Tadeu Oliveira - Jornalista e Sociólogo

Embora não seja de ficar em cima do muro, tenho santa dúvida sobre minha devoção em Macau: Nossa Senhora da Conceição ou Nossa Senhora dos Navegantes. 

Parece escore de pleito eleitoral com definição em segundo turno, mas está muito além disso. Entre uma e outra fico com as duas santas - uma pelo histórico das correntezas marítimas e outra pela fidelidade dos fieis terrestres, plantadores de pilares de sal marinho.

Festa de padroeira é um misto de emoção, religião, cultura e paixão. Eu sou devoto no olhar e pisar da terra. Em Acari, fico com Nossa Senhora Da Guia; em Natal, sigo firme com Nossa Senhora da Apresentação; e como bom brasileiro, Nossa Senhora de Aparecida.  Acompanho missa e sermão dominical direto da Basílica do Santuário Nacional, em Aparecida do Norte (SP).  A homilia de Dom Orlando Brandes é uma catequese viva e eficaz.

Bem, voltando para o recanto de terra mais amável do país, como cito no texto do livro “Água de Grau”, a padroeira de Macau – território que um dia, talvez, venha a ser diocese ou prelazia – é Nossa Senhora Imaculada da Conceição, não posso rezar diferente desse catecismo. 

Perfeito, festa inscrita no calendário litúrgico do catolicismo para ser comemorado em 8 de dezembro, o que ampliamos como a concepção da Virgem Maria. 

Para a Nossa Senhora da Conceição de Macau, a fé do seu povo na Santa padroeira pode ter começado lá no mercado chinês, pois a Macau de lá também celebrava culto à Imaculada da Conceição no passado.  

Diferente da China, nossa Macau acolhe Imaculada da Conceição e na pluralidade da fé também acolhe hoje Nossa Senhora dos Navegantes.

É pena que toda essa história de devoção entre a Macau de cá e a Macau de lá não gere turismo religioso internacional. Já que todos falam a mesma língua – na linguagem da fé, basta querer e entusiasmar sobre o tema. 

Procissão é alimento que fortalece a fé do povo.

E com todo esse fortalecimento, em 15 de agosto, navego em outros mares, pegando ondas marítimas na maré de Nossa Senhora dos Navegantes. 

Como observador do comportamento humano, percebo que a procissão fluvial revela mais o sentimento religioso do povo de Deus. Os cristãos são vistos rezando mais, quem sabe, devido o contato com a grandeza da natureza presente nas profundezas das águas do Rio Açu e do Oceano Atlântico.

Na procissão terrestre, por sua vez, os fiéis caminham cantando, rezando e sem perder olhares nos celulares e nos possíveis buracos que aparecem, uma vez outra, pelas ruas e becos de Macau. 

Padroeira parece ter sempre a mesma história para contar, em cada cidade, em cada estado, em cada pais. 

Os fiéis macauenses também não contam outra história. Eles têm o poder de dominação motivado pelo mundo do trabalho - diferenciado e elitizado - pelo capitalismo que resultou no acumulo de riqueza dos marítimos e da luta pela sobrevivência de homens e mulheres da labuta salineira. 

Então, uma santa para cada segmento social, embora que o sentido cristão revela a mesma santa Maria, casada com José, e mãe de Jesus, o filho que Deus enviou ao mundo.