ARTIGO: Da Teologia da Libertação ao circo
Pe Waldemir Santana – Arquidiocese da Paraíba A Teologia da libertação está celebrando 50 anos de muita fecundidade, ternura e vigor.

Pe Waldemir Santana - Arquidiocese da Paraíba
A Teologia da libertação está celebrando 50 anos de muita fecundidade, ternura e vigor. Esta Teologia é um dos frutos mais preciosos do Concílio Vaticano II e das Conferências de Medellin e Puebla. Ela nasceu na periferia do mundo e hoje adquiriu cidadania mundial.
Como todo conhecimento humano, ela foi e continua sendo vítima de críticas ácidas e injustas. Sabemos que isso é natural, pois, as divergências existem em todos os campos do saber. Um caminho normal que todo conhecimento está sujeito. A TL não quer ser uma simples teoria teológica, mas pretende contribuir para que toda a Igreja na sua globalidade seja libertadora.
As suspeitas levantadas por grupos da extrema direita católica, no que diz respeito a ortodoxia, carecem de base bíblica e teológica. As críticas desses fanáticos não partem do verificável, mas de um universo pseudo simbólico nebuloso. O que os membros desses grupos querem, é deslegitimar uma experiência de Igreja que tem como sua força motriz a Palavra de Deus. A finalidade desses grupos extremistas católicos é diminuir a influência dessa experiência eclesial de base e assim voltar a um passado jurássico da história da Igreja.

da paz, a educação libertadora e uma Igreja pobre em defesa dos empobrecidos’(Padre Ney de Souza)
O que a TL procura fazer é que a Revelação de Deus na pessoa de Jesus, responda as perguntas que estão no hoje da história. Toda teologia é ato segundo, por isso, ela procura ler a Revelação dentro de um enquadramento histórico de opressão. Destarte a opção pelos pobres alimenta essa teologia na sua raiz.
Quando João XXIII, no Concílio coloca o pobre como centro da Igreja, as consequências e as implicações do seu desejo de dar centralidade aos descartados da vida, eclodiria na América Latina na Conferência de Medellin. A TL materializou o desejo de João XXIII e do Cardeal Lercaro.
Uma Igreja pobre para os pobres precisa entrar num processo de repensamento dos seus ministérios.

Todos entendem o ministério enquanto serviço e não como poder. Essa relação na Igreja de hoje é confusa. Os carreiristas desejam poder e não servir, por isso, esse clericalismo doentio que vemos hoje. O poder pode ser um empecilho no trabalho evangelizador, aliás como disse o grande historiador Jean Delumeau, “o poder não evangeliza.”
A TL no seu caminho objetivo, confia no poder evangelizador das Ceb’s. Esse é um novo modo de ser Igreja e dessa forma os ministérios adquirem uma nova configuração.
Por que a TL é tão atacada? Sem dúvida aqueles que a atacam poucos leram os teóricos mais credenciados dessa teologia. O jogo de continuidade e rupturas é próprio de cada tempo. No hoje da história, a TL retém os elementos positivos e válidos, corrige os limites e cria novas iniciativas para os desafios que surgem. A TL capta os sinais dos tempos como lugar teológico que se mostram relevantes e aponta caminhos de conversão e superação.
Essa teologia é atacada, simplesmente por estar ao lado dos pobres e defender a sua dignidade. Estar ao lado dos pobres. Quem pode condenar essa opção sem estar contra Jesus? Garimpando os Padres da Igreja, eles sempre estiveram ao lado dos pobres. Aqui está a gênese da TL. Foram homens doutos e santos. Hoje eles seriam rotulados de comunistas. A Igreja tem um enorme capital de presença junto aos pobres. Devido a cegueira e o unilateralismo doente dos extremistas católicos, padres, leigos e bispos são ofendidos por essa caterva infeccionada de uma ideologia enlouquecida.

Aqueles extremistas que não malham o cérebro acusam a TL de ser marxista. A teologia sempre usou mediações filosóficas. Tomás de Aquino usou como mediação hermenêutica a Filosofia de Aristóteles. A teologia usa sempre um elemento arquitetônico e um elemento hermenêutico. Hoje a grande maioria dos seminários produzem uma teologia para um mundo que não existe. Por isso essa teologia é autossuficiente, arrogante e dona da verdade.
Como uma forma de saber, a teologia precisa dialogar com as ciências sociais e outras ciências, para assim ter uma compreensão mais profunda do mundo, e dessa forma ter como interpretar a Revelação. Essa teologia dos seminários precisa descer do pedestal, dessa arrogância inoperante para escutar os saberes populares e discernir perspectivas para um agir libertador no mundo.

A TL nasce e continuará a nascer enquanto for possuidora da ousadia profética. Ela veio do arcabouço cultural do Vaticano II. O 15º encontro das Ceb’s provou que ela está viva. Aqueles que perguntam sobre o que restou da TL, Casaldáliga responde com ironia profética: “Restou Deus e os pobres.” Enquanto houver pobre neste mundo haverá TL, pois ela é útil e necessária.

O que vemos hoje na Igreja, principalmente nos algozes da TL, é um verdadeiro circo de mal gosto nas celebrações. Os vídeos que circulam nas redes digitais de clérigos, refletem a mediocridade que alguns estão vivendo. Temas complexos de psicologia são tratados com a profundidade de uma laje, isto é, profundidade nenhuma. A celebração eucarística memorial da Páscoa de Jesus, se transforma num show para entreter a plateia.
As vestes litúrgicas medievais são recuperadas para expressar uma falsa fidelidade a uma tradição obsoleta. Capas, alvas, casulas, barretes, batinas e outras indumentárias cada uma mais vistosa do que as outras, tudo isso retrata a cultura da aparência que eclodiu na vida da Igreja. Em muitas celebrações pelo Brasil afora, parece-nos mais que estamos num desfile de moda eclesiástica do que numa celebração onde se rememora e se comemora no hoje da vida e da história, o mistério pascal.

Diante de tanto exagero litúrgico muitos se perguntam: Estamos numa igreja ou num circo? Se for num circo é de mal gosto, pois, a máxima teológica afirma que o ministro age na pessoa de Cristo. Mas os antigos já no advertiam: “Quando o circo é fraco, o palhaço precisa ser enfeitado.”