JOSÉ ESTELO E SUA FESTA DE CORES

julho 16, 2023

Manoel Onofre Jr.

Manoel Onofre Jr. - Escritor e Magistrado aposentado

          José Estelo, pintor naif, desperta-nos interesse pela autenticidade de sua arte de autodidata. Ele morou em Laranjeiras dos Cosme, povoado – duas fileiras de casas paupérrimas, com uma capelinha de brinquedo no meio – a seis quilômetros de São José de Mipibu/RN.

          Na época, quando eu me aproximava do lugarejo, com o fim de visitar o artista, parei o carro frente a uma casinha de beira de estrada, procurando inteirar-me do local de sua residência. Ali ninguém o conhecia. Uma desconfiada matrona disse-me que o único pintor do seu conhecimento achava-se, então em São José, caiando uma casa. Logo deduzi: pintar, como atividade artística, é coisa que nunca passou pela cabeça de qualquer morador de Laranjeiras dos Cosmes, menos Estelo.

          Num meio assim, inocentemente hostil é comovente o surgimento deste artista nato.

            Estelo pinta somente casas, sobrados, igrejas. Paisagens sem figuras. Interessante como ele se mantém fiel e esta temática.

         Entre parênteses, uma observação: não é novidade, na Pintura Contemporânea, essa fixação em motivos arquitetônicos. No Brasil, por exemplo destaca-se o mestre Volpi, com suas estilizações de fachadas. Há outros nomes famosos (cito-os de memória), como José Paulo Moreira da Fonseca, captador da poesia dos portões antigos; Guignard, o transfigurador de Ouro Preto; e, em Natal, Dorian Gray, de certa fase. Todos estes, pintores cultos, refinados, donos de uma técnica, senhores de sofisticados artifícios. (O próprio Guignard, sim).

           José Estelo, porém, é ingênuo e, como tal, o primeiro – parece-me – com aquela constante temática ligada à arquitetura.

Pintor mipibuense José Estelo

         Como todo ingênuo verdadeiro, ele pretende retratar realisticamente o que vê, “fotografar” as coisas, porém falha neste intento, e é isto, justamente, o que o salva. Da não realização acadêmica resultam efeitos inesperados, muito felizes. Ou seja: acontece a celebrada graça ingênua.

         Ele tem sua técnica rudimentar, afirmada instintivamente. Exemplos: o traço fino e negro de contorno das imagens; a mistura de cores, com vistas a determinados efeitos (sombra, superfícies sujas, etc.); o uso especial do pincel sobre tinta grossa, de modo a sugerir, em relevo, grama ou capim. E etc.

            Estelo usa cores vivas e variadas, distribuindo-as com apurado senso. Daí uma pintura alegre, altamente decorativa. Para muitos, que enxergam, antes de mais nada, a miséria dos casebres-temas, isto é um mal. Eu não entendo assim. Desde que essa festa de cores se revele com autenticidade, não vejo por que condená-la. Detestável, sim, é a boniteza super-colorida de ingênuos estudados. Mas Estelo, como já disse e repito é autêntico.

Manoel Onofre Jr - Autor deste texto, publicado na Revista Paleta nº -07 - Junho 2023
Texto publicado na Revista Paleta

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