O BALÃO VAI SUBINDO
NILO Emerenciano – Arquiteto e escritor A chuva do outro fim de semana ligou em mim o modo nostalgia e escrevi sobre coisas antigas que sumiram do nosso dia a dia.

NILO Emerenciano - Arquiteto e escritor
A chuva do outro fim de semana ligou em mim o modo nostalgia e escrevi sobre coisas antigas que sumiram do nosso dia a dia. Amigos enviaram mensagens comentando que eu havia deixado muita coisa de fora. É verdade. É que me autoimpus um limite de espaço, equivalente a duas laudas como a gente falava antigamente, no tempo do papel almaço. Além disso sou prolixo e emendo um assunto com outro. Viram? Acionei de novo o modo recordar é viver.

Pediram pra que eu incluísse programas de rádio. De cara lembro o Patrulha da Cidade, de grande sucesso popular, falando de crimes e criminosos. Era tempo de bandidos que se tornavam famosos, tipo Brinquedo do Cão, figura meio folclórica. Acho que ele nunca soube que foi tema de um quadro do artista Vicente Vitoriano, chamado, se não me engano, o Bandido. O esquadrão da morte do Rio de Janeiro inspirou o surgimento em Natal, do Mão Branca, grupo que eliminava marginais.

Ubiratan Camilo era meu vizinho, em Ponta Negra, e transmitia as notícias usando o orelhão de uma mercearia próxima. Rolava, Paulo Queixada, Nandinho do Mereto e outros bandidos da pesada. Ubiratan era um tipo destemido. O filho, Gibran, segue os passos do pai e tem um canal no You Tube chamado "Natal em Chamas". O slogan da rádio Cabugi era de uma pretensão descomunal. O locutor anunciava: - Se a Cabugi não deu, a notícia não aconteceu!!!
Mas o rádio era também diversões leves, tipo programas de humor. Coronel Ludugero, personagem de Luís Jacinto, fez um enorme sucesso. Vitório e Marieta eram um casal de italianos engraçadíssimos. O programa Balança Mas não Cai ia ao ar ao meio-dia. Paulo Gracindo, Brandão Filho e Lúcio Mauro eram parte do elenco. Esses humoristas depois fizeram também o programa na TV.
Não posso deixar de fora os seriados no cinema Rex, nos domingos de manhã. Era programa pra meninada que fazia uma enorme gritaria para torcendo pelo mocinho e vaiando o vilão. Alguns de nós levavam revistas para trocar ou vender na calçada do cinema. Imaginem se isso seria possível em um shopping center?


Vocês sabem que se fazia novelas de rádio em Natal? Pois é, havia produção de novelas na rádio Poti. Genar Wanderley, Ernane Dantas, Glorinha Oliveira, Sandra Maria, eram alguns do cast. Por isso alguns dizem que Natal é terra do já teve.
A lagoa Manoel Filipe também já teve seus dias de glória. Contava com restaurante, pedalinhos, ilha dos macacos, zoológico, barcos de aluguel e espaço para apresentações. Lá aconteciam quermesses e feiras que a gente visitava contornando as margens da lagoa. Depois tornaram-na Cidade da Criança e hoje nem tenho ideia se funciona de alguma forma.

Em Areia Preta existia a praça da Jangada, com uma jangada de alvenaria posta sobre um espelho d’água. E um trampolim instalado sobre as pedras. Os mais ousados enfrentavam as ondas e a arrebentação mergulhando lá de cima. Não dá pra imaginar algo desse tipo hoje, em nome da segurança e para evitar processos judiciais duradouros. Alguns bares de beira-mar marcaram época: O Veleiro, o Iara Bar e a peixada de Marcos. O Iara era reduto de estudantes e artistas nos fins de noite.
Nos anos do governo Cortez Pereira muita coisa aconteceu. Lá no alto da Ladeira do Sol foi construído um restaurante chamado Mirante. No final da Alexandrino de Alencar inaugurou-se o Bosque dos Namorados, onde a polícia estava para proteger, e não reprimir, os casais apaixonados. Cortez era homem de visão. Levou um grupo de teatro da Bahia para encenar MacBeth no interior do Forte dos Reis Magos. Foi simplesmente espetacular. Vi também, no velho forte, a apresentação do Coral Canto do Povo entoando canto Gregoriano. Regido, salvo engano, pelo padre (Monsenhor) Pedro Ferreira. Sem falar nos festivais de música que marcaram época, as pessoas assistindo trepadas no telhado. Por que será que não fazem mais coisas do tipo?


A figura de Jesiel Figueiredo faz parte do que há de melhor em minhas memórias. Desde criança o vi atuando e/ou dirigindo no palco do Alberto Maranhão. Em Auto da Compadecida, onde fez João Grilo, e de outra vez interpretando Severino, o chefe cangaceiro. Voltei a vê-lo em O Pagador de Promessas, quando ele viveu Zé do Burro. Muitos anos depois seu teatro infantil, que ele manteve heroicamente no palco do antigo cinema Olde, foi opção para eu levar as minhas crianças nos domingos à tarde. E asseguro a vocês, era uma produção esmerada. Jesiel ganhou um prêmio nacional de direção com a peça Calígula, de Camus. Viveu do teatro e para o teatro. Aplausos e merda para você, Jesiel, onde estiver.

Ah, sim, ia esquecendo. Comemorava-se o São João nos bairros, nas ruas, na cidade inteira. No arraial do Aquino, em Satélite; da Esmeralda, na Potilândia; na Ceasa; nas Cinco Pontas, lá nas quintas. E soltava-se balões, não aqueles enormes, ameaçadores, dos grandes centros, mas balões pequenos, bonitos, que levavam junto com eles nossos desejos e aspirações.

Em 1963… Meia Noite nas ondas do rádio (A Ronda dos Fantasmas)