Juiz Eleitoral julga ação contra Zé Figueiredo e Bruno Dantas improcedente e arquiva os autos

dezembro 2, 2024

O Juiz Eleitoral da 7ª Zona, Pedro Paulo Falcão Júnior, julgou improcedente os pedidos da Ação de Investigação Judicial Eleitoral, proposta pela Coligação “Esperança e Trabalho” , liderada pelo então candidato Severino Rodrigues (MDB) que denunciou a candidatura da chapa José de Figueiredo Varela e Bruno Berckmans Carvalho Dantas, candidatos a prefeito e vice-prefeito no […].


O Juiz Eleitoral da 7ª Zona, Pedro Paulo Falcão Júnior, julgou improcedente os pedidos da Ação de Investigação Judicial Eleitoral, proposta pela Coligação "Esperança e Trabalho" , liderada pelo então candidato Severino Rodrigues (MDB) que denunciou a candidatura da chapa José de Figueiredo Varela e Bruno Berckmans Carvalho Dantas, candidatos a prefeito e vice-prefeito no município de São José de Mipibu/RN, nas eleições de 6 de outubro de 2024, por prática de abuso do poder econômico/político.

Na sentença, o magistrado diz que, "... em consonância com o Ministério Público julgo improcedente os pedidos autorais, extinguindo o feito e solicitando que seja arquivado os presentes autos".

Veja a sentença expedida pelo Juiz Eleitoral:

SENTENÇA

I. RELATÓRIO

Trata-se de Ação de Investigação Judicial Eleitoral, proposta pela Coligação Esperança e Trabalho em face de José de Figueiredo Varela e Bruno Berckmans Carvalho Dantas, candidatos a Prefeito e Vice-Prefeito no Município de São José de Mipibu/RN, por prática de abuso do poder econômico/político, nos termos do artigo 22, caput e inciso XIV, da Lei Complementar Federal nº 64/90.

Aduz a parte autora que, a partir do ano de 2023 (pré eleitoral) e no ano de 2024 (ano eleitoral) ocorreu, na prefeitura de São José de Mipibu/RN, um aumento exponencial de contratações temporárias de servidores, com suposta influência sobre o pleito eleitoral deste ano, favorecendo os investigados.

Sustenta que além das aludidas contratações terem sido realizadas sem autorização legal, configura verdadeiro instrumento de compra de apoio político, na medida em que apoiadores do candidato Severino Rodrigues mudaram de lado para aderir à campanha do candidato adversário José Figueiredo, ora investigado, mediante farta distribuição de cargos e contratações temporárias.

Como documento de comprovação anexou aos autos vários relatórios e outros expedientes, requerendo, ao final, a aplicação de multa, cassação do registro de candidatura ou diploma e a declaração de inelegibilidade dos representados.

Em contestação de IDs 122529514 e 122529515, os investigados impugnaram a documentação supostamente fornecida pelo TCE/RN, disponibilizada através de link para drive do escritório de advocacia "CORTEZ & MEDEIROS" na nuvem, além do rol de testemunhas, por estar acima do número permitido pelo normativo legal.

Sustentaram que o aumento das contratações objeto da inicial se deu em razão do aumento dos serviços ofertados pela municipalidade, respaldadas por autorização legal capaz de albergar os cargos criados e as contratações temporárias firmadas.

Sobre o incremento dos serviços públicos oferecidos, elaboraram gráficos, tabelas e juntaram vários relatórios das secretarias envolvidas, demonstrando o aumento dos atendimentos disponibilizados à população.

Sobre a permissão legal para as contratações temporárias, anexaram normativos (anexo 7) que autorizam o município a contratar por tempo determinado em caso de decretação de calamidade e emergência, devidamente reconhecida, em quantidade que não exceda a um inteiro, acrescido de cinquenta por cento do número de servidores efetivos, permitindo ao município a contratação de até 1.164 temporários, uma vez que o quadro de pessoal da prefeitura é formado por 776 servidores efetivos.

Salientaram que desde novembro de 2023 até o presente momento, em razão das fortes chuvas registradas, está em vigor o Estado de Calamidade Pública reconhecido pelos Decretos Executivos nº 062/2023 e 010/2024 (anexo 8) e por ato dos Governos Estadual e Federal por meio da Portaria nº 3.991/2023 (anexo 9).

Afirmaram, ainda, que São José de Mipibu durante todo o período da gestão (2021-2024) esteve inserido em estado de calamidade pública, quer pela pandemia do coronavírus, quer pelas chuvas que assolaram o município, o que atraiu a incidência da Lei Municipal nº 798/2003, de modo que, excepcionalmente, ficam estas contratações desobrigadas de obedecer às vedações de prazos contidas no rol da Lei Orgânica Municipal (parágrafo único do art. 3º, Lei nº 798/2003).

Sobre a alegação de abuso de poder fundado na distribuição de cargos e contratações temporárias, visando persuadir servidores a mudarem de lado, que teria começado no ano de 2023, massificando-se em 2024, rechaçaram a tese afirmando que não há mínima demonstração de qualquer tipo de pressão sobre os contratados em troca de apoio político/eleitoral e que a mera juntada de prints de redes sociais mostrando alguns eleitores manifestando preferência por José Figueiredo não é comprovação bastante. Aduziram também que é fato público e notório que o gestor José Figueiredo perdeu a maioria da bancada governista na Câmera de Vereadores, inclusive do Vice-Prefeito, que até pouco tempo era apoiador da reeleição do atual Prefeito e que mudou de lado, e nem por isso se está formulando acusação de abuso de poder, visto que trata-se de conduta natural no plano democrático.

Por fim, pugnaram pela improcedência da presente AIJE em todos os seus termos.

Em manifestação à contestação (ID 122573911), a parte investigante informou que a réplica seria apresentada por ocasião das alegações finais e solicitou que o TCE/RN fosse oficiado para envio da documentação objeto da inicial diretamente ao Juízo da 7ª Zona.

Manifestação do Ministério Público pelo prosseguimento do feito, com posterior aprazamento de audiência de instrução (ID 122617272).

Decisão de ID 122885318 determinando a expedição de ofício ao TCE/RN requerendo o envio de cópia documentação enviada ao causídico do investigante, ou seja, da relação de servidores contratados temporariamente.

Após juntada aos autos da Documentação enviada pelo TCE/RN por meio da certidão de ID 122926447, a parte investigante requereu a designação de audiência de instrução. No mesmo compasso, a parte investigada defendeu a regularidade do número de bolsistas contratados constante da documentação encaminhada pelo TCE/RN, embora esta não fosse objeto de acusação da inicial.

Despacho de ID 122985656 designando audiência de instrução para o dia 18/11/2024.

Petições de IDs 123419641, 123419597, 123419779 e 123419789, substabelendo novos procuradores e lançando contraditas às testemunhas arroladas pela investigante.

Em audiência de instrução e julgamento (ID 123422759) para oitiva das testemunhas arroladas, foram ouvidas quatro testemunhas da parte investigante, tendo sido solicitada a dispensa das testemunhas de defesa pela parte investigada.

Nas alegações finais de ID 123438840, a investigante, além de ratificar todos os argumentos e documentos contidos na inicial, explicou a diferença entre o número de contratos apresentados na listagem anexada à inicial e aquela apresentada pelo TCE, destacando o número elevado de contratações no mês de junho/2024 em comparação com o mês de maio/2024. Também chamou a atenção para os elevados salários praticados, conforme detalhado em planilha ao final da manifestação.

Já os investigados, nas alegações finais de ID 123446037, além de repetir os argumentos expostos na contestação, impugnaram os números de contratações temporárias trazidos pela investigante, alegando que os dados apresentados não são oficiais e que, portanto, não comportam credibilidade, na medida em que foram produzidos unilateralmente no intuito de induzir o juízo a erro.

Como comprovação da alegada divergência, juntaram declaração da coordenadoria de pessoal com o quantitativo real de ASGs contratados e apontaram a repetição indevida de vínculos de um mesmo servidor na relação fornecida pelo TCE/RN, o que pode resultar na multiplicação artificial do número de contratados e de valores lançados em folha.

Por fim, o representante do Ministério Público apresentou suas alegações finais (ID 123458042), manifestando-se pela improcedência da Ação de Investigação Judicial Eleitoral, diante da ausência de provas mínimas a demosntrar uma possível prática de abuso de poder político ou econômico pelos dos representados no pleito eleitoral de 2024.

É o relatório. Decido.

II. FUNDAMENTAÇÃO

A priori, cumpre destacar que o caso em exame não se submete aos prazos previstos no art. 7º da Resolução TSE nº 23.608/2019. Conforme as disposições do parágrafo segundo desse dispositivo, as representações especiais, dentre as quais a AIJE, submetem-se ao rito do art. 22 da Lei Complementar nº 64/90. Sendo assim, se determinado prazo vencer em feriado, como ocorreu no dia 20/11, prorroga-se para o primeiro dia útil seguinte, nos termos do art. 224 do CPC.

Busca a Investigante imputar aos Investigados, mediante o reconhecimento da captação ilícita de sufrágio, a aplicação de multa, a cassação do registro ou diploma e a declaração de inelegibilidade, pela prática de abuso de poder econômico e/ou político, nos termos do artigo 22, caput e inciso XIV, da Lei Complementar Federal nº 64/90.

O cerne da questão consiste em averiguar se houve a prática de abuso de poder econômico/político mediante o uso da máquina pública, para realizar contratações excessivas de servidores temporários sem amparo legal no Município de São José de Mipibu, configurando cooptação em troca de apoio político aos investigados nas eleições de 2024.

A questão em discussão é regrada pela Constituição Federal e pela Lei Complementar nº 64/90. Dispõe o art. 14, § 9º da Constituição Federal que:

Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para exercício de mandato considerada vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta.

A Lei Complementar nº 64/90, que regulamenta o comando constitucional acima transcrito, dispõe no inciso XVI, do art. 22, que:

Art. 22. Qualquer partido político, coligação, candidato ou Ministério Público Eleitoral poderá representar à Justiça Eleitoral, diretamente ao Corregedor-Geral ou Regional, relatando fatos e indicando provas, indícios e circunstâncias e pedir abertura de investigação judicial para apurar uso indevido, desvio ou abuso do poder econômico ou do poder de autoridade, ou utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, em benefício de candidato ou de partido político, obedecido o seguinte rito:

(...)

XIV – julgada procedente a representação, ainda que após a proclamação dos eleitos, o Tribunal declarará a inelegibilidade do representado e de quantos hajam contribuído para a prática do ato, cominando-lhes sanção de inelegibilidade para as eleições a se realizarem nos 8 (oito) anos subsequentes à eleição em que se verificou, além da cassação do registro ou diploma do candidato diretamente beneficiado pela interferência do poder econômico ou pelo desvio ou abuso do poder de autoridade ou dos meios de comunicação, determinando a remessa dos autos ao Ministério Público Eleitoral, para instauração de processo disciplinar, se for o caso, e de ação penal, ordenando quaisquer outras providências que a espécie comportar.

XVI - para a configuração do ato abusivo, não será considerada a potencialidade de o fato alterar o resultado da eleição, mas apenas a gravidade das circunstâncias que o caracterizam”. (Grifei.)

Dessa forma, o abuso de poder político ou econômico que caracteriza conduta passível de punição em Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE) é aquele que se reveste de gravidade, conforme a dicção do inciso XVI do mesmo artigo 22, o que não restou demonstrado no caso sub judice, conforme será demonstrado no decorrer da fundamentação.

Sob essas premissas, adentrando no plano fático concreto em apreço, a Representante alega que, na qualidade de gestor da Prefeitura Municipal de São José de Mipibu, o primeiro Representado, José de Figueiredo Varela, candidato à reeleição ao cargo de prefeito, teria realizado contratações de servidores temporários em número excessivo e sem a observância dos requisitos legais, em especial, a partir do ano de 2023, intensificando-se no ano eleitoral de 2024.

Sustenta que as contratações têm nítido propósito eleitoreiro e foram utilizadas para angariar apoio político ou persuadir servidores que já tinham declarado apoio ao candidato da investigante Severino Rodrigues a "mudar de lado" e aderir à campanha do candidato adversário José Figueiredo.

Fundamenta suas alegações em planilhas obtidas junto ao TCE/RN e disponibilizadas em meio virtual nos arquivos intitulados de "AIJE contratos denúncia" e "relatório portal da transparência", além de postagens de fotos na rede social Instagram fazendo referência a servidores que em determinado momento estavam do lado da oposição, mas, após terem sido beneficiados com supostos contratos temporários ou gratificações, passaram a apoiar o lado da situação.

Destaca que, examinando a folha de pagamento enviada pelo TCE/RN, consta-se uma evolução dos vínculos temporários da ordem de 106 servidores em 2021 para 643 em 2024 e que esse último número representa quase o dobro dos vínculos observados no ano de 2023 (344 servidores). Essa afirmação encontra-se demonstrada por meio de tabela inserida na inicial (ID 122474123, pgs.13 e 14). Na página de nº 15 deste mesmo evento/ID, esses dados foram atualizados para constar que, até o início de julho/2024, o número de servidores temporários avançou para 821 versus 512 servidores efetivos.

Em resposta às alegações postas na inicial, os investigados justificaram o aumento das contratações em razão do incremento no número de atendimentos à população, conforme demonstrado por meio de gráficos e tabelas inseridas no bojo da contestação, além de anexar vários relatórios de secretarias detalhando em que áreas ocorreu esse aumento de demandas assistenciais, de forma a respaldar o aumento dos contratos administrativos e afastar a vinculação com o pleito então vindouro.

No que tange à legalidade, os investigados sustentaram que agiram dentro dos limites da lei, citando vários normativos, dentro os quais a Lei Municipal nº 798/2003 e 1.280/2022.

Convém destacar que, segundo as disposições da Lei nº 798/2003 (ID 122529526, pags. 35-36), em havendo decretação de estado de calamidade, o Município de São José de Mipibu está autorizado a contratar pessoal por tempo determinado (art. 2º); o prazo máximo dessas contratações é de 1 (um) ano, podendo ser prorrogado por igual período (art. 3º); o número de contratos temporários não pode exceder 150% do número de servidores efetivos (art. 4º); as contrações serão precedidas preferencialmente de processo seletivo ou, no mínimo, de análise curricular (art. 5º).

Às fls. 31-34 do ID 122529526, encontra-se colacionada a Lei nº 1.280/2022, por meio da qual foi criada uma grande quantidade de postos temporários para fazer face às necessidades de excepcional interesse público, com critérios de seleção a serem aferidos pela capacidade técnica do profissional, mediante análise curricular ou até mesmo de forma direta. Há informações nos autos de que houve decretação de estado de calamidade e reconhecimento da situação de emergência do Município de São José de Mipibu/RN (ID 122529528/122529529).

Em síntese, os investigados admitiram o aumento dos vínculos temporários, porém justificaram esse acréscimo pelo incremento dos serviços e atendimentos prestados pela municipalidade. Destacaram que os números apresentados pela investigante não são fidedignos, na medida em que procura estabelecer comparação desproporcional entre o número de servidores temporários e efetivos, sem guardar correlação com a realidade.

De fato, quando se examina os documentos carreados aos autos pela investigante, constatam-se várias divergências no que se refere ao número de servidores temporários e efetivos.

Um exemplo diz respeito às informações constantes da planilha disponibilizada em nuvem pela investigante (ID 122474126). Ao acessar o link, observa-se na planilha "Servidores por vínculos (1)" que o número de contratação temporária por excepcional interesse público no ano de 2023 é de 1315, enquanto que em 2024 esse número cai para 821, diferentemente da tese por ela levantada de que houve um aumento indiscriminado do número de servidores temporários de um ano para o outro.

Essas discrepâncias podem ser observadas, também, quando se examina os vínculos temporários informados na relação encaminhada a este juízo pelo TCE/RN (ID 122926590). A investigante, em suas alegações finais, explorou com bastante ênfase o aumento "estarrecedor" do número de vínculos temporários entre os meses de maio e junho/2024.

Todavia, quando se examina o documento "Anexo 3. Resposta Unidade Técnica CIEX", verifica-se uma repetição de vínculos de um mesmo servidor a partir do mês de dezembro/2023, estendendo-se essa duplicidade de vínculos para os meses do ano de 2024, à exceção do mês de maio, em que se observa apenas um vínculo temporário por servidor. Possivelmente decorre daí o aumento apontado pela investigante em relação aos vínculos, por exemplo, de Auxiliares de Serviços Gerais, que passaram de 533 em maio para 1086 no mês junho/2024.

Essas divergências também se verificam em relação ao número de servidores efetivos que consta da peça inicial (ID 122474123, pag. 10). Aqui a investigante relata que em consulta à lista do TCE/RN, o número de servidores efetivos em jan/2021 era da ordem de 768, reduzindo para 294 no mês de mar/2024; mais adiante, na pag. 15, do mesmo evento/ID, esse número é atualizado para 512 servidores efetivos no mês de julho/2024. Na contramão dessas informações, a Coordenadora de Recursos Humanos do município declarou que o efetivo era de 737 (dez/21), 757 (dez/22), 794 (dez/2023) e 776 (jul/24) servidores.

Sem sombra de dúvida, as informações extraídas da listagem encaminhada pelo TCE/RN e apresentada sob a forma de tabela/planilha pela representante não se revestem da fidedignidade necessária para o exercício de um juízo de certeza, em razão das inconsistências verificadas.

Com efeito, em razão da falta de consistência e confiabilidade dos números formatados pela investigante a partir da listagem fornecida pelo TCE,  em relação a repetição de vínculos temporários que pode resultar em majoração indevida do número real de contratações temporárias, a higidez e a transparência de todo o arcabouço probatório juntado aos fólios tornam-se enfraquecidas para sustentar as alegações postuladas pela demandante.

Contudo, em que pese a imprecisão dos elementos probatórios colacionados neste caderno processual, tomando-se por base as informações fornecidas pela própria investigante de que o número de contratação temporária por excepcional interesse público atualizado até julho/2024 era de 821 (ID 122474123, pg.15), comparado com os 776 servidores efetivos, mês de julho/2024, declarados pela Coordenadora de RH da Prefeitura (ID 122529523), percebe-se que a quantidade de contratações temporárias não ultrapassou o limite de 150% do número de servidores efetivos, conforme prevê o art. 4º da Lei Municipal nº 798/2003.

Além do mais, as leis municipais que regulam o procedimento de contratação de temporários não exigem a aplicação de processo seletivo simplificado, podendo a escolha ser feita mediante análise curricular do profissional ou até mesmo de forma direta, conforme disposições contidas no art. 5º da Lei Municipal nº 798/2003 c/c art. 2º, § 2º, da Lei Municipal nº 1.280/2022.

Essa incursão sobre a legalidade dos atos praticados quando da contratação de temporários tem mais pertinência à justiça comum, sob a perspectiva de apuração da prática de atos de improbidade administrativa, se for o caso, não fazendo eco na seara eleitoral para os fins propostos pela peça vestibular. A discussão eleitoral, a fundo, a bem da verdade, seria outra, sendo relevante para justiça eleitoral averiguar apenas se tais atos guardam relação com a disputa eleitoral, causando reflexos sobre a paridade de armas entre os candidatos e atingindo a legitimidade, a regularidade e a normalidade do pleito e consequente vício na vontade popular.

Nesse quadrante, não restou cabalmente comprovada a utilização dessas contrações pelos investigados para angariar apoio político no curso da campanha eleitoral. Primeiro, como dito alhures, as informações sobre o número exato de contratações não se revestem de evidente certeza, dadas as divergências apresentadas. Segundo, as postagens em redes sociais, anexadas aos autos, de servidores demonstrando suas preferências políticas, por si só, não são suficientes para caracterizar o uso da máquina administrativa para fins eleitorais, especialmente porque esse comportamento de mudança de preferências políticas aconteceu, no curso da campanha, de ambos os lados, o que solidifica ainda mais o estado democrático de direito em que a manifestação do pensamento e a preferência política são livres.

Noutra senda, como bem pontuou o representante do Ministério Público em suas alegações finais, as hipóteses de compra de apoio político não foram confirmadas pelos depoimentos coletados na audiência de instrução e julgamento, como se verifica da transcrição das declarações das testemunhas a seguir reproduzidas.

A testemunha Valdenilson Alves Miranda, ao prestar depoimento perante o juiz eleitoral, disse QUE:

trabalha no CRAS desde o ano de 2022; já trabalhou na Secretaria de Cultura e sempre exerceu a função de ASG e recebe a quantia de RS 1.306,00; foi indicado para trabalhar na Prefeitura porque sempre elogiaram a qualidade do seu trabalho; no CRAS não há assessoria jurídica, nem advogado, mas sim psicóloga, assistente social, além da coordenadora; havia um grupo de São José de Mipibu e Portal Mipibu, que fazia postagens, havia várias pessoas de bairros diversos; eu postava porque apoiava a campanha de Figueiredo; ele não prometeu nada para mim, mas sim porque gosto do trabalho dele; ele ajuda muitas famílias, pessoas carentes; na enchente ele deu muita força e ajudou muitas pessoas (ID nº 123427478, de 04min22ss até 07min43ss e 123427480, de 00min até 03min19ss).

A testemunha Thiago Inácio Freire da Silva, ao prestar depoimento perante o juiz eleitoral, disse QUE:

começou a trabalhar na Prefeitura no ano de 2020 na Secretaria de Saúde e ficou lotado na UPA, exercendo a função de recepcionista e recebe um pouco mais de R$ 2.000,00, considerando a incidência do adicional noturno; na UPA trabalham de 8 a 10 recepcionistas; Jéssica e Paulo Dantas, recepcionistas e Erickson, na parte administrativa, todos trabalham na UPA; os recepcionistas trabalham na escala de 24h e folga 04 dias; a escala do recepcionista é diferente da escala administrativa, de 24h e pode folgar 3 dias; não tem conhecimento que exista 100 recepcionistas; não conhece a enfermeira Robiana; a segurança da UPA é feita pela Polícia Militar e não fardados, mas nem todos são policiais militares; Amanda Kelly já trabalhou na UPA fazendo plantão de 24h; não conheço a técnica de enfermagem Maria das Graças; quando eu entrei o plantão era de 12h e depois passou para 24h, por isso o aumento salarial; não sabe dizer se há diferença de salário entre os recepcionistas; reconheceu Karrânio; não sabe informar se o prefeito Figueiredo tem uma esposa que é médica; tem conhecimento de que policiais militares, no horário de folga, fazem a segurança na UPA; não sabe dizer se há policiais militares trabalhando pelo município, no horário de folga, tanto na Central do Cidadão, quanto da Defensoria Pública (ID nº 123427480, de 05min10ss até 07min53ss, 123427481, de 00min até 07min35ss e 12347494, de 00ss até 01min10ss).

A testemunha José Clodoaldo Barbosa, ao prestar depoimento em juízo, disse QUE:

conhece por ouvir falar a pessoa de Márcio (camisa verde); conhece Juninho, Kerinho, Figueiredo e Guedes, que no início apoiava Severino; não sabe dizer porque Guedes passou a apoiar Figueiredo; Josimar apoiou Figueiredo por apoio financeiro para o filho, mas não lembro o nome dele; a esposa do atual prefeito é médica e o seu nome é Maria Eunice de Souza, já a viu trabalhando na cidade; não sabe dizer se ela recebe R$ 41.000,00; Karrânio era apoiador de Severino e mudou de lado; o vice-prefeito era apoiador da base de Figueiredo e tem liberdade de votar em quem quiser; não pode afirmar que todas as pessoas que conhece e que mudaram de lado tiveram benefício financeiro; mudar de lado é normal; eu tenho lado, o de Severino; as pessoas que foram citadas nas páginas 5, 7, 8 e 9 mudaram de lado, porque eles eram abertos ao lado de Figueiredo e antes da pré-campanha apenas tiraram fotos com Severino, antes do período eleitoral propriamente dito; Karrânio mudou de lado por contrato; já fui vereador temporário por um mês; sou cidadão que declaro meu voto e luto pelo que acredito; foi oferecido um benefício para mim e não mudei de lado (ID nº 123427496, de 04min45ss até 08min36ss, ID 123427497, de 00min00ss até 07min56ss e ID 12347664, de 00ss até 01min38ss).

A testemunha Carlos Wendel de Oliveira Costa, ao prestar depoimento perante o juiz eleitoral, disse QUE:

havia reclamação sobre a UPA de São José, no que diz respeito ao atendimento, medicamento; tem um blog que expressa opinião política; tomou conhecimento que havia muitas pessoas sendo contratadas desde o ano passado para trabalhar na Prefeitura; nunca fez reportagem na UPA, nem chegou a ir lá, somente respostou o que ouviu; viu segurança no gabinete do prefeito, na secretaria de educação não fardados, mas não sabe se são policiais militares; a esposa do prefeito, Maria Eunice é médica, mas não a viu trabalhando em São José de Mipibu e nem sabe dizer sobre o valor do salário dela; Nelson Rubens não apoiou mais Severino, mas não sabe dizer o porquê, ouviu dizer que há algum contrato; não tem conhecimento que Guedes trabalhou na administração de Figueiredo, mas sabe que ele mudou de lado, a foto eu quem bati e era uma reunião de adesão de Severino; não sei dizer se houve algum benefício para ele mudar de lado para Figueiredo; não tem ideia da quantidade da frota de São José de Mipibu; moro em São José de Mipibu e criei a página Voz do Agreste, criei-a no ano de 2023; mudou o direcionamento para São José de Mipibu; observa-se que, preponderantemente, o blog fala atualmente sobre São José de Mipibu, porque me tornei morador de São José de Mipibu e passei votar aqui, primeiro criei o blog; todas as matérias publicadas no blog tratam de críticas à gestão municipal; falei que talvez tenha havia um benefício para Nelson Rubens ou uma pessoa ligada a ele, não tenho como provar, escutei de populares, mas não tenho como especificar o nome de uma pessoa que tenha feito esta afirmação; vim residir nesta cidade para trabalhar na campanha eleitoral, agosto de 2023, resido na Rua Prefeito Inácio Henrique, 01, Centro, SJM; sou trabalhador informal e trabalho com assessoria, marketing, foi remunerado por Severino no período eleitoral como locutor; não tem parente nesta cidade; não tinha vínculo com o município, veio para trabalhar na eleição; conheci Nelson no ano passado, numa reunião política na comunidade do Mendes, na residência dele e participaram Severino, Norma, Daniel, Nelson Rubens, a esposa e algumas pessoas da comunidade, cujo objetivo era apresentar Severino às pessoas; quando foi blogueiro no ano de 2013 em Monte Alegre, não chegou a fazer postagens ou comentários criticando a gestão da pessoa de Severino, as postagens eram elogiosas à administração (ID nº 123427674, de 03min34ss até 07min46ss, 123427673, de 00min00ss até 07min59ss, 12347675, de 00ss até 07min30ss, 123427690, de 00ss até 07min11ss).

Como se vê dos depoimentos acima, apenas as testemunhas José Clodoaldo e Carlos Wendel confirmaram a possibilidade de alguém, sem indicar sequer um nome, ter recebido benefício para mudar de lado. Bom registrar que ambas as testemunhas são apoiadores do candidato Severino Rodrigues e trabalharam na divulgação de sua campanha. No âmbito desta 7ª Zona Eleitoral foram ajuizadas representações contra elas por divulgação de suposta propaganda fake news ofensiva à honra e a imagem dos investigados. Logo, dado o grau de comprometimento das testemunhas fortemente ligadas politicamente ao candidato Severino Rodrigues (candidato derrotado) o depoimento delas deve ser visto com certa cautela.

Forçoso reconhecer que não se vislumbra a existência de abuso do poder político e/ou econômico enveredado pela suposta compra de apoio político para a eleição no ano de 2024, haja vista que os depoimentos não apontaram provas concretas, mas meras suposições de testemunhas claramente parciais, a ponto de algumas terem trabalhado na campanha do candidato adversário Severino Rodrigues, outra ter movido ação popular contra o representado (José Clodoaldo Barbosa), este inclusive citou casos de troca de candidatos por apoiadores ao longo da campanha, de ambos os lados) e ainda há a testemunha Carlos Wendel de Oliveira Costa, que criou um blog cujo conteúdo se resume a críticas à gestão do atual prefeito, reeleito na eleição deste ano, como bem pontuou o eminente representante do Ministério Público Eleitoral.

Em rigor, no caso em exame, as alegações contidas na peça exordial não foram corroboradas pelos meios de provas produzidos durante a instrução processual, nem mesmo pela documentação encaminhada a este juízo eleitoral pelo TCE/RN, em razão das discrepâncias observadas.

Deste modo não há como reconhecer a captação ilícita de sufrágio mediante a distribuição de cargos a servidores temporários em troca de apoio político. Até porque, para configuração da captação ilícita de sufrágio, é necessário que as condutas descritas no art. 41-A da Lei nº 9.504/97 ocorram entre a data do registro de candidatura e o dia da eleição, circunstância não verificada no presente caso, posto que os fatos descritos na exordial aconteceram antes da data de início do registro de candidatura, portanto, fora do período previsto no referido dispositivo legal.

Se captação ilícita de sufrágio não houve, menos ainda a prática de abuso do poder político e/ou econômico. É que, para caracterização do abuso de poder, diferente da captação ilícita de sufrágio, admite-se a ocorrência de fato pretéritos ao registro da candidatura, contudo a conduta praticada precisar estar revestida de gravidade e de elevada robustez comprobatória, o que não ocorreu no presente caso. Explico.

A sanção de cassação do registro ou do diploma é medida extrema, não podendo se fundar em meras conjecturas. Portanto, a formalização de contratações temporárias, por si só, desacompanhada de conotação eleitoral, não é capaz de atrair o reconhecimento da prática do abuso de poder político/econômico, uma vez que, para caracterização de tal modalidade abusiva, faz-se necessário a comprovação do nexo de causalidade e da gravidade da conduta perpetrada, elementos que não são observados na presente demanda.

Em outras palavras, nos termos do artigo 22 da Lei Complementar nº 64/1990, para a configuração do ato abusivo, não será considerada a potencialidade do fato alterar o resultado da eleição, mas apenas a gravidade das circunstâncias que o caracterizam. Depreende-se, assim, que “a verificação do abuso passou a demandar a avaliação da gravidade das circunstâncias inerentes ao fato em si, ou seja, o desvalor presente diante do bem jurídico tutelado pela norma, no caso, a normalidade e a legitimidade das eleições. Assim, a investigação da prática abusiva não se prende necessariamente a eventuais implicações no pleito, muito embora tais implicações, quando existentes, reforcem a natureza grave do ato” (Recurso Especial Eleitoral nº 25952, Acórdão, Relator(a) Min. Luciana Lóssio, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Data 14/08/2015).

Neste sentido é a jurisprudência dos tribunais:

Contratação de servidores temporários, para exercer funções permanentes em ano eleitoral. Respeito ao período vedado. Exercício de poder-dever pelo administrador público. Licitude da conduta. Capitulação do fato como abuso. Exigência de prova robusta, ausente no caso. Não demonstração de fraude ou desvio de finalidade igualmente reprovável. Não comprovação da finalidade eleitoreira. Não configuração do abuso de poder político. RECURSOS A QUE SE NEGA PROVIMENTO. (TRE/MG, RECURSO ELEITORAL n 11650, ACÓRDÃO de 26/06/2017, Relator ANTÔNIO AUGUSTO MESQUITA FONTE BOA, Publicação: DJEMG – Diário de Justiça Eletrônico-TRE/MG, Data 12/07/2017).

“RECURSO ELEITORAL. REPRESENTAÇÃO. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. ART. 41-A. AUSÊNCIA DE ABUSO DE PODER. CONDUTA VEDADA. NÃO OCORRÊNCIA. RENOVAÇÃO DE CONTRATOS. PRELIMINAR DE AUSÊNCIA DO PRINCIPIO DA DIALETICIDADE REJEITADA. DESPROVIMENTO.

Preliminar de ausência do princípio da dialeticidade rejeitada, uma vez combatidos os fundamentos da sentença. Uma vez não havendo prova irrefutável e robusta, evidenciando a prática do art. 41-A da Lei 9.504/97, há que se reconhecer a não ocorrência do ilícito tipificado, impondo-se o provimento do apelo. Ausência de gravidade para desequilíbrio na disputa importando no não reconhecimento do abuso pretendido. Não restou cabalmente comprovada a contratação de novos servidores em período vedado. As renovações de contratos por excepcional interesse público ocorridas no microprocesso eleitoral não constituem conduta vedada, visto que tratam-se de servidores que já prestam serviço ao município.” (TRE/PB, RECURSO ELEITORAL n 38704, ACÓRDÃO n 116 de 26/07/2018, Relator BRENO WANDERLEY CÉSAR SEGUNDO, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Data 30/07/2018).

AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. CONDUTA VEDADA. NOMEAÇÃO E EXONERAÇÃO DE OCUPANTES DE CARGOS EM COMISSÃO. CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA. CESSÃO DE SERVIDORES PARA TRABALHAR EM CAMPANHA. CONDUTA VEDADA NÃO CARACTERIZADA. AUSÊNCIA DE PROVAS ROBUSTAS. IMPROCEDÊNCIA.

1. Tratam os autos de ação de investigação que alega suposta prática de conduta vedada e abuso de poder político dos investigados.

2. Preliminar de decadência do direito de ação por má formação do litisconsórcio passivo. No presente caso, como a então candidata ao cargo de senadora não se saiu vencedora nas eleições, a única pena passível de ser aplicada é a inelegibilidade, sanção esta de caráter personalíssimo, razão pela qual inexiste óbice ao prosseguimento do feito. Precedentes. Preliminar rejeitada.

3. A teor do disposto no art. 73, V, "a" e "d", da Lei nº 9.504, de 1997, a nomeação ou exoneração de cargos em comissão e designação ou dispensa de funções de confiança, como também a nomeação ou contratação necessária à instalação ou ao funcionamento inadiável de serviços públicos essenciais, estão ressalvadas da vedação estabelecida na legislação eleitoral.

4. In casu, não há prova de que as nomeações para os cargos em comissão ou os contratos temporários foram irregulares e nem mesmo realizados durante o período vedado, bem como, inexistem provas de que ocorreram apenas para beneficiar as candidaturas dos investigados, então candidatos ao pleito de 2022.

5. De outra monta, para a configuração da conduta vedada inserta no art. 73, III, da Lei nº 9.504/97, faz-se necessário a prova de utilização de servidor, em atos de campanha eleitoral de candidato, partido político ou coligação, e, ainda, cumulativamente, que essa atuação ilícita tenha ocorrido durante o horário normal de expediente, o que não restou minimamente comprovado nos autos.

6. Inexistindo qualquer elemento probatório que demonstre ter havido sequer a conduta vedada descrita na inicial, não há que se falar em abuso de poder político.

7. AIJE que se julga improcedente. ((TRE/PA, AIJE nº 060266220, ACÓRDÃO nº 34479 de 07/11/2023, Relatora Des. José Maria Teixeira do Rosário, Publicação: 14/11/2023.

RECURSO ELEITORAL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. ELEIÇÕES 2020. ANÁLISE DOS FATOS SOB A ÓTICA DE CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. CAPITULAÇÃO JURÍDICA DIVERSA. POSSIBILIDADE. SÚMULA 62 DO TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL. ART. 41-A DA LEI Nº 9.504/97. NÃO CANDIDATO. ILEGITIMIDADE PASSIVA. GRAVAÇÃO AMBIENTAL. LICITUDE. FLAGRANTE PREPARADO. NÃO CARACTERIZAÇÃO COOPTAÇÃO DE ELEITORES. ILÍCITO A SER PRATICADO DURANTE O PERÍODO ELEITORAL. NÃO COMPROVAÇÃO. ABUSO DE PODER POLÍTICO E ECONÔMICO. NÃO CONFIGURAÇÃO. AUSÊNCIA DE PROVAS ROBUSTAS E INCONTESTES. PRINCÍPIO IN DUBIO PRO SUFRAGIO. DESPROVIMENTO DO RECURSO.

(…) Para caracterizar a captação ilícita de sufrágio, torna-se imperioso que tal prática ocorra no período eleitoral, conforme já sedimentado no âmbito da jurisprudência. Os elementos coligidos apresentam-se frágeis a demonstrar, de forma clara, conclusiva e induvidosa, tanto a captação ilícita de sufrágio, quanto o abuso de poder político e econômico, sendo exigido ainda, quanto a estes últimos, a gravidade dos fatos a comprometer a normalidade do pleito e, no caso, do material probatório acostado aos autos não se verifica espectro suficiente a impactar no âmbito das eleições, interferindo em sua higidez. Na dúvida sobre a configuração do ilícito, há de ser referendada a vontade popular, em observância ao princípio in dubio pro sufragio. Precedentes. Desprovimento do recurso. (TRE-RN – RE: 060044602 IPANGUAÇU - RN, Relator: CLAUDIO MANOEL DE AMORIM SANTOS, Data de Julgamento: 29/04/2021, Data de Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Data 05/05/2021, Página 9-10). (Grifei.)

É evidente que o abuso do poder econômico, para atingir a normalidade e a legitimidade das eleições, deve configurar ato de extrema gravidade, a ponto de criar desequilíbrio na disputa, gravidade e desequilíbrio, o que a parte investigante não logrou em demonstrar. (RECURSO ELEITORAL nº 26-53, Acórdão de 12/06/2019, Rel. Juiz Ricardo Tinoco de Goes, publicado no Diário da Justiça Eletrônico de 14/06/2019, pag. 04)

Ressalta-se que não é qualquer ilicitude praticada que enseja a drástica decretação de inelegibilidade. Sobre o tema, leciona José Jairo Gomes:

É preciso que o abuso de poder seja hábil a comprometer a normalidade e a legitimidade das eleições, pois são esses os bens jurídicos tutelados pela ação em apreço [AIJE]. Deve ostentar, em suma, aptidão ou potencialidade de lesar a higidez do processo eleitoral. Por isso mesmo, há mister que as circunstâncias do evento sejam graves (LC nº 64/90, art. 22, XVI), o que não significa devam necessariamente alterar o resultado das eleições (Direito eleitoral. 8. ed. rev.atual. e ampl. São Paulo: Atlas, 2012. p. 473).

Nessa linha de raciocínio, deve o Magistrado firmar seu convencimento pela livre apreciação dos fatos narrados na inicial, inclusive os públicos e notórios, o que no âmbito eleitoral tem uma função relevante, principalmente em face das paixões políticas que podem ensejar a tentativa de anular a soberania popular com demandas meramente retaliativas.

A prova produzida deve ser cabal e não se fundar em meras presunções, devendo conduzir o magistrado a uma conclusão irrefutável de que realmente a conduta se afigura realizada e que o possível beneficiário foi responsável ou consentiu com sua realização, ônus do qual não se desincumbiu a investigante.

Com efeito, não é bastante qualquer postagem ou provas documentais imprecisas sem robustez e idoneidade verificável, para justificar um provimento judicial de tamanha gravidade (cassação de registro ou diploma e declaração de inelegibilidade), sob pena de malferir a soberania popular.

No caso em testilha, as provas colacionadas e produzidas ao longo da instrução processual não se mostraram revestidas de segurança inequívoca e de gravidade, circunstâncias necessárias à caracterização da prática ilícita abusiva do poder político/econômico, de forma a macular a lisura, normalidade e legitimidade da disputa eleitoral.

Por fim, não se deve perder de vista que o eleitor é livre para votar em quem quiser e é papel da Justiça Eleitoral garantir que o poder econômico/político ou qualquer outro tipo de abuso não influenciem o processo eleitoral, no tocante à livre manifestação popular.

Não obstante, para tal objetivo ser alcançado, a cautela deve ser adotada pelo Magistrado quando da aplicação das penalidades que ensejem a destituição do Poder daqueles que foram vitoriosos nas urnas, pois a soberania popular deve prevalecer quando não evidenciadas as irregularidades apontadas em sede de AIJE.

III. DISPOSITIVO

Isto posto, pelo que dos autos consta, em consonância com o Ministério Público e com fulcro no art. 22 da LC 64/90 e art. 41-A da Lei 9.504/97, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos autorais, extinguindo o feito com resolução do mérito, nos termos do art. 487, I, do CPC.

Publique-se. Registre-se. Intime-se.

Transitada em julgado, arquivem-se os presentes autos, com baixa na distribuição.

São José de Mipibu, datado e assinado eletronicamente.

Pedro Paulo Falcão Júnior

Juiz Eleitoral da 7ª Zona

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