JORNAL O ALERTA 41 ANOS: Sempre Alerta
Texto escrito por Francicláudio Oliveira – Jornalista mipibuense e que atua em diversos jornais da capital.
Texto escrito por Francicláudio Oliveira - Jornalista mipibuense e que atua em diversos jornais da capital. Esta matéria foi publicada no Novo Jornal, de 6 de abril de 2012. Vamos a sua leitura:
Depois de dois anos atuando como colaborador do jornal O Alerta, periódico mensal que circulou com a edição comemorativa aos 32 anos de publicação no município de São José de Mipibu, pude conhecer, enfim a redação do jornal. E o que encontrei? Na verdade não é bem uma redação como me acostumei a ver nos jornais da capital, não há vários repórteres lutando contra o tempo para apurar informações relevantes, mas tem a mesma emoção que o repórter sente momentos antes do fechamento da edição do dia seguinte. Tensão, adrenalina e, claro, estresse não faltam.
A redação d’O Alerta é improvisada. Tem apenas uma mesa e um computador com impressora. O espaço é pequeno e chega a ficar apertado com quatro pessoas. Um ventilador serve para refrescar o calor. A sala é ocupada ainda por uma estante e uma mesa, onde José Alves, o Dedé d’O Alerta, que conduz o periódico, guarda catalogadas todas as 414 edições do seu jornal, comendas que recebeu ao longo do tempo pelo trabalho jornalístico, fotografias e outros jornais.
A pequena redação não representa nem de longe, tudo o que o jornal tem para contar em 32 anos de circulação. A redação “ferve” na última semana de cada mês, período em que a edição está sendo concluída para ser publicada no sábado que é dia de feira livre em São José de Mipibu, ocasião adequada para O Alerta chegar aos leitores.
Mas antes de ganhar as ruas, haja fôlego para escrever 16 páginas em tamanho standard (o mesmo do NOVO JORNAL), confirmar informações e levar aos leitores notícias atualizadas. Esta foi a semana em que a edição estava sendo concluída e o NOVO JORNAL presenciou a euforia que se repete há mais de três décadas.
Um fato curioso é que tudo é feito há mais de 30 km de onde os leitores do jornal residem. José Alves mora há 12 anos no conjunto Cidade Satélite, zona Oeste de Natal e é por isso que usa as novas mídias como principal fonte. Os blogs da cidade, por exemplo, servem para pautar suas matérias. Muitas fotografias também são oriundas da internet. Ele faz o rascunho, que chama de “boneca”, detalhando como pretende que seja a diagramação. Depois escreve os textos, a maioria deles resultantes de entrevistas por telefone ou por e-mail. Tudo é enviado para a diagramadora Iris Araújo. Ela trabalha no projeto gráfico do jornal há mais de 20 anos e quando termina a sua parte na produção se dirige à redação (aquele quartinho) para que José Alves faça os ajustes finais e envie para a gráfica. Até a quarta-feira tudo deve estar pronto.
Às vezes novos fatos causam tensão na conclusão do periódico. Nesta semana, por exemplo, uma informação, por sinal a manchete da Capa, estava pendente. A prefeita da cidade tinha anunciado que renunciará nesta segunda-feira (2) para concorrer a uma vaga de vereadora, mas a assessoria de comunicação da prefeitura solicitou que nada fosse divulgado porque, sem dar explicações, a renúncia poderia não acontecer na data prevista. Ninguém ligado à prefeita falava sobre o assunto. Era um pacto de silêncio.
Para qualquer repórter, isso imediatamente levantaria suspeitas e foi o que aconteceu. Mas era preciso publicar o assunto e já que não havia certeza, tempo e nem explicações sobre a renúncia, a manchete foi modificada de última hora levantando a questão da possibilidade de não haver renúncia.
Porém, antes que o jornal fosse enviado para a gráfica, uma ligação confirmou a renúncia e outra vez a notícia foi modificada. As ligações são sempre uma constante na hora de fechar o jornal, de acordo com a diagramadora, uma vez foi preciso esconder o telefone celular dele no lixo para que se conseguisse concluir a edição.
CIRCULAÇÃO
O Alerta circula em São José de Mipibu, mas chega a outra cidades próximas. Como a publicação acontece no dia de feira livre, o jornalista aproveita para estar em contato com os moradores e leitores da cidade. Em eventos apura algumas informações e, dependendo disponibilidade não dispensa uma entrevista presencial.
Basicamente a equipe do jornal se resume à José Alves, à diagramadora e a uma colaboradora que realiza a entrega aos leitores, mas conta ainda com outros que têm espaços fixos para escreverem todos os meses. São colunistas de esportes, cidade e direito jurídico que enviam seus textos por e-mail.
O Alerta é o único impresso da cidade e possivelmente o terceiro mais antigo da região metropolina. Tem um tiragem de 1000 cópias, que são entregues em mãos a cerca de 800 leitores cadastrados. Outras 100 são utilizadas por uma empresa de transportes para leitura de bordo dos seus passegeiros e o que sobra é vendido nas bancas.
DESEJO DE MUDAR A REALIDADE
A história d’O Alerta está baseada no sentimento de mudar a realidade, sobretudo durante o regime militar. O próprio nome já destaca isso. Foi durante o regime militar em 20 de março de 1980 que a primeira edição circulou pelas ruas de São José de Mipibu com o propósito de apontar os problemas e sugerir soluções, mesma linha que segue até hoje.
Cinco amigos: José Alves, Paulo Palhano, Gilson Matias e Maria Neli queriam mudar a realidade por meio da comunicação. A iniciativa chegou a levar Dedé à Polícia Federal, devido a um texto-crítica feito por Luiz Amaral, militante do MDB (partido de oposição ao governo), em nível estadual e local. Luiz era colaborador do jornal,escrevia artigos.Foi um processo de censura prévia, mas não causou-lhe grandes problemas.
Com o passar dos anos apenas José Alves continuou com o projeto por conta própria. Dentre as diversas matérias que foram destaque ao longo desse tempo, uma é lembrada com emoção pelo jornalista. “Em 1981 o açude de Santa Cruz transbordou e eu registrei a chegada das águas em São José de Mipibu, inundando o Rio Araraí e rompendo a ponte sobre a BR”, relembra.
O Alerta passou por diversas fases. Até agosto de 1989 a circulação era quinzenal, datilografado em máquina Olivetti comum em stencil, para depois ser “rodado” em mimeógrafo a tinta. Posteriormente, passou a ser impresso em um mimeógrafo mais moderno que imprimia o papel com fotografia. Um avanço para a época. Depois o número de páginas foi ampliado e, já em tamanho 32 cm x 46 cm, os textos passaram a ser digitados em um micro computador, conhecido por “composer” que as direcionava a uma impressora, utilizando esferas. O jornal obteve uma boa aceitação e contou com colaboração de anunciantes públicos e privados.
Em 2002 o jornal foi impresso pela primeira vez em policromia, atraindo a atenção dos leitores para as fotos coloridas. Nesse período, além da digitação em computador, já eram utilizadas fotografias virtuais. Os planos de José Alves é abrir nos próximos anos uma empresa jornalística, com jornais semelhantes a’O ALERTA em outros municípios do interior. Para este ano a ideia é aumentar a tiragem. “Toda vez que o ALERTA completa mais um ano de existência, é motivo de uma grande alegria, principalmente, quando transformamos em notícias os fatos que fazem o dia a dia de nossa comunidade”, declara o editor.
O jornal se mantém com os anúncios, mas não há muito lucro. No mês passado, por exemplo, sobrou pouco mais de R$ 140. Manter um impresso numa cidade com ares de interior e em meio às novas mídias é, segundo José Alves, mais difícil do que aparenta, porém ele diz que o esforço é compensado. “O impresso não vai acabar. Sempre existirão os que querem ter o papel em mão, guardá-lo”, supõe. Para ele, a recompensa vem de outra forma. “Minha maior satisfação é passar por alguém que está lendo meu jornal ou perceber que consegui ajudar a cidade com algo que publiquei”, relata.
FORMATURA 32 ANOS DEPOIS
Apesar de atuar como repórter desde 1980, foi somente neste ano que José Alves formou-se em jornalismo. Para muitos, não haveria a necessidade, devido à sua experiência e à desobrigatoriedade do diploma para exercer a profissão. Porém, o editor d’O Alerta tem uma visão diferente. “Fiz para me reciclar, para aprender e fazer melhor. Na faculdade acabei me tornando também uma espécie de professor para meus colegas mais jovens”, conta.
A formatura ocorreu há cerca de um mês em uma universidade privada da capital. Como é funcionário público federal, lotado na assessoria de comunicação do INSS/RN, o órgão ofereceu oportunidades de bolsas parciais de estudo aos seus servidores e este foi o incentivo para que no auge dos seus 54 anos reiniciasse o curso que tinha abandonado anos atrás na UFRN.
Ele conta que não foi fácil acompanhar a nova geração de comunicadores. Muitas vezes era complicado fechar a edição d’O Alerta, em meio aos trabalhos da faculdade e às suas obrigações no INSS.
O trabalho de conclusão de curso não poderia ser outro: “Os 31 anos do jornal O Alerta”, onde contou sobre suas experiências, o papel do jornal ao longo dos anos e como essa prática era justificada na teoria dos grandes estudiosos da comunicação.
Hoje aos 57 anos, se orgulha em dizer que é jornalista por amor, vocação e formação, dividindo-se entre as tarefas do seu trabalho, a família e O Alerta. “Por mais atividades que tenha, jamais deixei de apurar, buscar novas informações que assegurassem uma nova edição. É uma espécie de compromisso que eu tenho com a cidade que eu aprendi a amar e isso é uma coisa que eu pretendo dar prosseguimento enquanto puder”, finaliza.