PEGANDO PESADO
Valério Mesquita (mesquita.valerio@gmail.com)
01) O cenário é a Ribeira do pós guerra. Espólio comercial e cultural da presença americana. Numa vesperal de domingo conversavam na sacada superior do Grande Hotel duas figuras proeminentes do velho PSD: senador Georgino Avelino e o deputado estadual Lauro Arruda Câmara. Desviando a vista para a calçada, Lauro contempla e cumprimenta o irreverente João Alfredo Pegado Cortez, o conde de Miramontes que seguia, impávido, à pouca distância, uma mulher robusta que caminhava em direção as “casas de recurso” dos Coqueiros. O líder novacruzense, curioso, interpela: “João para onde você vai, uma hora dessa?”. Estendendo os dois braços no sentido da mulher da tarde, sem acanhamento, exclamou: “Vou trepar, não está vendo??”. Lauro, ruborizado, pediu, como que arrependido de haver cutucado o cão com a vara curta “que respeitasse a presença do senador”. Resposta de João Alfredo, sem olhar para cima, estirando o dedo médio: “Táqui pro senador, ó!!”.
02) A Ribeira, saudosa de guerra e paz, sempre foi palco das melhores histórias do humor natalense. Outro habitante sentimental de suas dimensões foi o inesquecível médico Pelúsio Melo. Já relatei algumas de suas histórias em um dos meus livros. A de hoje, mais uma vez, traz a verve, o repente e a criatividade, marcas registradas do personagem. Numa inspeção portuária na barra do rio Potengi em embarcação comercial lusitana, o navegante opunha séria resistência à vacinação dos tripulantes. O nosso intrépido médico da Delegacia Federal de Saúde manteve com o gajo português intenso bate-boca. Em arremate final, ao estilo bem nordestino, o velho Pelúsio foi genial no argumento: “Se eu aqui estivesse ao tempo da chegada do seu patrício Pedro Álvares Cabral, eu o vacinaria, tá bom!!!”. A discussão terminou imediatamente.
03) Ainda dos bons tempos chegam-me os causos de Morvan Dantas, irmão dos amigos Meroveu e Milson Dantas. Era brincalhão e irreverente ao extremo. Tendo o então senador Georgino Avelino prometido-lhe uma colocação, Morvan procurou-o aqui em Natal. “Seu emprego está conseguido. Vá urgente à Delegacia Regional do Iapetec em Recife e fale, em meu nome, com o delegado”. Sem demora viajou e travou o seguinte dialogo com o chefe: “Sou a pessoa do senador Georgino para a vaga prometida”. Fitando Morvan, serenamente, o delegado foi sucinto: “A vaga que temos aqui é pra enfermeiro. O senhor não tem a formação nem o perfil”. Morvan voltou decepcionado a Natal e enviou o seguinte telegrama: “Senador Georgino Avelino, Palácio do Monroe – Rio de Janeiro. “Pode botar o emprego que prometeu no pescoço em francês”. OBS: No idioma do general De Gaulle pescoço em francês escreve-se “COUR”. Daí…
04) Em Recife, onde estudava, Morvan foi vitima de uma brincadeira de mau gosto, nascida de uma aposta com colegas. O desafio proposto seria atravessar despido a procissão que passaria entre as duas pensões que alojavam os estudantes. Na hora aprazada, nu, Morvan misturou-se à multidão e quando procurou a porta da hospedaria de frente os colegas fecharam-na. Aflito, voltou para onde havia saído e o portão também não se abriu, por obra e graça do conterrâneo Wilson Dantas, um dos mentores da fanfarronice. Morvan refugiou-se num açougue mas não escapou de ser detido pela polícia. No governo de Agamenon Magalhães, cujo secretário de segurança era Etelvino Lins, somente foi liberado quando souberam que era filho do respeitável desembargador Virgílio Pacheco Dantas, que o requisitou de volta a Natal para os corretivos de praxe.