Então é assim. Começa um novo ano e lá vamos nós com a inevitável e famigerada lista de resoluções de ano novo. Eu mesmo já fiz muitas, desde a juventude. As primeiras, na flor da juventude, pareciam tratados de utopia, de tão cheio de sonhos que eram.
Recordo entre os dezesseis e dezenove anos, de listas de resoluções que incluíam viajar para a Índia e me banhar no rio Ganges. Ou viajar de carona de Natal para o Uruguai. Claro que no fim do ano eu me sentia satisfeito se passasse de ano letivo e fizesse alguma viagem bacana com os amigos. Mas no ano seguinte lá vinham mais resoluções de ano novo que incluíam Veneza, ser guitarrista de banda de rock, virar ciclista etc.
Veio então a vida adulta, as idiossincrasias da idade e das circunstâncias (casamento, filhos, comprar imóvel etc) tornaram as resoluções de ano novo mais pragmáticas, mas ainda assim carregadas de uns delírios intelectuais. teve ano que inclui na lista ler toda a obra de García Márquez e Vargas Llosa. Em outro, anotei o plano de assistir um filme por dia, totalizando 365 ao final. Claro que não consegui realizar nada disso, e fui me dando por satisfeito em fazer o que era possível.
Essa percepção, de que vivemos e fazemos com base no que é possível, não no que é ou seria ideal (ou seja, o que queremos) ficou consolidada na minha ideia de virada de ano. Certo, uma nova órbita da terra no sol tem seu simbolismo (e gosto de simbolismos) mas como diz a canção de Humberto Gessinger, “o último dia de dezembro é sempre igual a primeiro de janeiro”.
Ou não, como diria Caetano. Para além da festa do réveillon, que proporciona encontro com gente bacana, comida, bebida e fogos de artifício (para gente hedonista essa junção de coisas é sedutora demais) a possibilidade de um marco temporal para passar a régua e, digamos, recomeçar algo, ainda que internamente, é tentadora e oportuna.
Mas como conciliar os possíveis simbolismos com a realidade nua e crua? Com bom senso e sem planos irreais, suponho. Nas modestas resoluções dos últimos anos, anoto o que considero que seria bom para mim, sem mais precisar números e meta, como se numa empresa ou desafio. Sei que em 2024 li menos livros que gostaria e poderia, portanto a meta para 2025 é ler mais, sem detalhes numéricos ou auto cobranças. Idem em relação a filmes, tanto no cinema como em streamings. Resoluções abstratas também não entram mais. Não arrisco mais “ser mais tolerante” ou “ter o pavio menos curto”. Atualmente não fazer bobagem grande e não magoar pessoas queridas me é o suficiente.
Tem a parte prática ao extremo das resoluções. Comprar uma frigideira nova. Um novo ventilador. Trocar os talheres. Limpar os livros da estante. Não acumular boletos. Essa parte, por sinal, me lembrou de excelente texto da amiga querida Carlota Nogueira publicado no portal Papo Cultura, de título “Entre promessas e boletos: a arte de sobreviver ao fim de ano” na qual ela fala “do peso das expectativas, o fardo das listas intermináveis e a eterna sensação de que o tempo escorreu pelos dedos” e também que “a verdade é que confundimos organização com garantia de sucesso. Fazemos listas e metas como CEOs de nossas vidas, mas o universo opera como um estagiário de marketing: confuso, criativo e, às vezes, catastrófico”.
No fim do texto Carlota propõe “para 2025, uma abordagem diferente: em vez de planejar o que quero, vou listar o que não quero mais”. Adorei e pretendo também adotar. Talvez seja mais fácil (ou menos difícil) operar com o que não queremos mais do que com o que desejamos. Afinal, querer por querer, eu desejo passar o mês de fevereiro entre Paris e Roma. Desconfio que meu orçamento de jornalista e escritor não permitirá esse pequeno luxo. Mas – como listou Carlota – eu posso não querer em 2025 na minha vida gente tóxica e/ou mentirosa. Ou não querer certos tipos de amizades ou contatos. Ou sair de grupos de zap cujo conteúdo e postura dos membros me desagradam. E por aí vai.
Resoluções únicas de ano novo, portanto: trabalhar com o possível, não com o ideal. Levar a sério tanto o que não quero como o que quero. Ah, ler mais. Ver mais filmes. Manter boletos em dia. Talvez entrar na academia (não de letras, mas de ginástica, já que ideia não é ser imortal e sim saudável).
E feliz ano novo para todos nós!