A RUA DOS PATRIOTA

fevereiro 19, 2023

Por Roberto Patriota – Jornalista e Escritor Meu saudoso pai, Nilson Patriota, imortal das letras, costumava dizer que a Rua do Capim, hoje Ferreira Itajubá, na cidade de Touros foi também denominada, até a primeira década do século XX, como Rua dos Patriota, ou Rua dos Poetas.

Por Roberto Patriota - Jornalista e Escritor

Meu saudoso pai, Nilson Patriota, imortal das letras, costumava dizer que a Rua do Capim, hoje Ferreira Itajubá, na cidade de Touros foi também denominada, até a primeira década do século XX, como Rua dos Patriota, ou Rua dos Poetas. Logradouro esse que seu avô materno construiu uma casa no final do século XIX e o seu avô paterno edificou uma outra, toda em pedras no início do século XX.

Naquela rua nasceram, viveram e morreram singulares figuras dos troncos familiares. Ele costumava lembrar que na porta da casa do seu tio Nonhô Patriota existia um batente de pedra onde seu tio costumava sentava-se para afinar o violão, antes de sair para as serestas. Também lá sua tia-avó, Dindinha Clarinha lhe contava estórias de santos e trancoso.

Toda as manhãs Dindinha desfilava com seu porte europeu a caminho do rio Maceió para o seu banho diário. Foi uma moça belíssima e uma adulta prestimosa, querida e respeitada por todos. De porte elegante, era considerada a moça mais bonita da região. Mulher de estatura alta, pele e cabelos claros e belos olhos azuis de um brilho vítreo, que haviam sidos pincelados há séculos passados na Europa, pois tinha ascendência holandesa por parte do avô paterno, oriundo de Recife-PE, onde a família se radicou quando seus antepassados chegaram ao Brasil durante a Invasão Holandesa, por volta de 1635. 

No quintal da enorme casa dos seus pais existia uma azeitoneira, plantada por Dindinha. Moradores da Vila de Touros costumavam presenteá-la com camarões, peixes e lagostas e traziam seus filhos para que ela os batizasse. Era uma costureira requisitada por todos e uma mulher letrada. Nas novenas de maio substituía o padre na igreja. Aconselhava famílias e resolvia questões de desentendimento. Quando o juiz estava ausente da Comarca fazia casamentos, depois de haver bordado o vestido da noiva.

Era, também, parteira e, consequentemente, madrinha da criança. Anos depois seria a professora de primeiras letras caso o menor resolvesse estudar. Meu pai lembrava que durante a sua infância a Rua do Capim mais parecia um campo de futebol verdejante, Sua grama baixa e macia convidava todos para caminhar descalços sobre ela.

Na Rua do Capim nasceram meu pai, tios, tias, avô e bisavó paternos. Nasceram e viveram homens e mulheres inteligentes, boêmios e trovadores. Ali na casa do meu bisavó João Theodoro, hospedou-se o poeta e menestrel Ferreira Itajubá, nos primeiros anos de século passado. Lá certamente ele se inspirou a compor sua grande obra e poesia "Branca".

Após o calçamento da rua no final da década de 1970, certamente ela perdeu muito da sua beleza bucólica. Por seu gramado verdejante Dindinha Clarinha caminhou por longos 98 anos de vida.

Certamente que a garotada de hoje já não pode mais desfrutar daquele belo gramado para as atividades desportivas e de lazer, certamente que seus atuais moradores já não podem usufruir das águas límpidas e cristalinas do rio Maceió. Decerto que Dindinha Clarinha não iria gostar de morar na Rua do Capim de hoje. Seus pés que durante quase um século foram acariciados pela grama macia não se acostumaria com a aspereza do calçamento nem muito menos com o barulho insano dos paredões de som.

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