O país do vale tudo
Alex Medeiros – Jornalista e Escritor (@alexmedeiros1959) Texto publicado na Tribuna do Norte Muita coisa mudou no Brasil e no mundo desde 1988.

Alex Medeiros - Jornalista e Escritor (@alexmedeiros1959) Texto publicado na Tribuna do Norte
Muita coisa mudou no Brasil e no mundo desde 1988. O que verdadeiramente não mudou foi a corrupção, a desonestidade e a canalhice como marcas na índole dos poderosos e de uma classe média dissimulada. Também não mudou a pureza e a inocência de alguns brasileiros que resistem à degradação agarrados em valores morais e éticos cada vez mais corroídos pela maioria.
A crítica do jornal Estadão avaliou a estreia da novela Vale Tudo dizendo que se o primeiro capítulo fosse um cidadão brasileiro, seria um isentão. O remake que a TV Globo está exibindo às 21h, uma hora mais cedo do que a trama original que foi ao ar em 1988, foi fiel ao roteiro do trio Gilberto Braga, Aguinaldo Silva e Leonor Bassères e até repetiu posicionamentos e tomadas.
Sem saudosismo ou sectarismo geracional, digo que a manutenção da base narrativa do texto pregresso é um acerto da autora Manuela Dias e seu exército de redatores. O que não creio é que o elenco atual repetirá o show do anterior.
O tecido sócio-político do Brasil digital de agora é o mesmo do Brasil analógico dos anos 80, mergulhado numa crise econômica e refém da violência urbana, dos crimes de colarinho branco e da corrosão dos sentimentos de honradez.
O Jornal do Brasil, então um dos maiores diários brasileiros, fez trocadilho com o apelido de Regina Duarte e estampou na capa do caderno cultural “A Humilhadinha do Brasil”, tamanho o sofrimento de Raquel e a reação do povo.
Num elenco enriquecido com Antônio Fagundes, Renata Sorrah, Reginaldo Faria, Nathalia Timberg, Adriano Reys, Cássia Kis, Marcos Palmeira, Lília Cabral, Daniel Filho, Lídia Brondi, ainda houve Segall como Odete Hoitman.
Uma das grandes estrelas da TV brasileira, Beatriz Segall dimensionou o poder financeiro e moral de Odete, cuja fortuna foi espelho e sonho da pilantra Fátima em sua sede de ascensão social. O país parou quando Odete foi assassinada.
Discípulo confesso de Janete Clair, a maga da dramaturgia, Gilberto Braga usou o recurso que ela usou em 1977 matando Salomão Hayala (Francisco Cuoco), em O Astro. “Quem matou Odete Hoitman?” se antecipou aos memes.
Daniel Filho e Denis Carvalho dirigiram Vale Tudo e foram supervisionados por Boni, que deu grandes pitacos, inclusive rejeitando a sugestão de título, Pátria Amada, já que havia um filme homônimo, da cineasta Tizuka Yamazaki.
A presença de Glória Pires e Lídia Brondi, duas ninfetas em Dancin Days (1978), marcou o reencontro dez anos depois. Foi de Solange (Brondi) que Fátima (Pires) roubou o namorado rico e neto da poderosa Odete Hoitman.
Durante toda a trama, o mau-caratismo de Fátima tinha a cumplicidade de César (Carlos Alberto Riccelii), o bonitinho e ordinário modelo publicitário que a irá acompanhar até no casório com um príncipe gay com interesse no rapaz.
Vale Tudo jogou na sala e na cara do telespectador a essência de Macunaíma, o imortal herói sem caráter do poeta Mário de Andrade e o juntou com outro personagem canalha, o servidor público Palhares, de Nelson Rodrigues.
A trilha sonora era o retrato da época, com Gal Costa e Caetano Veloso gravando especialmente para a novela as canções “Brasil” (de Cazuza) e “Isto Aqui o Que É” (Ary Barroso), e Cazuza consagrando “Faz Parte do Meu Show”.
Um dia chamaram um grande cineasta de corajoso por uma temática abordada em seu filme. Ele respondeu que era só ousadia, porque coragem mesmo é pensar num remake de Cidadão Kane ou Casablanca.
Entendo o medo da magnífica Regina Duarte com a versão de Vale Tudo. Eu vi o que ocorreu com as releituras dos clássicos Irmãos Coragem, de Janete Clair (1970), e A Barba Azul, de Ivani Ribeiro (1974), ambos da saudosa TV Tupi.

A corrupção esta sim, se profissionaliza, se qualifica, se aprimora em todos os sentidos e na política não é diferente.
É, a vida como ela é! Choromingues para aqui, choromingues para lá. O fato é que a corrupção foi escancarada e não assusta mais ninguém, embora alguns poucos se indígnem e essa indignação não cause espanto, a vida continua. Mas não se pode fechar os olhos.
É, a vida como ela é! Choromingues para aqui, choromingues para lá. O fato é que a corrupção foi escancarada e não assusta mais ninguém, embora alguns poucos se indígnem e essa indignação não cause espanto, a vida continua. Mas não se pode fechar os olhos à essas escabrosidades.