DO POETA QUANDO JOVEM
Franklin Jorge – Jornalista, poeta e escritor Quando jovem, em dois dos três Vales (em Ceará-Mirim e Assu) do Rio Grande do Norte e, em Natal, procurava a companhia e a amizade de pessoas idosas, na suposição de que, através delas, teria acesso à memória de tempos idos e vividos.
Franklin Jorge - Jornalista, poeta e escritor
Quando jovem, em dois dos três Vales (em Ceará-Mirim e Assu) do Rio Grande do Norte e, em Natal, procurava a companhia e a amizade de pessoas idosas, na suposição de que, através delas, teria acesso à memória de tempos idos e vividos. Assim, estabeleci um parâmetro: não me aproximava de quem tivesse menos de 50 anos.
Toda a amizade que eu cultivava então. Daqueles verdes anos de minha infância rural, era com "gente antiga", como aquelas três negras velhíssimas que haviam sido escravas de João Ferreira da Cruz, tio paterno de minha avó materna. Gente de Taipu e do Mato Grande, agricultores e proprietários de terra que lhes davam o sustento e os faziam independentes das vicissitudes que permeiam a existência.
Toda vez que vínhamos à Natal e visitávamos nossa prima, Maria Ferreira - que para distinguimos de outras primas que tínhamos em comum chamávamos de Maria de Astrogildo, seu marido e pai de Hélio Segundo (à Rua Princesa Isabel).
Eu corria imediatamente para o amplo quarto onde viviam sobre camas forradas com alvíssimos lençóis e travesseiros as três negras imensas e velhíssimas, de amplos seios maternais que me abraçavam e cheiravam-me os cabelos ou me contavam histórias do "tempo da escravidão.
Teriam sido libertadas pelo pai de Tio João, antes da Lei Áurea. Uma dessas mulheres teria 114 anos, o que era sempre lembrado nas conversas. Eram consideradas "heranças de família"
[CONTINUA]