O poeta da piada sonora

abril 2, 2023

Alex Medeiros – Jornalista e escritor [alexmedeiros1959@gmail.

Alex Medeiros - Jornalista e escritor [alexmedeiros1959@gmail.com ]

Há dois fatos que diferem o agora saudoso Juca Chaves dos demais artistas vitimados pela censura nos anos de regime militar. Ele teve músicas proibidas antes mesmo de 1964 e, ao ser exilado, só voltou quando quis e não quando o então governo João Figueiredo abriu os aeroportos para o regresso da turma da MPB. Foi um pioneiro na crítica política, um caçador de presidentes desde 1957, quando abriu as baterias colocando na mira o Juscelino Kubitschek.

Nos anos 1970 foi expulso de Portugal pela ditadura de Salazar. Fazia enorme sucesso no país, sendo cultuado entusiasticamente pelos estudantes de Lisboa e Coimbra. Foi colocado às pressas num navio com destino a Londres, auxiliado material e financeiramente por Raul Solnado, um dos maiores ícones do humorismo luso. Dessa época, brincava dizendo que não ganhou o que os exilados brasileiros ganharam: “Vi alguns tomando champanhe com lagosta”.

Juca Chaves começou a carreira no alvorecer da bossa nova, aos 19 anos, e por algum tempo foi considerado pela mídia um integrante do movimento, apesar de um repertório de modinhas, decorado com piadas de humor cínico.

O apelido de “Menestrel Maldito”, que ganhou em 1968, aos 30 anos, virou um selo que o identificava como crítico dos presidentes da República. Aliás, já em 1968, ano do AI-5, lançou um LP com o título “O Disco das Músicas Proibidas”.

Juca Chaves - Foto: Folha Ilustrada

Nas décadas de 60 e 70, Juca era figurinha carimbada no mercado fonográfico, nos auditórios de TV, nas capas de revistas e nos álbuns ilustrados, dividindo páginas com os ídolos da Jovem Guarda e das novelas.

Quando Eder Jofre, o maior pugilista do boxe nacional, viajou em 1960 para conquistar o título mundial de Peso Galo, nos EUA, revelou o conteúdo da mala: levava 15k de café e os discos de Juca Chaves e de Nelson Gonçalves.

No mesmo ano, Juca surpreendeu os fãs e a cidade de São Paulo com um coquetel de lançamento do disco “Tô Duro” em pleno Viaduto do Chá. Foi chamado de Mister Bossa Nova e comparado a Mário Reis e João Gilberto.

Na minha adolescência sua estampa era presença constante em programas televisivos como os de Flavio Cavalcanti, Chacrinha, Jota Silvestre. A canção “Take Me Back To Piaui” era cantada nas rodas de violão da Rua Mário Lira.

Após os anos de Europa, retornou ao Brasil em 1982, bem depois dos perdoados da Lei da Anistia, encontrando o país respirando os ares democráticos com a campanha para governador. E já cantou João Figueiredo. 

Diferente do que diz grande parte da imprensa, não foi Vinicius de Moraes quem o apelidou de “Menestrel Maldito”, mas o jornalista gaúcho Flavio Alcaraz, que cobriu a Guerra do Vietnã e chefiou nossas rádios na Copa 1970.

Em 1974, Jô Soares fez piada quando estreou na TV o seriado O Homem de Seis Milhões de Dólares. “O ator Lee Major inteiro vale seis milhões e o nariz do Juca Chaves vale sete milhões”. Em 1960 Juca fez um gordo seguro nasal.

Como ele explicou tantas vezes, um menestrel critica com condescendência do rei. E por várias vezes, os alvos presidenciais receberam com naturalidade as piadas e as canções satíricas. Em mais de 60 anos, bateu de Juscelino a Lula.

Acumulou além de dezenas de discos e livros, mais de 80 músicas censuradas e outras 40 proibidas. A última imagem marcante que tenho dele foi em 2015 na campanha pelo impeachment da Dilma, a “presidenta” piada pronta.

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