Na guerra de narrativas todos vencem, menos a verdade

junho 29, 2025

CEFAS CARVALHO – Jornalista e Escritor (Texto publicado na Agência Saiba Mais) Na segunda-feira (23 de junho) à tarde, o presidente dos EUA, Donald Trump, do nada comunicou que havia mediado um cessar-fogo entre Israel e Irã e que estava feliz com a paz mundial que viria.

CEFAS CARVALHO - Jornalista e Escritor (Texto publicado na Agência Saiba Mais)

Na segunda-feira (23 de junho) à tarde, o presidente dos EUA, Donald Trump, do nada comunicou que havia mediado um cessar-fogo entre Israel e Irã e que estava feliz com a paz mundial que viria. Durante a madrugada, foram registrados ataques tanto de um lado como do outro, contra Tel Aviv e Teerã. E na terça de manhã, Trump, bem, irritado, ao ver que Israel e Irã mantiveram ataques mútuos declarou: “Temos dois países lutando há tanto tempo que não sabem que porra estão fazendo”. Até que por fim (digo, até o momento) no fim da terça/começo desta quarta Israel e Irã concordaram com o cessar fogo e ambos se declararam vencedores da guerra, ou melhor, do conflito de 12 dias.

Mas, espera aí, como pode os dois lados terem vencido ou se sentirem vitoriosos? Calma que tem mais. Mesmo com essa bagunça de informações, Trump está se vendo como um mestre da mediação e seu entorno defende que ele seja laureado com o Nobel da Paz. Mas como um mediador pode ser parte interessada e aliada de um dos lados, além de ter bombardeado um dos conflitantes? Lembrei de frase atribuída ao dramaturgo grego Ésquilo: “numa guerra a primeira vítima sempre é a verdade”. Ainda mais em tempos de pós-verdade, fake news e batalha de narrativas.

Vamos aos fatos, ou ao menos dar uma de investigadores para entender as narrativas que cercam o conflito. Após o cessar-fogo mediado/imposto/fabricado por Trump, o chefe das forças armadas de Israel, Eyal Zamir declarou que os esforços israelenses contra o Irã “foram encerrados com sucesso”. Mas o líder supremo Benjamin Netanyahu não havia dito semana passada que a guerra só estaria terminada quando o líder supremo iraniano, o Aiatolá Khamenei fosse morto e que o país mudasse seu regime?

Já o presidente do Irã (não confundir com o aiatolá Khamenei) Massoud Pezehkian. disse que Israel foi obrigado a interromper sua agressão militar após sofrer uma punição “severa e histórica” e que “as perdas de Israel foram inimagináveis”. Mas Khamenei também não havia insinuado semana passada que Israel sentiria algo que o mundo iria lembrar por séculos?

Tem mais narrativas “tronchas”, como se diz no Nordeste: Israel anunciou a morte de Esmail Qaani, general da Guarda Revolucionária e comandante da inteligência militar, mas Teerã divulgou fotos dele celebrando a, digamos, vitória iraniana nas ruas. Não sabemos de onde Israel tirou a informação da suposta morte. E também não sabemos se o sujeito em questão é o das fotos e se as imagens não são antigas.

Segundo a CNN, os ataques dos EUA a três instalações iranianas não destruíram os principais componentes do programa nuclear e que os estoques de urânio enriquecido continuam intactos. Mas Trump e seus ministros declararam que o ataque foi realizado com perfeição e atingiu seus objetivos (que era, segundo os EUA, destruir justamente as possibilidades do Irã fabricar bombas atômicas e nucleares.

Lembrando que os bombardeios contra instalações iranianas foram realizados e justificados porque para EUA e Israel, os iranianos “não podem ter bombas nucleares”, frase explicitamente dita por Netanyahu. Porém, EUA e Israel têm bombas nucleares. Assim como a Rússia, de Vladimir Putin. Qual o critério para se ter bombas nucleares, então?

Enfim, toda a tecnologia e expansão digital (Internet como carro-chefe dela) serviram, não para explicar, mas para confundir, como diria o mestre Chacrinha. Cada vídeo que nos chega serve para reforçar uma ou outra narrativa, ao gosto do freguês e das paixões ideológicas de momento. Afinal, Tel Aviv está devastada ou os mísseis iranianos atingiram apenas alvos pontuais? Morreram milhares de iranianos nos bombardeios de Israel ou apenas foram atingidos alvos militares? Não sabemos e possivelmente não vamos saber. Conta sua versão quem quer e quem pode e acredita quem quiser com base em suas convicções e seus ódios.

De fato mesmo, só a frase do citado militar isralense Eyal Zamir, que disse que “é hora de se concentrar em Gaza”. Aí sim, a narrativa da “guerra” israelense contra uma população sem tanques, sem bombas,sem exército e que luta atualmente para sobreviver, só funciona mesmo para quem adotou Israel como paixão ideológica mais como seita do que como geopolítica. Para o povo palestino a narrativa é uma só: ser dizimado por Israel sob as bênçãos dos EUA e a compolecência mundial.

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