DEUS TE ABENÇOE, FILHO

julho 6, 2025

José Luiz Ricchetti Era um dia qualquer, desses em que a alma passeia distraída entre as barracas da feira.

José Luiz Ricchetti

Era um dia qualquer, desses em que a alma passeia distraída entre as barracas da feira. O cheiro de verdura fresca, o barulho dos abacaxis se ajeitando na lona, e os gritos ritmados dos feirantes quase formavam uma sinfonia. Foi então que, entre um tomate maduro e uma dúzia de ovos caipiras, ouvi o que parecia um sussurro sagrado:

“Deus te abençoe, meu filho…”

Uma senhora, vendedora de tomates e esperança, falava ao celular. A voz, cansada e doce, se perdia no tumulto da manhã, mas encontrou eco dentro de mim. Senti um nó na garganta. Voltei, de repente, a ser menino. E escutei, como um eco antigo vindo lá do tempo: “Deus te abençoe, meu filho…”

Minha mãe partiu cedo. Mais cedo do que meu coração estava preparado. Não houve aviso, nem despedida, só o silêncio de um quarto e o barulho do mundo seguindo.

E por muitos anos, confesso, me lamentei. Me doía não ter estado lá, naquele momento para ouvir ‘Deus te abençoe meu filho’, pela última vez. Me doía o telefone mudo, a porta que nunca mais se abriu com cheiro de bolo, a bênção que virou lembrança.

Mas a vida, que tem lá seus jeitos de nos ensinar sem manuais, me mostrou outra coisa: não se trata de não escutar mais o “Deus te abençoe”. Trata-se de agradecer por todas as vezes que escutei.

Porque minha mãe continua.

Em cada vitória que celebro, em cada tropeço que me levanta.

Em cada dia atribulado, em cada momento de paz.

Ela vive na lágrima que escorre e no suor que insiste.

Na alegria que brota e na tristeza que ensina.

Na preocupação que me visita e no abraço que acolho.

E então entendi: não é preciso ouvir para ser abençoado.

Basta lembrar.

Basta sentir.

Basta amar.

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