GERAÇÃO DO MI-MI-MI

agosto 15, 2021

Nadja Lira – Jornalista • Pedagoga • Filósofa Vivemos momentos muito ruins no mundo atual, desde que o comportamento do politicamente correto transformou-se em um novo modismo.

Nadja Lira – Jornalista • Pedagoga • Filósofa

Vivemos momentos muito ruins no mundo atual, desde que o comportamento do politicamente correto transformou-se em um novo modismo. Assim, tudo o que se diz ou se faz é motivo para brigas, discussões intermináveis e até mesmo processos judiciais com pedidos de indenizações envolvendo cifras astronômicas e impossíveis de serem pagas. Afinal, vivemos em um País onde o salário mínimo não é suficiente para dar vida digna a ninguém. Imagine pagar uma indenização por uma frase mal colocada.

Todas as pessoas de bom senso, portanto, precisam ficar atentas aos seus atos, atitudes e palavras, porque para a geração do mi-mi-mi tudo é ofensa, tudo é questionado, tudo é considerado bullying e tudo pode ser transformado em processo.

Durante minha infância vivida em Baixa-Verde, a capital do Mato Grande, tudo era diferente, alegre, divertido. Nossa vida, apesar das dificuldades, era uma festa constante, de modo que todas as crianças da minha geração se tornaram adultos bem resolvidos: Todos entraram no mercado de trabalho e destacam-se por sua atuação profissional. São pais, mães e avós amados e respeitados por sua prole, diferentemente do que vemos na maior parte das famílias da atualidade.

É inegável que nem tudo era perfeito naquela época e passamos por grandes dificuldades. Estas dificuldades, porém, contribuíram para fortalecer nosso caráter. Nenhum dos meus contemporâneos se tornou um adulto revoltado, frustrado e de mau com o mundo. Nenhum cultiva ódio, rancor ou mágoa dos pais ou enveredou pelo caminho da marginalidade.

A cidade sofria com a falta de uma infraestrutura: Não dispunha de água encanada, médicos residentes no lugar e rede de esgoto. A energia utilizada vinha de um gerador movido a óleo diesel e funcionava somente até às 22h. Depois deste horário a população recorria aos antigos lampiões abastecidos com querosene.

Não havia espaços destinados às brincadeiras de crianças e de adolescentes, uma vez que a cidade sempre foi governada por péssimos administradores, jamais preocupados em oferecer um pouco de conforto aos moradores.

Durante a minha infância, a cidade não tinha uma única pracinha onde as pessoas podiam passar o tempo e onde as crianças pudessem correr, pular e andar de bicicleta. A pracinha, no meu tempo, era o muro baixo da casa de Dona Anália Barbosa, onde os jovens sentavam para colocar a conversa em dia e paquerar os gatinhos da época.

Em Baixa-Verde também não havia sorveterias, lanchonetes ou qualquer espaço onde os jovens pudessem se reunir. Isto, porém, não se constituía em um grande problema, porque havia os famosos “assustados” que acabou por formar muitos casais, como Coy e Lee, Jandira e Jurandy, Elsa e Hélio, Joaquim e Raimunda, e muitos outros.

Os “assustados” consistiam na realização de uma festa surpresa na casa de um amigo. Um grupo chegava com uma radiola, vários discos, bebidas, petiscos e a festa estava pronta. Bastava afastar os móveis da sala e o baile começava.

Lembro com saudade do Cine Planalto, empreendimento do Sr. José Augusto (em memória), responsável pelo cinema da cidade, onde assisti aos filmes clássicos na companhia do meu pai. O prédio era pequeno, mas aos meus olhos de criança parecia grande e imponente.

Outro lugar onde os jovens costumavam se encontrar aos sábados, era o Grêmio do Ginásio João XXIII, presidido pelo saudoso amigo Antônio Galdino – Toinho, que partiu cedo deixando muita saudade entre seus contemporâneos. No espaço do grêmio, os jovens cantavam, dançavam, participavam de torneios de ping-pong e refletiam acerca de um problema que afligia a sociedade da nossa época, sob os olhares atentos de alguns professores como João Segundo e Monsenhor Lucena (em memória).

Naquela época todos tinham apelidos e atendiam quando eram chamados por eles. Podia-se dizer que um negro era negão sem que isto fosse transformado em um caso de polícia.

As meninas da minha época eram românticas, sonhavam com um príncipe encantado e suspiravam ao ver a cena em que a Bela Adormecida recebe um beijo de amor do príncipe. Esta cena, que aos nossos olhos era puro romantismo, já que o beijo devolve a vida à mocinha, hoje é vista como necrofilia.

Hoje, remexendo o meu baú de recordações, vejo com tristeza que a juventude da atualidade não tem mais o romantismo, a pureza, os sonhos e as fantasias de outrora, sentimentos que ajudam as pessoas a se tornarem mais criativas. Neste mundo globalizado, se valoriza mais as conversas via WhatsApp do que aquelas em que as pessoas se olham nos olhos. Tire o celular de um adolescente, então se verá o real significado de mi-mi-mi.

2 respostas para “GERAÇÃO DO MI-MI-MI”

  1. Robson Freitas disse:

    Adorei a reportagem, bem apropriada para o nosso tempo atual. Pertenço a geração “X” onde as boas e verdadeiras amizades fluíam e cresciam com o tempo.

  2. Terezinha Tomaz disse:

    Que maravilha!
    Tempos que não voltam mais!