Não sei explicar…
Ricardo Sobral – Advogado e escritor Há coisas que não se explicam e não adianta fazê-lo.

Ricardo Sobral - Advogado e escritor
Há coisas que não se explicam e não adianta fazê-lo.
Para o grande dramaturgo inglês, "há mais mistério entre o céu e a terra do que possa imaginar nossa vã filosofia". Nelson Rodrigues descobriu o "Sobrenatural de Almeida", fenômeno ghost que ocorre em estádio de futebol, capaz de desequilibrar um jogo em favor de um time não favorito.
Pois bem...
Há um restaurante no Recife, no Pina, especializado em frutos do mar, que é o meu predileto na "Veneza brasileira". Não tem perigo: indo por lá, geralmente a trabalho, dou meu jeito, arranjo espaço na agenda e vou almoçar. É a minha farra gastronômica.

Existem só em Salvador - matriz - e no Recife; o de Brasília não funciona mais, após o proprietário haver sido assassinado pelo gerente, que andou misturando o faturamento com o salário. O detalhe é que nunca encontrei nesse restaurante - ao contrário do de costume, até em além mar -, uma só pessoa realmente do meu círculo de conhecimento. Entretanto, nunca deixei de ser reconhecido, cumprimentado e até paparicado por pessoas que eu nunca vi em toda minha vida, já sexagenária.
É impressionante!
Certa feita, um cara cheio de mesura e uma certa lhaneza aproximou-se da minha mesa:
- Como vai? Quando encontrar o Fernandinho (Collor), avise por favor que vou vê-lo breve, em Maceió.
Noutra ocasião, uma senhora me perguntou se eu poderia conseguir ela ser recebida pelo governador da Paraíba.
Já faz um bom par de anos quando um sujeito, após apresentar esposa, filha, genro e neto, me informou que o conteiner já havia embarcado na Antuérpia.
O mais chato, confesso, é ter que corresponder aos acenos das outras mesas, vindos de pessoas que eu nunca vi mais gordas. O interessante é que eu nunca os contrario. Com poucas palavras, os satisfaço sorrindo e com conversas que não fogem do senso comum e do horizonte médio, afetas a qualquer vivente.

Numa certa oportunidade, ninguém ainda havia se manifestado. De repente, entra um cara de meia idade, histriônico, fazendo muito barulho, aproximou-se abrindo os braços de um surrado paletó branco
- Dr. Raniere, o senhor por aqui? Deu-me um abraço, desses capazes de fraturar costela e acrescentou sussurando:
- O senhor salvou o patrimônio da nossa família.
Não posso negar que me divirto muito. Mês passado, para ultimar tratativas profissionais com uma colega advogada, fomos almoçar no dito cujo. No final, a causídica não deixou barato:
- Adorei o almoço. Delicioso! Mas, da próxima vez vamos a outro restaurante, onde você seja menos conhecido.

Afinal, eu o conheço? 🤣🤣🤣🤣🤣👏👏👏👏🤝