Região de São José de Mipibu não é mais a mesma em relação a tranquilidade e segurança
Cristovão Ferreira – Mipibuense radicado no Rio de Janeiro/RJ (ferreiracristovao6@gmail.

Cristovão Ferreira - Mipibuense radicado no Rio de Janeiro/RJ (ferreiracristovao6@gmail.com)
No início dos anos 2000, retornei a minha terra São José de Mipibu, depois de mais de 30 anos, que decidi morar no Rio de Janeiro/RJ.
Fui recepcionado, na terrinha pelo amigo, Lourival Bezerra Cavalcanti, onde fiquei hospedado, em sua granja, na Ponta Funda da Lagoa do Bonfim. Lugar aprazível e tranquilo, onde esquecemos da violência, criminalidade e perigos da grande Metrópole que é a cidade do Rio de Janeiro.
Diante de tanta beleza e paz, ficava pensando: "- Aqui tudo é tranquilidade. Longe dos perigos..."
Vinha na lembrança, daquela São José de Mipibu, dos anos 60/70, tranquila e pacata, onde nos finais de semana, a gente reunia os amigos e transformava em "farra".

À tarde ia ao centro de São José de Mipibu, bater papo com antigos amigos e moradores. Às horas passavam... Quase meia noite, de bons bate-papos, que relembravam o nosso passado de criança e adolescente. Me despedia dos amigos, para retornar a casa do amigo Lourival, na Lagoa do Bonfim. Procurava na praça de táxi ou mototaxi um transporte, mas ninguém ousava fazer viagens para àquelas bandas da Lagoa do Bonfim. A única maneira que encontrava era ir a pé, no meio da escuridão.
Fazia o trajeto São José de Mipibu-Lagoa do Bonfim, de moto, carro, bicicleta, ou mesmo a pé. Os amigos sempre me alertavam:
- Cuidado! Após a comunidade de Mazapas o 'bicho pega'. Àquele trecho é muito perigoso!" Eu, dizia comigo mesmo: "- Que nada! Estou na minha cidade, aqui tudo é tranquilidade.
Quando estava sem condução vinha a pé, por dentro do 'talhão' (caminho dentro do canavial). Achava tranquilo. Algumas pessoas me alertava para ter cuidado com o 'Pé de Pirulito', logo após a Mazapa, por ter uma árvore mal-assombrada! Eu, ficava rindo, pois já havia passado ali várias vezes e nunca tinha visto nada. "Esse povo é cheio de lorota", pensava.

Certo noite, pedalando a bicicleta, passei por dentro do canavial. Tranquilo, passei pelo Pé de Pirulito e mais a frente, chegando próximo do 'passadiço' (passagem na cerca, em forma de um "S" para evitar passagem de animais), colocava a bicicleta por cima da cerca e prosseguia na estrada de terra, que passava na propriedade de 'Getulinho'.
Certa noite, fui surpreendido por um elemento que empunhava uma uma faca peixeira, tentando tomar a bicicleta. Reagi, diante do fator surpresa, aplicando-lhe um golpe certeiro mas, cheguei fui atingido com uma cutilada (golpe desferido com faca ou instrumento cortante), na barriga, sem muita gravidade. O indivíduo que me atacou caiu com o golpe que desferi, ficando desacordado. Na escuridão da noite, ainda cheguei a procurar a peixeira e não encontrei. Subi na bicicleta e pedalei em velocidade na direção a granja.
Chamei Lourival para retornar o local, onde fui agredido, para verificar se o indivíduo permanecia caído. Lourival me convenceu a não retornar, combinando que no dia seguinte, íriamos verificar alguma pista do agressor. O que fizemos, ao amanhecer. Chegando ao local, nada constatamos.
A sobrinha de Lourival que trabalhava no hospital local, de São José de Mipibu ficou em alerta para vê se alguém machucado dava entrada no Setor de Emergência. Nada.
Alguns dias depois, encontrei em Mipibu, um cara todo arrebentado, com o braço na tipóia ( um tipo de imobilizador que dá suporte às estruturas dos braços). Pelo biotipo, percebi que era o elemento que havia me atacado. Fiquei na defensiva e não falei nada. Os amigos me aconselharam a ficar precavido, porque o indivíduo era de uma favela perto do Alto Monte Hermínio, em Nisia Floresta.
Diante do que me aconteceu, não fiz mais aquele trajeto. A partir daí, sempre fazia trajetos diferentes, para não ser surpreendido.
Passado o tempo, esqueci o ocorrido. Os amigos voltavam a me avisar: "- Cuidado com Pé de Pirulito!" "Povinho medroso". Na cigarreira de Paizinho, na Praça Monsenhor Paiva, diziam para evitar passa ali pois tinha tromba. Achava, que eles queriam me amedrontar.

Certa noite, esqueci da hora. Participava de pagode na praça Monsenhor Paiva, quando percebi, que já era tarde, peguei a moto e meti o pé no acelerador. Chegando próximo ao Pé de Pirulito, surgiu um enorme cachorro, de cor preta com os olhos que pareciam duas tochas de fogo. Da maneira que apareceu, em fração de segundos, o animal desapareceu.
No dia seguinte, comentei o ocorrido. As pessoas diziam que naquela área havia histórias (ou estórias) de mal assombro. Com medo,passei a fazer o trajeto pelo Alto Santo Hermínio, em Nísia Floresta, pegando um talhão por dentro do canavial.
Falavam que, naquelas imediações, existia um cemitério clandestino. O assunto atiçou minha curiosidade e, um dia, pela manhã, fui verificar. Realmente, há uma estrada de acesso à Lagoa de Boa Água e naquele lugar se comentava ser um "cemitério clandestino", dentro da mata onde sempre passava.
Alternando meu percurso para chegar à Lagoa do Bonfim, nada vi. Também falavam que na Ponta Funda, à noite, aparecia algo estranho. Eu pescava e tomava banho na lagoa, sob a luz da lua, e nunca vi nada.
Geralmente, aproveitava o silêncio da noite e ficava cantando, na beira da Lagoa, já que não havia ninguém para ouvir a minha voz. O som de músicas antigas de: Nelson Gonçalves, Agnaldo Timóteo, Cauby Peixoto, Dalva de Oliveira, Elizete Cardoso, Ângela Maria, além de Boleros, Samba-canção, Tangos etc, se propagava no silêncio da noite e nos sítios próximos, chegando até os vizinhos ouviam minhas canções.

Certo dia, um curioso perguntou: "- Quem era o cara que ficava cantando até alta hora da noite ?
Fiquei rindo e não falei que era eu, com vergonha de ser criticado.
Bela ilustrações. Perfeito!
Obrigado.