Jornalismo com ética e coragem para mostrar a verdade.

junho 2, 2024

EM SE FALANDO DE RABOS

NILO Emerenciano – Arquiteto e escritor Toré por pouco não nasceu anão de verdade, desses que não se vê mais por aí.


NILO Emerenciano - Arquiteto e escritor


Toré por pouco não nasceu anão de verdade, desses que não se vê mais por aí. Antigamente anões eram coisa comum nas ruas, tivemos até uma vereadora muito popular, amiga da minha mãe. Hoje acho que só em circos ou nem isso. Tínhamos também, no Seridó, uma família de homens bem altos, a ponto de chamar a atenção quando vinham a Natal.

Figuras ilustrativas

Toré é torado no grosso, pernas curvas como parênteses, tamanhinho de nada. Passa as tardes brechando o jogo de dominó dos aposentados lá no bar Caneco Amassado, de Carlinhos Calango. Na verdade, não é um bar, e sim uma cigarreira adaptada como é normal aqui no bairro. Vende de tudo menos cigarros. Ali se juntam aposentados e outros desocupados todos os dias jogando dominó. Uns jogam, outros só corujam, dando pitacos e risadas. Quando um jogador sai outro imediatamente ocupa o lugar de maneira que nunca falta quem escute Toré.

Retired people, seniors and free time. Old latino men having fun and playing game of domino in Cuba.

Toré quando cansa de olhar o tabuleiro começa a fazer comentários de caráter geral, sobre tudo que se possa imaginar, até que distrai a atenção do jogo e os perus passam a ouvir, mesmo que disfarçadamente, aquele blábláblá, inclusive eu.

A última foi sobre rabos. A gente não sabe de onde Toré tira essas coisas. Sai assim, de supetão. Ele começou dizendo que Deus errou quando fez o homem lá no paraíso, amassando e moldando aquele barro todo, botando as coisas no lugar certo, o nariz, as orelhas, os cabelos, os dentinhos um por um, encarrilhados dentro da boca, o tubozinho que sai da garganta e vai até lá embaixo, conduzindo a comida que a gente come e descome em seguida processada e pronta para virar adubo.

E talvez por pressa, afinal ele só tinha sete dias para fazer aquilo tudo, inclusive Eva e os pés de cajus necessários para acompanhar a cachaça e o homem poder aguentar a primeira mulher, ideia genial, na verdade, mas na pressão o Criador esqueceu de acrescentar o rabo. - Mas que rabo, Toré? - Ora, o rabo. Ou vocês não percebem a falta que o rabo nos faz? Um rabo, desses grandes, finos e flexíveis, que nos servissem de apoio quando as mãos estão ocupadas, imaginem o garçom com uma bandeja em uma
mão, um prato na outra e o rabo pegando a cerveja. Ou nos momentos do namoro, uma mão no ombro da namorada, outra no celular e o rabo por trás fazendo das suas? Na cozinha, então? Mão no prato, outra na esponja, e o rabo livre para abrir e fechar torneira, pegar o detergente, coçar o nariz.

E falar em coçar, sabem aquela coceirinha lá no meio das costas, bem no espinhaço que ou alguém coça por caridade ou a gente tem que se esfregar na parede? O rabo ia lá, e pronto, resolvido, alívio na hora. E pensem: ninguém poderia fingir emoções, criar sentimentos fake, porque o rabo entregaria essa farsante. Tá alegre? Então, cadê o rabinho balançando?

E na velhice, mão na roda. Nada de bengala. A gente ia ter o rabo como terceira perna, apoiando com a vantagem de apoiar ora à esquerda, ora na direita - não confundir com esses políticos que vivem pulando de partido todos os meses.

Fiquei procurando um furo nas ideias de Toré. Confesso que não estava achando nenhum aí apelei para o fundamentalismo religioso. - Você tá questionando a sabedoria de Deus, Toré, se achando melhor e mais sabido do que Ele? - Votes, longe de mim saber mais que o homem lá de cima, mas foi muita coisa para uma pessoa só fazer, planetas, luas, estrelas, as aves do céu, do beija-flor ao sibite, canário, bem-te-vi, golinha, corujas e rasga-mortalha, rolinhas e urubus com a missão de limpar as carniças.

E por aqui os bichos todos, insetos de todo tipo vejam aí, formigas, abelhas, maribondos, muriçocas, zigzig, emboás, cobras e lagartos, até aquele bichinho que carrega uma luzinha na bunda que acende e apaga de noite, o vagalume.

Pulgas, carrapatos, aranhas, escorpião, piolhos, chatos, um trequinho que entra por debaixo da pele e sai ferindo, comendo a gente por dentro, e por falar nisso as lombrigas, minhocas, é muita coisa ou não é? Natural que Ele tenha deixado passar um detalhezinho desses, importante para nós, mas para Ele não tão importante.

Vai ver foi por isso que Adão foi expulso do paraíso, quem sabe, reclamou junto com Eva lá no escritório do Jardim do Éden: - Cadê meu rabo, Senhor? O macaco tem um, o gato tem, o cachorro tem. Cadê o meu? Puto da vida, Deus expulsou o casal daquele jardim de delícias mandando que eles fossem plantar batatas para viver.

Carlinhos Calango, o dono do Caneco Amassado, estava ouvindo tudo aquilo e não aguentou mais. -Toré, devagar com o andor. Não bagunça com Deus aqui no meu bar. Deixei de bater aqui agora por sua causa. E era com um carroção de seis.

Falei alguma coisa de mais? Nesse momento Paçoca, a cadela vira-latas, ou melhor, SRD que é como é de bom tom falar hoje em dia, sendo RSD sem raça definida, entrou por debaixo da mesa fugindo de Djavan, um cão sarnento que vagabundeava por ali, dando umbigadas no ar e querendo cobrir Paçoca sem mais aquela.

Paçoca se encolheu e protegeu as partes com o rabo entre as pernas, o suficiente para Toré apontar: - Tão vendo? O rabo é bom até contra o assédio sexual desses estupradores safados que vivem pela aí.

Hora de eu sair pois já tinha ouvido o suficiente. Mas Manoel Diguilingue, puto da vida, comentou gritando que já devia ter gente ali com rabo grande, e que tinha certeza de que havia sido roubado, pois alguém trocara as pedras de lugar. - Rabo é coisa de larápio ladrão, isso sim, e bateu com força na mesa fazendo as pedras todas pularem. Toré já ia longe, dobrando a esquina da padaria. Se tivesse rabo, com
certeza, iria guardadinho entre as pernas.

2 respostas para “EM SE FALANDO DE RABOS”

  1. Solrac disse:

    🤣🤣🤣🤣🤣🤣 m a r a V i l h o s a…

  2. orlando soares disse:

    Os anões ganharam o mudo, se vê até em programas televisivo.