Homenagens sem plateias
Alex Medeiros – Jornalista e escritor [alexmedeiros1959@gmail.

Alex Medeiros - Jornalista e escritor [alexmedeiros1959@gmail.com ]
Há oitenta anos, Câmara Cascudo escreveu em um artigo no saudoso jornal A República: “Uma lei fundamental na Toponímia ensina que – rua velha, nome velho, rua nova, nome novo. É muito fácil, claro e lógico”. Um providencial conselho, uma sábia recomendação de quem, mais do que todos, conhecia as origens e valores históricos dos topônimos e compreendia à luz da cultura e das leis a força representativa dos nomes das cidades, das ruas e logradouros.
Não bastam os indecorosos descuidos com a cultura e a vergonhosa descaracterização do nosso pobre legado urbano, e ainda temos os recorrentes problemas e transtornos com a toponímia quando não há uma prévia ação de suporte educativo para que o local tenha receptividade popular. E no caso específico da troca de um nome velho por um novo complica mais ainda com a alteração de dados em documentos imposta pelo novo endereço.
Não é producente trocar nomes por mera necessidade política. Os nomes existentes são parte da cultura das cidades e da memória afetiva das pessoas. São até lembrados e eternizados nas artes, nos seus mais diversos aspectos.
O compositor Babal, meu velho parceiro musical de mais de 40 anos, cantou e popularizou em seu clássico que virou hino geracional: “Quando não era possível ter sonho / a gente tinha um / e ele girava em torno da Avenida Dez”.

Do Recife para o mundo, o cantor Alceu Valença viajou pelas ruas: “Rua das Ninfas, Matriz, Saudade, da Soledade de quem passou / Rua Benfica, Boa Viagem, na Piedade, tanta dor / pelas ruas que andei procurei te encontrar...”
Nos carnavais da Bahia dos anos 70, um frevo de Caetano Veloso puxou cordões: “a Praça Castro Alves é do povo como o céu é do avião”. Quem vai a São Paulo não esquece de ir no cruzamento das avenidas Ipiranga e São João.
Já nas folias dos anos 80, Moraes Moreira arrastou multidões chamando gente assim: “Do corredor da história / Vitória, Lapinha, Caminho de Areia / Pelas vias, pelas veias / escorre o sangue e o vinho / pelo mangue, Pelourinho”.
A toponímia é um fator importante do nosso tecido cultural. E me preocupam tanto o troca-troca extemporâneo dos nomes como a ausência de um trabalho comunicativo para que as pessoas aprendam e gravem os nomes na memória.
Natal é um grande exemplo da ausência disso. Poucas capitais têm tantos nomes oficiais que o povo simplesmente ignora. Quem frequenta o parque das dunas, o bosque dos namorados e sabe que seu nome oficial é parque Luiz Maria Alves?

Quem vai e vem na zona Norte pela ponte de Igapó, diz que ali é a ponte presidente Costa e Silva? Qual estudante universitário sabe que o centro de convivência da UFRN se chama Djalma Marinho?
Quem atravessa a Via Costeira, sabe que ela é Avenida Dinarte Mariz? Quantos chamam a ponte nova de ponte Newton Navarro, quantos chamam de complexo viário senador Carlos Alberto as vias no entorno do antigo Castelão?
Aliás, o leitor sabe que o nome oficial da Arena das Dunas é Marinho Chagas? Aprovado em Lei pela Assembleia Legislativa e até hoje sem uma placa decente, um monumento identificando a homenagem ao seu ídolo esportivo.

Quem muito conhece a avenida da Integração na Candelária não sabe que ali é Avenida Tarcísio Maia. Também não sabe que a avenida que liga a mesma Candelária à Cidade Satélite se chama prefeito Omar O’Grady.

Quem já ouviu alguém chamar a Praça das Mães de praça Martha Salem? Alguém chama o Parque da Cidade de Parque Dom Nivaldo Monte? O povo continua chamando de Bernardo Vieira a avenida que agora se chama Nevaldo Rocha. E mesmo um nome que pegou, como Roberto Freire, ainda há quem diga Estrada de Ponta Negra, assim como dizem Estrada da Redinha para a Avenida João Medeiros Filho. De que adianta batizar se o povo não vai adotar?

TRANSCRITO DA TRIBUNA DO NORTE