Foi há sessenta anos

maio 18, 2025

Alex Medeiros– Jornalista e Escritor (@alexmedeiros1959) – Texto publicado na Tribuna do Norte Eu sei que um dos assuntos do momento é o aniversário de 60 anos da TV Globo, fundada em abril de 1965.

Alex Medeiros- Jornalista e Escritor (@alexmedeiros1959) - Texto publicado na Tribuna do Norte

Eu sei que um dos assuntos do momento é o aniversário de 60 anos da TV Globo, fundada em abril de 1965. E sei também que a “estéticatriz” Paolla Oliveira vomitou estultice na TV Cultura contextualizando a matança de bebês no ventre materno. Então, o papo aqui é sobre os 60 anos do primeiro grandioso sucesso de uma telenovela no Brasil, transmitida pela TV Tupi.

Entre abril e agosto de 1965, enquanto a Globo afinava seus equipamentos e montava seu estúdio no Rio de Janeiro, lá em São Paulo a Tupi comemorava os picos no Ibope da novela O Direito de Nascer (alô, Paolla), adaptação de um romance cubano de 1946, do autor Felix Caignet, e que já havia conquistado o Brasil numa radionovela que foi ao ar em 1951 pelo dial da Rádio Nacional.

Com roteiro da dupla Thalma de Oliveira e Teixeira Filho, direção do trio Lima Duarte, Henrique Martins e José Parisi, a versão televisiva enxugou os 300 capítulos do rádio para 160 e parou o país no horário a partir das 21h30.

A história situada no começo do século XX, em Havana, narra a saga do médico Albertinho Limonta, interpretado por Amilton Fernandes, que foi criado por uma ex-escrava, a Mamãe Dolores, papel que coube a Isaura Bruno.

A mãe de Albertinho era a jovem sonhadora Maria Helena, filha do coronel Dom Rafael Zamora, que não aceitou a gravidez, levando a filha a refugiar-se num convento e entregando o filho à Dolores, que foge e protege o menino.

No papel de Helena, uma das maiores estrelas da TV brasileira, Nathalia Timberg, e como Dom Rafael um herói expedicionário da Batalha de Monte Castelo na Segunda Guerra e que se tornou ator, Elísio de Albuquerque.

Anos após a fuga de Mamãe Dolores, o garoto cresce, estuda medicina e adota posicionamentos idealistas, além de se apaixonar por uma garota que vem a ser sua prima Isabel Cristina, encarnada pela linda atriz italiana Guy Loup.

Desde São Paulo, a Tupi dividia a transmissão com a TV Rio e a partir das duas matrizes a novela era distribuída para todo o país, consagrando-se como o primeiro grande sucesso televisivo de um estilo já popular na radiofonia.

“A telenovela viria, fatalmente, era uma questão de tempo. Os cérebros da televisão iriam apelar, porque é um tipo de programa já testado no rádio. Era só botar no ar que a plebe iria se deslumbrar”, escreveu Stanislaw Ponte Preta.

O Direito de Nascer mudou hábitos e envolveu as famílias que se reuniam para acompanhar o drama amoroso de Albertinho e Isabel, perseguidos pela velha moral do avô de ambos. Ninguém dormia antes de assistir à telenovela.

Até jogadores de futebol acompanhavam a trama. Em 1 de abril de 1965, o elenco do América, do Rio atrasou de propósito a saída do ônibus para um jogo do campeonato, que só partiu depois de muita diplomacia dos dirigentes.

Meses após, isolados na concentração das Paineiras, os boleiros do Fluminense substituíram a sinuca, o baralho e o dominó das noites frias pelos capítulos da novela, e riam comparando o massagista com Mamãe Dolores.

Os jornais e revistas da época registram o último capítulo em 13 de agosto com o Maracanãzinho, no Rio, e o Ibirapuera, em Sampa, lotados para a exibição coletiva. Tudo literalmente parou no país, até missas e cultos evangélicos.

No carnaval de 1966, o grande sucesso no rádio foi a marchinha cuja letra dizia “Ai Dom Rafael / eu vi ali na esquina / o Albertinho Limonta / beijando a Isabel Cristina”.

Lá em Santos Reis, uma troça de meninos entre 6 e 10 anos descobria o direito de folia no meio da rua, batendo tambores de latas de leite Ninho cobertas em camadas de papel, todo encharcado de cola de goma.

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