O jovem fenômeno

outubro 8, 2023

Alex Medeiros – Jornalista e Escritor @alexmedeiros1959 (Publicado na Tribuna do Norte) Quando a seleção brasileira varreu todos os adversários na Copa de 1970, no México, o mundo conheceu mais profundamente o homem que usava a famosa camisa que fora de Garrincha.

Alex Medeiros - Jornalista e Escritor @alexmedeiros1959 (Publicado na Tribuna do Norte)

Quando a seleção brasileira varreu todos os adversários na Copa de 1970, no México, o mundo conheceu mais profundamente o homem que usava a famosa camisa que fora de Garrincha. Marcando gols em todos os jogos, Jairzinho ganhou o apelido de “Furacão”. Há mais ciência do que licenciamento poético na comparação do craque do Botafogo com o poderoso fenômeno climático. 

E como todo furacão só aumenta poder acumulando a força de outros ventos, Jairzinho acabou sendo o responsável pela reprodução de um fenômeno no grande ambiente do futebol. E tudo começou como um sopro nas ruas do bairro carioca de Bento Ribeiro. Um menino pobre, feio, dentuço e tímido, que tinha todos os apetrechos para compor o perfil dos anônimos brasileirinhos trazia nos pés a rapidez dos ventos e o poder dos furacões.

E como nos sistemas de baixa-pressão das terras tropicais, o “Furacão 70” percebeu que estava diante de um poder capaz de estourar a escala Saffir-Simpson, que mede os fenômenos eólicos, ou simplesmente a boca do balão.

Ainda adolescente, o garoto Ronaldo exibiu no modesto time do São Cristovão um talento que só se via nos craques. Caras como Zico, que o pobre menino sonhava ver no Maracanã. A profissionalização soprou antes da puberdade.

O final da década de 1980 abriu os céus da oportunidade. E lá estava Ronaldo sendo tratado como um raro diamante em oficina de joalheria. Com idade de juvenil, estreou oficialmente nos titulares do Cruzeiro, no Brasileirão de 1993.

om 17 anos, Ronaldo já era um 'Fenômeno'… Foto:: O Gol

Naquele mesmo ano, o furacão teen encarou os zagueiros do Bahia, dando os primeiros sinais de que o mundo ainda seria varrido por sua força e agilidade. Não tinha ainda 17 anos e meteu cinco gols na goleada por 6 x 0.

A trajetória de Ronaldo se estende de 1993, no Cruzeiro, até 2002, na Inter de Milão, no mesmo ano em que dividiu com Rivaldo a glória da conquista do pentacampeonato brasileiro. Na Inter, ganhou o epíteto “Il Fenomeno”.

De 1994 a 1996, com a camisa do PSV Eindhoven, aquele jogador que desmanchava as estatísticas e ameaçava Pelé na relatividade entre gols e idade, arrebatava público e crítica da Europa com suas arrancadas ciclônicas.

Lançado muito cedo às feras e ao circo do futebol, Ronaldo teve que dividir sua vida em dois momentos: um de glória, com a bola nos pés; outro de drama, com a cabeça nas carências típicas dos adolescentes. Não deu no jogo aéreo.

O “fenômeno” que há em Ronaldo não está diretamente ligado ao futebol mítico dos gênios. Ele não jogou como Pelé ou Messi, não marcou gols como Romário ou Gerd Müller, não teve a técnica de Zico, Maradona e Zidane.

Sua fenomenalidade pertence à construção da conjuntura em torno dele; ungido como primeiro craque representante da era globalizante do futebol. Foi a versão chapliniana dos “tempos modernos”, sendo um operário bem pago.

A fase madura de Ronaldo, em que interesses publicitários o fizeram craque reciclável, não pode nos fazer esquecer os verdadeiros momentos do seu talento. É no Barcelona e na Inter de Milão que reside toda a sua categoria.

Quando chegou na cidade catalã, revelou-se nos primeiros dias como fizera no Cruzeiro aos 16 anos. Seus gols incríveis geravam manchetes espetaculares, até mitificantes: “Ronaldo é um bruxo? É um deus? É o messias do futebol?”.

No dia em que meteu três gols no goleiro Zubizarreta, um jornalista escreveu: “A Liga está adulterada. O Barcelona receberá uma advertência por inscrição indevida. Existem razões para crer que o tal Ronaldo é um extraterrestre”.

É preciso resguardar historicamente o craque que encantou o mundo até 2002, concluindo nas traves orientais as jogadas de Rivaldo. O Ronaldo fenomenal não deve ser misturado nas engrenagens da fábrica de mitos que constrói e destrói coisas belas.

Ronaldo Fenômeno Foto: DOL

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