Sim, meninos, eu vi

novembro 24, 2024

Nilo Emerenciano – Arquiteto e escritor Estamos no século XXI, vejam só.


Nilo Emerenciano - Arquiteto e escritor


Estamos no século XXI, vejam só. Quando falávamos disso, décadas atrás, nossa imaginação pintava um mundo e um país melhor. O futuro é nosso, era o esperado pois o Brasil era o país do futuro, um país jovem e cheio de expectativas. Nem o mais pessimista de nós projetava um amanhã sombrio, afinal, éramos campeões do futebol e tínhamos Pelé.

Eder Jofre mostrava nos ringues que éramos bons também trocando socos. Maria Esther Bueno pontificava no tênis. Martha Vasconcelos era a miss Universo. A bossa nova ganhava o mundo e a mulata brasileira era a tal.

A ditadura? Apenas um detalhe que logo passaria e a vida retomaria seu curso normal, afinal, não temos terremotos nem vulcões. E somos um povo de caráter cordial, foi o que aprendemos na escola.

E como seria esse curso normal? Ora, um caminho que levasse a uma educação de primeiro mundo, saúde idem, pleno emprego, fome zero e por aí. Em primeiro lugar, votaríamos para presidente e os militares voltariam para os quartéis de onde nunca deveriam ter saído a não ser para pintar meios-fios e, claro, elegeríamos as pessoas certas, honestas e capazes para o Congresso, Senado e presidência da República.

“Deixem com a gente”, era o nosso pensamento, pois éramos jovens e o mundo era nosso. Lembram do lema “Paz e amor”? Pois é isso. Ou era.

Mas, como diria Drummond, no meio do caminho havia uma pedra, ou muitas pedras. A redemocratização seguiu caminhos acidentados, desde a morte dramática de Tancredo Neves, os tempos turbulentos de José Sarney, o plano Collor de sequestrar nossa poupança suada, o topete de Itamar, o advento do Plano Real e, enfim, o controle da inflação.

Aí o que não imaginávamos possível aconteceu, um operário no poder. Não só Lula, mas um partido com origem nas lutas sindicais. O resto vocês sabem, veio Dilma Roussef e enfim o desastre: um homem expulso das forças armadas, ignorante completo, afeito a palavrões e arroubos de grossura ganha a eleição.

E passa a sonhar se perpetuar no poder, pondo em questão as urnas que o elegeram e ameaçando todos que ameacem o seu projeto de criar uma dinastia, ou seja, eleger, sucessivamente, os vários filhos que ele de forma aviltante, chama por ordem numérica, número 01, 02, 03, 04…

Apesar de tudo - ameaças, grana, ilegalidades, as eleições aconteceram e o candidato eleito tomou posse mesmo sem ter quem lhe passasse a faixa, nem o ex presidente nem o vice.

Aí, quando pensamos que o pesadelo acabara, veio o 8 de janeiro e aquelas cenas trágicas da invasão e depredação da sede das instituições. Vamos combinar, vocês, mesmo nas piores elocubrações, imaginaram fosse isso possível? E pior, ainda não havia acabado, tipo História Sem Fim. Restava a cereja do bolo de toda essa tragicomédia. O arremate.

Foto: Carta Capital

Não é que os gorilas planejaram e quase executaram um plano mirabolante, digno de filmes de espionagem? Um filme de péssimo roteiro e ação atrapalhada, mas o que não afasta o fato de ser um grave ato criminoso. Um show de - graças a Deus – incompetência e pensamento violento.

O plano era assassinar, pasmem, o presidente da República eleito, o vice, e o presidente do Supremo, Alexandre Morais. Que gente é essa? Kids Pretos? Assassinos pretos, isso sim. Bandidos. Para eles, o rigor da lei.

Foto: YouTube

Amigos, já passamos por isso. Primeiro a disseminação de falsas notícias e criação de ameaças imaginadas, como o perigo comunista, a supressão de liberdades, o atentados à moral e bons costumes. Depois as articulações de bastidores. Enfim o golpe, violento, desumano, atingindo até alguns dos que dele participaram.

Sim, meninos, eu vi. Vi as liberdades suprimidas. Vi as pessoas falando em voz baixa, com medo de expressarem a própria opinião. Livros, revistas, músicas, jornais, peça de teatro e filmes censurados e proibidos. Amigos presos. Amigos torturados e mortos. Outros fugindo do país. Vi uma amiga publicar um livro com as páginas todas em branco. Bancas de revistas explodidas. Direitos cancelados sumariamente. Uma guerra surda que durou vinte anos.

Foto: Jornal A Verdade

Falo então a vocês de cadeira: não pensem que foi brincadeira, que foi sopa. Nem achem que estão livres por ter essa ou aquela opinião. Se for o caso, você está sendo enganado. Ouçam os que tiveram a dignidade de lutar contra tudo aquilo e sobreviveram. Ouça a história de Miriam Leitão, jornalista da Globo, concorde ou não com suas opiniões. Vai saber que ela foi colocada em uma cela aos dezenove anos, grávida, torturada e obrigada a partilhar o pequeno espaço com uma cobra. Os autores? Esses mesmos que agora querem dar sumiço a autoridades da República.

Ditadura: Míriam Leitão conta como, grávida e nua, foi torturada com uma cobra - Foto: UOL Notícias

Não, não foi fácil. Vamos então marcar posição. Pela democracia, pelos direitos constitucionais, pela normalidade no nosso cotidiano. Sigamos!

2 respostas para “Sim, meninos, eu vi”

  1. Lourdinha Oliveira disse:

    Penso que, crime de estupro, tortura contra mulher e homem inocente, a punição seria fazer o mesmo sobre o criminoso, por tempo de 100 anos!

  2. Luis Meneses disse:

    A divisão do poder entre partidos que pouco o nada fazem, Unidos ao fato de ter nos poderes pessoas ricas que pouco o nada se importam com o bem-estar do povo, e possivelmente a principal causa das desgraças.
    Tentar ser aprovado pelo mundo capitalista querendo usar coisas socialistas e coisa que dificilmente de certo sem pasar por uma revolução verdadeira que marque presença com cabios reais e profundos tanto na mentalidade como na maneira de atuar do governo e seus governantes.