O Sínodo e o Espírito Santo

junho 7, 2024

Pe.

Pe. Matias Soares - Pároco da paróquia de S. Afonso Maria de Ligório Natal-RN

A Arquidiocese de Natal está para celebrar e viver o seu Sínodo. É desejo e orientação pastoral do nosso Arcebispo Metropolitano, Dom João Santos Cardoso. Esse será um acontecimento que pode renovar as esperanças no avanço pastoral das nossas comunidades eclesiais, com o olhar atento às alegrias e às angústias do homem de hoje (cf. GS, 1), sendo ele um momento para aprofundarmos a nossa “caminhada conjunta”.

A Igreja tem que assumir o que já fora preocupação do Concílio Vaticano II. Ela pensa a sua identidade mais profunda – Lumen Gentium – para poder dialogar com o mundo e suas transformações permanentes – Gaudium et Spes. O que a Igreja Particular de Natal está para realizar precisa ser uma oportunidade de abertura aos sinais do Espírito Santo nos nossos dias. Há a urgência de ouvir o que Ele – O Espírito Santo – diz à nossa Igreja (cf. Ap. 2-3). Só com o seu protagonismo, podemos falar num autêntico “aggiornamento” – atualização – das nossas percepções, atitudes e estruturas pastorais. O sínodo não pode ser um acontecimento simplesmente burocrático.

À luz da “Praedicate Evangelium” a Cúria arquidiocesana também precisa ser reformada nos seus procedimentos. Precisa ‘sair’ mais para as fronteiras eclesiais e sociais. Esse documento deve ser recepcionado por nós. Por mais que as questões sacramentais, disciplinares e administrativas sejam importantes, o que está em questão é a leitura e o discernimento dos sinais dos tempos, com a inserção da ‘alegria do evangelho na história e na nossa casa comum, através do nosso testemunho e das nossas palavras, como discípulos e missionários do Único mestre e senhor.

Num artigo, de relevância para o contexto do Concílio Vaticano II, o teólogo Karl Rahner afirmou que “na consciência de sua fé, a Igreja sabe que o Espírito faz parte dela e que ele lhe é insubstituível. A Igreja ensina expressamente que dela fazem parte não apenas o ministério, a instituição, a tradição, as normas imutáveis, o planejado, o previsível. Ela sabe que o inesperado e o imprevisível de sua história não se resumem às situações imponderáveis que lhe advêm de fora e consegue levar a bom termo aplicando seus princípios sempre iguais.

A Igreja tem a consciência de que o Espírito de Deus se encontra inserido no âmago de seu ser, o Espírito vivo que continua agindo e impulsionando e que jamais se transmudou adequadamente para colocar-se à disposição da Igreja naquilo que chamamos de ministério, de princípios, de sacramentos e de doutrina” (cf. “Não extingais o Espírito”, pág. 23). O teólogo está a enfatizar a dimensão carismática da Igreja que não pode ser colocada em segundo plano, no seu dinamismo histórico e missionário.

Em tempos de chamada do Papa Francisco para o estilo sinodal da Igreja, com a conscientização de que o protagonismo deve ser atribuído ao Espírito Santo, muito tem a nos dizer o que outros gigantes da teologia contemporânea nos ensinam sobre essa relação entre um sínodo a ser vivido por uma Igreja Local e a abertura à ação do Espírito Santo num processo desta magnitude e relevância para a vida da nossa Igreja Local. É fundamental que todos os sujeitos eclesiais e organizações diocesanas estejam envoltos e abertos às moções deste Espírito que é quem renova todas as realidades da vida da Igreja.

O momento nos é favorável. O próprio sínodo sobre a sinodalidade nos oferece o conteúdo, a metodologia e os horizontes a serem contemplados nesse processo. Alinhados à ‘justa hermenêutica’ conciliar (cf. J. Ratzinger. “Relatório sobre a Fé”, pág. 65-83), o olhar para a realidade interna da Igreja e a sua abordagem na relação com o mundo, contemplando e envolvida com os acontecimentos da história, fortalecida pela ‘alegria do evangelho’, em nosso contexto norte-rio-grandense, a Igreja Particular de Natal é chamada a assumir o seu dinamismo missionário, eclesial e profético.

Há uma urgência de fazer com que a ‘orquestra eclesial’ viva a ‘sinfonia do Espírito’ (cf. At 2,1-11). Faz-se mister essa abertura confiante e orante de todos nós. A paixão pela evangelização é o que precisa fazer parte das nossas ‘rodas de conversas’. Esse testemunho é o que nos fortalecerá e nos credibilizará para caminharmos confiantes na presença do Senhor que está sempre conosco (cf. Lc 24, 13-35). Temos que rezar mais essa passagem do evangelho.

A caminhada eclesial é permanente; mas não só como conhecimento teórico da pessoa de Jesus Cristo. É experiência e reconhecimento de que precisamos estar sempre com o Senhor, já que “o encontro com Cristo, continuamente aprofundado na intimidade eucarística, suscita na Igreja e em cada cristão a urgência de testemunhar e evangelizar (cf. João Paulo II. “Mane nobiscum Domine”, cap. IV, 24). O Sínodo arquidiocesano terá esse primeiro desafio, que é o de favorecer todos os meios para que o “encontro pessoal com o nosso Mestre e Salvador” aconteça e converta os corações dos fiéis ainda não comprometidos autenticamente com a missão. 

O nosso Sínodo pode ser coroado com um Congresso Eucarístico, considerando e confirmando a “Eucaristia, como princípio e projeto de ‘missão’” (cf. João Paulo II. “Mane nobiscum Domine”. Cap. IV). Como carta apostólica programática para o ano da eucaristia, assim ensinou o pontífice de então: “a Eucaristia oferece não apenas a força interior, mas também em determinado sentido o projeto. Na realidade, aquela é um modo de ser que passa de Jesus para o cristão e, através do seu testemunho, tende a irradiar-se na sociedade e na cultura.

Para que isso aconteça, é necessário que cada fiel assimile, na meditação pessoal e comunitária, os valores que a Eucaristia exprime, as atitudes que ela inspira, os propósitos de vida que suscita” (cf. Idem, n. 25). A Eucaristia é a fonte e o ápice da missão da Igreja, já que, “por sua natureza, o amor celebrado neste sacramento pede para ser comunicado a todos. Aquilo de que o mundo tem necessidade é do amor de Deus, é de encontrar Cristo e acreditar n'Ele. Por isso, a Eucaristia é fonte e ápice não só da vida da Igreja, mas também da sua missão: ‘uma Igreja autenticamente eucarística é uma Igreja missionária’” (cf. Bento XVI. Sacramentum Caritatis, n. 84).

Por fim, devemos chamar em causa o testemunho dos nossos Protomártires do Brasil, que banharam nossas terras com a radicalidade do seguimento de Jesus Cristo e sua fidelidade à fé. Sem dúvida, o Espírito Santo foi a força consoladora naquele fatídico momento, no qual um deles – Mateus Moreira – exclamou: “Louvado seja o Santíssimo Sacramento!”. O Sínodo a ser celebrado tem que nos situar eclesialmente, no hoje dos novos tempos, na docilidade aos dons do Espírito, com os corações e mentes voltados ao que é essencial da nossa vida cristã e eclesial. Assim o seja!

Uma resposta para “O Sínodo e o Espírito Santo”

  1. Pe. Lucas Neto disse:

    Relevante todo esse conteúdo que o Pe. Matias abordou, com eficiência e, decerto, inspirado pelo Espírito. Que aconteça esse Sínodo em nossa Arquidiocese, para que nos sintamos uma Igreja coesa, sob a luz do Espírito Santo, numa rica vivência eucarística. Obrigado, Pe. Matias, com suas sábias palavras.