ARTIGO: Não é uma Gripezinha

dezembro 7, 2020

Pe.

Padre Matias Soares quando ainda estava hospitalizado

Pe. Matias Soares - Pároco da paróquia de Santo Afonso Maria de Ligório Natal/RN

Como já desconfiava, o noticiário voltou a promover o terrorismo psicológico sobre o aumento dos casos de Coronavírus. A campanha política, a indisciplina e a imprudência brasileiras foram e continuarão a ser parceiras do inimigo invisível. A Europa e os Estados Unidos também estão impotentes diante da assustadora propagação da pestilência. Não é teoria da conspiração, não é gripezinha. Eu posso afirmar isso.


Escrever estas linhas tem por intenção ajudar na conscientização das demais pessoas sobre a necessidade de lutarmos na prevenção do contágio da doença. Sabemos que a maioria dos infectados não tem a intensificação dos sintomas. Seria ainda mais aterrecedor se fosse diferente. Mesmo assim, as sequelas são recorrentes em muitíssimos casos.


Como é de conhecimento de milhares de pessoas, eu tive Covid. Foi tudo tão rápido. Corpo febril durante um início de semana, dores fortíssimas de cabeça, internamento numa enfermaria, pela manhã, acordo a noite na UTI e acordo trinta e nove dias depois. Foram dias de profundo sofrimento. Eram muitos os delírios e alucinações. Eu aparecia sempre como um espectador da morte. As pessoas que fazem parte da minha sempre estavam envolvidas. É uma tortura constante. 


Nos meus solilóquios, que “é o diálogo da alma, ou consciência, consigo mesmo” (S. Agostinho, Solilóquio) eu sempre me via como já morto. Era uma luta constante nos cenários da desolação. Em determinado momento, alguém me diz que na paróquia estava tendo um Cerco de Jericó, que é um esquema de oração permanente com uma intenção específica, e que não podia desanimar. Veio a partir daí a retomada da consciência de que precisava lutar pela vida.


Depois de acordado, outra maratona: Lutar contra a ansiedade. Foi outro potente inimigo. Durante o dia, via os profissionais da saúde que passavam amiúde, durante o tempo parecia não passar. Com o isolamento que vivem as pessoas nesta situação, a inimiga me atormentava ainda mais, fazendo com que eu pensasse que estava morrendo; auxiliada pela circunstância, que ainda zombava de mim, que permitiu que o ar condicionado estivesse danificado, fazendo do calor mais um companheiro das desgraças.


Na UTI me recordo de algo muito importante: A humanização dos profissionais da saúde. Há médicos e médicas; enfermeiros e enfermeiras; técnico de enfermagem e etc.... É de fundamental importância que exista compaixão e empatia. Muitos deles precisam de espiritualidade! Como isso faz a diferença! Eu não podia tomar água, mas me lembro com tanto sentimento de gratidão das enfermeiras que colocaram água em meus lábios e enxugaram meu rosto quando estava naquele calor causticante. Como também tenho na memória uma situação isolada que fez questão de dizer que não viria me ajudar, pensando que não estava ouvindo. Quanta insensibilidade!


Dois momentos me foram de certa alegria, se assim posso dizer, nesta infeliz odisseia. Foram eles: A saída da UTI para a enfermaria e a retirada da traqueostomia. Que sensação de alívio. Meu Deus! Depois, na enfermaria, os sinais de melhora foram acontecendo. As visitas dos familiares, amigos, paroquianos e assim sucessivamente. A vida retomou sua forma. A força de vontade e a paciência passaram a ser amigas inseparáveis. Contudo, as sequelas aparecem como perseguidoras. Complicações na perna e problemas renais ainda precisam ser superados. Até hoje tenho pesadelos parecidos com aqueles que tive enquanto estava entubado. Outros fatos não serão relatados, já que eu soube depois, pelo testemunho de outros. Sei que tive paradas respiratórias e houve um certo desengano acerca do meu retorno.


Enfim, graças a Deus, que ouviu as preces do Seu povo, e os profissionais da saúde, que agiram com presteza, responsabilidade e empenho, posso viver e estar situado no tempo e no espaço. Espero que meu testemunho possa salvar na tomada de cuidado de outras pessoas. Como é bom viver! Assim o seja!

2 respostas para “ARTIGO: Não é uma Gripezinha”

  1. Angela disse:

    Com certeza tem uma missão a cumprir. Seria ótimo se o milagre da sua recuperação tivesse impacto positivo nós muitos sem consciência e que insisten no negacionismo.

  2. Terezinha Tomaz disse:

    Esse vírus é terrível, devemos dá graças a Deus todos os dias pela saúde q temos.