Carta do mipibuense Cristóvão Cavalcante, atualmente, residindo no Rio de Janeiro para Luís de França, auto-exilado, na comunidade de Mendes

"(...) Lembras do Burro Preto? São José de Mipibu tinha, também, outros personagens.

Tinha Burro Preto (Dr. Donald), e até Fuscão Preto (ex-prefeito Leonel Santos), Burro Lola, Piston, Tocador, Mestre Ivo, Mané Canção, Mané Cacinha, Tito, Cocão, Perna Longa (tem dois filhos em Mipibu, um deles, Chico de Longa).

Acho que Chico de Longa é político, bem diferente do pai. Educado e de destaque. Nossa Mipibu tem de tudo, não é uma cidade baiana, mas Tem muito dendê. Sempre foi "apimentada".

Uma cidade diferente de todas a sua volta, Nísia floresta, Monte Alegre, Brejinho, Georgino Avelino, Arêz, Goianinha, Pedro Velho, Canguaretama e me arrisco a dizer, até Parnamirim. Antes, na nossa época, Parnamirim era uma parada para ônibus. Só existia a rua principal. De destaque a casa de Don João Izaías, irmão de Zezé Izaías, pai de Abel, de Afrânio e Totó. 

Raimundo Totó, também era um personagem folclórico de Mipibu. Por sinal teve um final trágico. Mipibu tem acontecimentos, que em outras cidades não tem.

Coisas engraçadíssimas. Quando a gente da velha guarda se junta, ficamos a relembra do nosso passado. É engraçado de mais. Tem aí, uma "enciclopédia ambulante" - o amigo Antônio Fagundes.

É cômico quando nós, nos encontramos a relembrar, aqueles tempos gostosos, que vivemos felizes, apesar das dificuldades, que para nós era imperceptível. Era bom demais. Nós não tínhamos nada, mas tínhamos tudo. Amizade verdadeira, simplicidade e muita harmonia. Tínhamos amigos, que se entendiam e éramos irmanados.

Não sei se você percebe, eu percebo: os mipibuenses de hoje, são arrogantes e dá muita importância a status. O status da gente era a amizade sincera e muita cumplicidade. Muitas vezes estou em casa ou em outros lugares e passa um filme gostoso, repassando uma velha película como se fora do velho cinema Santana, do saudoso 'seu' Dercio, que também era uma figura folclórica de Mipibu). Ele anunciava um filme dramático como se fosse uma comédia.

Anunciava a música oferecida "a um alguém na voz" do cantor Roberto Mulher. O correto seria, Roberto Miller. Você lembra, a maravilha do Coreto? Sentar no coreto para prosear e comentar os ocorridos engraçados, chupar pitombas (um cacho nas mãos era chique. Ninguém reprovava ou achava 'demodê' (que está fora de moda). Comer milho cozido ou assado, tomar sorvete, daquela máquina caga em pé!

Comer cachorro quente de dona Maria do Boi, que também era uma figura folclórica. Comer picado de porco, nas sextas-feiras à noite, antecipando a feira, realizada aos sábados, numa barraca de um crioulo (que tinha um dente de ouro). Ele vinha de Monte Alegre vender picado, numa lata de querosene. 

Ah meu Deus! Tempo bom, como dizia o humorista Lilico: "Tempo bom lê, lê... Não volta mais..."

Saudade.