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janeiro 7, 2024

FIGURAS MIPIBUENSES Arlindo Izaías de Macêdo

“Era uma manhã do mês de fevereiro de 1971 quando estaciono o carro na marginal direita da BR-101, no perímetro urbano de São José de Mipibu.

"Era uma manhã do mês de fevereiro de 1971 quando estaciono o carro na marginal direita da BR-101, no perímetro urbano de São José de Mipibu. Do interior do veículo, observo um pequeno sítio, cheios de figuras esquisitas e uma placa “Escaninho do Poeta”, diante de uma casa pequena e simples, semelhante a muitas outras das proximidades.

Nesse local residiu o poeta Arlindo Izaías de Macêdo, figura bastante conhecida em São José de Mipibu. Após seu falecimento, em 31 de março de 2018, o sítio e a casinha, foram demolidos", relata o jornalista José Alves, que publicou a matéria sobre Arlindo, no jornal O ALERTA, edição nº 474 – de fevereiro de 2017.

“O sítio, onde Arlindo Izaías mora, chama a atenção de quem está passando na marginal da rodovia BR-101. Não pelas plantas, e sim pelas inúmeras e inusitadas obras que produz, a partir de material que ele aproveita para fazer os trabalhos artesanal, com objetos de madeira, cerâmica, pedaços de brinquedos, eletrodomésticos, jogados no lixo. O local chama a atenção e muitos curiosos param para ver as artes criadas por esse artista mipibuense, que ele gosta de ser intitulado de “Poeta do povo”.

Arlindo nos recebe com simpatia e já vai falando sobre seus trabalhos. Mostra cada peça que ele transforma. Algumas são feitas a partir de madeira seca que encontra em árvores caídas, que esculpe e pinta, depois, complementado com diversos materiais descartados. O resultado soa surreal, infantil, ou assustador ao mesmo tempo. Há um peixe voador feito de raiz, com chifres de boi, hélice na cabeça e pintado de preto; um cachorro de cerâmica com óculos; um robô feito de madeira, monitor de computador e rodas de velocípede; figuras com cabeças de boneca e corpos de madeira ou de peças de bicicleta, um fantasma segurando uma cabeça…

As árvores do sítio têm hélices e figuras penduradas nas árvores. Uma jarra de cimento virou uma carranca humana. Máscaras, manequins e roupas que são rearranjadas segundo a imaginação do artista. As figuras humanas ou animalescas que Arlindo cria não tem uma fonte de inspiração única. “Tudo que eu vejo me inspira, é uma forma de aliviar minhas tensões”, diz. 

O atelier a céu aberto recebe constantes visitas, principalmente, de escolas locais e da capital. “A criançada adora isto aqui. Eu fico muito feliz quando ficam impressionadas com as imagens". Ele conta que não produz para vender, mas os interessados podem sempre chamá-lo na porta para apreciar suas criações de perto.

Terminado de observar as “esculturas” de material reciclável, me sento num banco e começamos a conversar e falar de sua vida. Vou anotando tudo…

Arlindo Izaías de Macêdo nasceu em São José de Mipibu, em 17 de junho de 1951. “Irei completar este ano (2017), 66 anos. Sou filho de José Izaías Filho e Antonia Martins de Oliveira, que tiveram 25 filhos. Desses, só restam cinco”, diz.

Sua infância foi igual à de outras crianças, numa época em que não existia violência e os meninos eram criados “soltos na rua”. Mas existia respeito aos pais, amor e temor. Porém, muito diferente dos dias de hoje. 

Segundo Cristóvão Cavalcante, que conviveu com Arlindo, "ele foi uma criança diferente dos outros irmãos. Muito compenetrado, sorridente e muito solidário. Gostava da poesia e da arte.

Pensa um pouco, como se puxasse pela lembrança do passado: ”Tenho boas recordações daquela época, das brincadeiras, dos costumes. Vivíamos pelos engenhos, tomando garapa e comendo puxa-puxa e rapadura. Mas, bom mesmo, eram os banhos na Mata da Bica, nos rios Pituba, Mipibu e na Lagoa do Bonfim”.

Arlindo se lembra de alguns amigos de infância, como: Raimundo Macedo, Babú, Beto Barbalho, Afrânio Izaías, Tupi, os filhos da família Fagundes. “Estudei o Primário (fundamental) no Instituto Pio XII e o Admissão, na Escola Barão de Mipibu. O Supletivo de 1º Grau, cursei na Ilha do Governador, no Rio de Janeiro”.

Ao alcançar a adolescência, consegui um emprego no Cartório de José Rinaldo e depois fui promovido à escrevente e chefe do Cartório Eleitoral.

O amigo Cristóvão Cavalcante descreve a chegada de Arlindo ao Rio de Janeiro: "Muito comunicativo, cativava a todos que o conhecia. Como a maior parte dos nordestinos, sonhava morar na Cidade Maravilhosa. Influenciado pelo conterrâneo Hélio Cavalcanti (meu irmão), proprietário do Restaurante Chão de Estrelas, em São José de Mipibu, relatava para ele as maravilhas do Rio de Janeiro.

"Meu irmão,Hélio me pede para dar um apoio a Arlindo, que estava decidido morar e trabalhar no Rio de Janeiro. Eu  prontamente afirmei, que a minha casa estava de portas abertas.

Arlindo diz que: "Em 1974, “Juntei um dinheirinho e, aos 18 anos fui para o Rio de Janeiro, onde passei dez anos. Meu primeiro emprego no Rio, foi na empresa "Desmontador Gordo e o Magro”, sendo recebido de braços abertos pela família de Cristóvão Cavalcante, onde fiquei morando". 

"Levei-o ao escritório onde eu trabalhava. Ficou me auxiliando como estafeta (funcionário de empresa encarregado de distribuir a correspondência), por um momento, até arranjar um trabalho", diz o amigo Cristóvão.

E acrescenta: "Eu, tinha conhecimento com pessoas, que trabalhavam na Churrascaria e Casa de Show "Minuano", onde consegui um emprego de garçom para Arlindo. Mesmo sem experiência, surpreendeu a todos e até a mim.

Na Churrascaria Minuano, se apresentavam artistas famosos como: Cauby Peixoto, Agnaldo Timóteo, Ângela Maria e muitos outros. No intervalo dos shows, Arlindo ia ao palco, com microfone na mão e anunciava a próxima atração da noite. Também interagia com os clientes que frequentavam a casa de show.

"Foi um sucesso passageiro. Arlindo jogou fora a oportunidade, porque quando bebia se transformava. Bebia e abandonava o trabalho, passando dois ou três dias sumido. Certo dia, chamei-o para conversar sobre a situação que ele estava passando. Não teve jeito! Quando bebia se tornava agressivo e malcriado", diz Cristóvão.

Um dia, vínhamos no meu carro, juntamente, com Lourival do PT. Em pleno trânsito da Av Brasil,  tive de parar o carro, para ele descer. Outros fatos foram acontecendo e os transtornos aumentando. Arlindo resolveu voltar para Mipibu, ficando trabalhando no restaurante Chão de Estrela, onde se entregou ao vício do álcool, bebendo, inclusive, no horário de trabalho,

Foi trabalhar em Natal. Arranjou emprego em Cyro Cavalcante e depois, foi aprovado em concurso público na Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Posteriormente, fui exonerado do emprego federal, por “abandono de serviço. “Nessa época, já era alcoólatra. Porém, há 26 anos que frequento o AA e estou ausente do álcool”, relembra Arlindo.

Arlindo foi locutor de campanhas políticas, nas memoráveis campanhas, da família Ferreira, em São José de Mipibu, além de locutor de propaganda comercial.

"No ano 2000 vim passar uns dias em São José de Mipibu. Encontrei Arlindo. Ele portava uma tristeza profunda. Exilou-se num pequeno sítio sítio, a margem da BR 101. Nesse lugar ele, esculpia carrancas, obras de artes de tronco de madeiro, com resto de materiais jogado ao lixo.  O sítio era um lugar sombrio. Era lá onde encontrava inspiração para escrever suas poesias", diz o amigo Cristóvão.

O Poeta

Ao falar de sua veia poética, seus olhos brilham. Arlindo já lançou dois livros de poesia, “Na sombra da Catanduva” e “A fonte de poesia”. Está sempre escrevendo versos para futuras publicações.  Atualmente está concluindo o 36º livro de poesia. “Já escrevi seis livros de história e dois cordéis referente personagens da cidade”. O livro "A Sombra da Catanduva" expressa uma melancolia, causada por um amor desfeito", relembra Cristóvão

Homenagem a São José de Mipibu  

São José, terra amada
De um povo simples e gentil
Uma terra abençoada
No meu querido Brasil.
São José que tem um clima puro e tropical
Também és um pedacinho descoberto por Cabral
Uma terra aconchegante
de um povo acolhedor
 São José é povo bravo
cheio de alegria e amor.
São José terra do Norte
conhecida até no Sul
Terra de um povo amado
 a do Barão de Mipibu.

Ele se autointitula de poeta, artista plástico, escritor e talhador. “Meu ateliê é ao ar livre, no Escaninho do Poeta. Por conta desse meu trabalho, sempre aparece gente aqui. Alguns turistas até pedem para entrar para fotografar. Há uns dias atrás alunos do Colégio Marie Jost, de Natal, estiveram visitando o local”, disse.

Sobre a cultura em São José de Mipibu, diz que sempre foi elevada, com bons artistas. “Aqui é um celeiro de artista, porém seus trabalhos são desvalorizados”.

Sobre o seu futuro declara: “pretendo deixar um legado para São José de Mipibu’, em relação a poesia, filosofou; “Poesia é alimento, é tônico que alivia as sequelas da vida”.

Despeço-me de Arlindo e ao atravessar o portão do sítio ele faz um pedido: para incluir, na entrevista a mensagem: “Nasci em um país arbitrário e morrerei na arbitrariedade do meu país”.

O poeta veio a falecer, na madrugada de 31 de março de 2018, no Hospital Monsenhor Antônio Barros, onde estava internado. O corpo foi velado no Centro de Velório Sagrado Coração de Jesus, localizada na Av Moizaniel de Carvalho e o sepultamento ocorreu, às 16h, no cemitério local, após missa de corpo presente, na Matriz de Sant’Ana e São Joaquim.

Arlindo deixou o filho, Marcos Antônio Izaias de Macedo, que publicou essa mensagem na ocasião de seu sepultamento: “Um homem íntegro, de família de tradição. Arlindo era apaixonado por São José do Mipibu. Pai de um único filho deixa eterna saudades. Filho e seus netos que todos lhe amam. Deus tenha sua alma em um ótimo lugar”.  

MEU NOME É OMISSÃO

Acabaram-se as senzalas, 
os troncos e as chibatadas
Hoje a tortura, apresenta-se
Com o nome, de omissão
Ela apresenta-se, como um falso paliativo
Com aquele, aperto de mão
E, um patético sorriso
Assim, apresenta-se a omissão, como um bom amigo
São as senzalas, os troncos e as chibatas
Dos prepotentes coronéis
Torturadores de muitas almas e, devastadores de corações
Que continuam massacrando o povo de Mipibu
Com este prepotente nome, OMISSÃO

Em seu blog de Olho em Mipibu, o professor Alexandre Freire escreveu: "É com muita tristeza que noticiamos o falecimento de Arlindo Isaías de Macêdo, o POETA DE MIPIBU. Há alguns anos, Arlindo esteve colunista deste blog. Polêmico e sem “papas na língua”, através da coluna “Fala Cidadão”, ele reivindicava melhorias para São José de Mipibu".

Em um vídeo, Alexandre publica matéria realizada em junho de 2011. O poeta mipibuense trouxe uma matéria sobre o abandono do ginásio poliesportivo O Arlindão, por parte da gestão, da então prefeita Norma Ferreira. Assim que o prefeito Arlindo Dantas assumiu, em 2013, reformou aquela praça esportiva, trazendo dignidade e mais uma opção de lazer aos desportistas.

No blog Mipibu de Olho na Verdade, editado à época, por Edivanil Pontes, a professora Francineide (‘Fran’) Moura, mostrou seu descontentamento com um episódio ocorrido com o poeta Arlindo Izaías:

“Fiquei indignada com o que ouvi do poeta Arlindo Izaias. Ele narrou que foi convidado pelo apresentador Júlio Silva, para participar do seu programa. Surpreendentemente ao chegar ao estúdio da FM 87,9, Olho D'água tomou conhecimento que o diretor da emissora, não permitia a divulgação da cultura popular. Júlio disse para Arlindo que o diretor havia dito que ele iria sujar o programa".

A minha pergunta é: "Essa FM Olho D’água é realmente comunitária? Gostaríamos de saber qual é a postura do deputado Fábio Dantas e de seu pai Arlindo Dantas. Que constrangimento, para um poeta de nome como Arlindo. Um verdadeiro, um ser comunitário que dedica uma parte da sua vida ao irmãos mipibuenses. Defensor nato dessa terra. Isso merece uma ação por danos morais”.

Achados da Quarentena, de Amauri Freire, publicado nas suas redes sociais)

“Remexendo o baú de arquivo de imagens me deparei com esse interessante achado, a visita do poeta Arlindo Izaías ao programa de rádio do amigo Lourival Cavalcanti, veiculado nas tardes de sábado, pela Rádio Olho D’água, de São José de Mipibu".

Esse encontro ocorreu em janeiro de 2011, onde, ao lado de Lourival, tivemos uma longa prosa com o saudoso poeta, ouvindo suas histórias e algumas de suas poesias.

De Amauri Freire, publicado em seu blog

"O poeta nos deixou em 2018 e foi recitar suas poesias no céu.

Arlindo Izaías era daquelas figuras clássicas que fazem parte do cenário de cidades interioranas do Brasil, um homem que ousava fazer poesia num lugar onde quase ninguém lê.

Durante muito tempo rabiscou seus escritos, guardando-os para si, sem nenhum interesse literário. Escrevia por simples prazer, nas sombras das árvores do “Escaninho do Poeta”, lugar onde viveu boa parte de sua vida.

Muitas vezes ele me parava na rua, com aquela velha mochila, e me mostrava seus últimos escritos. Desde sempre o incentivei a fazer uma publicação, lançar um livro, quem sabe…

Um certo dia, no início da década de 2000, Arlindo me fez uma visita trazendo uma pasta com um grande número de poesias, queria “organizar” seus rascunhos. Responsabilizei-me em digitar tudo o que ele havia escrito até então, sugerindo apenas algumas poucas correções de ortografia.

O material foi calmamente arrumado e ganhou nome – Na sombra da Catanduva.

De posse desse material, Arlindo procurou apoios e conseguiu publicar seu livro através de um esforço do Secretário Municipal de Educação, na época, professor João Maria Freire, na gestão da prefeita Norma Ferreira, um dos entusiastas das letras do poeta.

Convém também lembrar de suas participações nos Festivais de Cultura promovidos pela Associação Cultural Cajupiranga, onde ele recitava com sua voz, grave e pausada, algumas de suas poesias, arrancando efusivos aplausos do público presente”.

Recebi a visita do ilustre amigo Arlindo Izaías de Macêdo, poeta das terras de Mipibu, que me trouxe duas poesias, saídas recentemente do forno.

Ambas fazem homenagens a duas datas históricas, comemoradas na semana passada. O dia de Tiradentes e o aniversário de Brasília – capital do país.

Com o intuito de divulgar todo e qualquer assunto relevante, principalmente na área cultural, e respeitando as individualidades e os pontos de vista, divulgamos com muito prazer as duas obras do Poeta de Mipibu.

UM PATRIOTA ESPECIAL

Patriota, determinado
Homem bravo e de valor
Defensor do povo brasileiro
Este ser, cheio de amor

José Joaquim da Silva Xavier
Guerreiro de bom coração
Defendeu até o último suspiro
Nosso Brasil, nosso torrão

Um transparente mineiro
Herói do nosso Brasil
Um verdadeiro ser, amável e decente
Este ilustre brasileiro, o saudoso Tiradentes

BRASÍLIA DOS BRASILEIROS

Brasília, encantador cartão postal
Brasília, que encanta o mundo inteiro
Obra bela de Oscar e dos candangos
Brasília do brasileiros

Erguida com determinação, bravura e amor
Capital de um país hospitaleiro
Que destaca-se no mundo inteiro
Brasília, capital dos brasileiros, dádiva do criador

És a deusa do planalto
Admirada por muitos olhares
Criado, com amor, por um mineiro
O grande presidente JK
Brasília de um povo guerreiro
Brasília dos brasileiros

"No ano de 2004, vim passar uns dias em Mipibu. Encontrei Arlindo se apresentando no programa na Rádio Olho D'águ. Esse programa era apresentado pelo amigo Lourival Bezerra Cavalcanti ("Lourival do PT"), nas tarde dos sábados. Feliz fiquei, por reencontrá-lo e jamais imaginaria de saber que era poeta".

"A saúde de Arlindo era bastante debilitada, mesmo assim, pedalava sua bicicleta até a Lagoa do Bom Fim, na granja de Lourival. Lá, batia papo e relembrávamos passagens no Rio de Janeiro. Ele sempre com aquele sorriso de uma pessoa tranquila, mais deixava transparecer uma profunda nostalgia e solidão".

"O tempo foi passando e Arlindo ficou isolado no seu refúgio, com a saúde se agravando, chegando ao ponto de não querer a visita de ninguém. Não aceitava ajuda, queria morrer sozinho e tranquilo. Veio a falecer na madrugada do dia 31 de março de 2018. No Hospital Monsenhor Antônio Barros. Descanse em Paz meu amigo", conclui seu depoimento Cristóvão Cavalcante.

Uma resposta para “FIGURAS MIPIBUENSES Arlindo Izaías de Macêdo”

  1. Maria Jaci Rodrigues de Souza disse:

    Obrigada meu querido amigo Cristóvão por trazer ao público um pouco da vida do meu querido irmão paterno, Arlindo Izaías de Macedo… sempre simples… reservado… sempre carregando um segredo que nunca dividiu com ninguém… mais sempre foi um ser humano maravilhoso…doce… humilde… Infelizmente não consegui revelo… mais sempre carregarei no meu coração a sua doce lembrança… Meu irmão paterno ARLINDO… que saudades de você 😢😢😢
    Que Deus te abençoe meu querido amigo Cristóvão 👏👏👏😘😘😘♥️