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agosto 13, 2023

Aracy, artista inimitável

Alex Medeiros – Jornalista e Escritor [alexmedeiros1959@gmail.

Alex Medeiros - Jornalista e Escritor [alexmedeiros1959@gmail.com ] Publicado na Tribuna do Norte

Em abril de 1990, o Brasil começou a parar mais uma vez às oito horas da noite diante da televisão, como se acostumou a fazer desde a década de sessenta. Era o entretenimento obrigatório da população com as telenovelas. Criada por Silvio de Abreu, a novela Rainha da Sucata trazia um timaço de craques da dramaturgia, tendo em Aracy Balabanian um portentoso e cativante papel, Dona Armênia, um nome que no imaginário do país lhe fez estrangeira.

O time estrelado em torno dela só dimensionou seu talento que já era conhecido desde a tenra juventude, quando ainda uma menina foi ouvir palestras de Augusto Boal e Oduvaldo Vianna Filho, dois monstros do tablado. O sonho de atuar no teatro veio aos 12 anos, a realidade aconteceu aos 16 e não parou mais, mesmo transportada para o palco da TV aos 20 anos. Foi sendo rainha da sucata na ficção que ela se tornou a grade dama da televisão.

Ser a mais luminosa dividindo a audiência com artistas como Gloria Menezes, Regina Duarte, Renata Sorrah, Nicette Bruno, Cleyde Yáconis e Aldine Müller não é para qualquer um. Ela fez isso ali e faria uma outra vez seis anos depois.

Quando a Globo botou no ar o humorístico Sai de Baixo, em 1996, eu me vi engrossando o cordão de milhões de brasileiros que esperavam acabar o Fantástico para acompanhar as presepadas no edifício do Largo do Arouche.

Miguel Falabella e Aracy Balabanian em Sai de Baixo, Foto: Notícias da TV

E ali estava Aracy, cumprindo seu papel de brilhar entre estrelas consagradas, como seu velho amigo Luís Gustavo (idealizador do programa) e Marisa Orth, a nova colega que estreou na televisão exatamente na novela Rainha da Sucata.

Sai de Baixo era o resgate mais que necessário do sitcom seminal da TV Record em 1967, A Família Trapo, uma blague com o sucesso mundial da “Von Trapp Family”. Dialogava também com I Love Lucy e Dick Van Dyke Show.

Muitas vezes, Aracy nem precisava ter fala; sua presença cênica era um poço de referências teatrais e televisivas de onde os criativos Miguel Falabella e Tom Cavalcanti retiravam improvisos a partir da sua biografia e das vivências.

Impagável o episódio em que todos estão errando as falas e Miguel dedo em riste no rosto de Aracy: “não diga nada, eu vou dizer... eu posso imaginar ela em Natal, ela tem mania de, ah, eu vou tirar tudo que eu não quero marquinha”.

E segue arrancando gargalhadas da plateia na gravação do programa e nas multidões pelo país afora, enquanto a atriz esconde o rosto: “nua lá em Natal, naquelas dunas, os seios passando pela areia escaldante, shshshshsh...”

A figura de Balabanian sempre me remeteu aos primeiros anos do ginasial, quando a partir de 1970, com “Irmãos Coragem”, a molecada seguiu o exemplo dos homens adultos e adotou algumas novelas, como A Fábrica, de 1971.

Fazendo par romântico com Juca de Oliveira, Aracy era Isabel, ambos protagonistas de uma trama que marcou a história das telenovelas, que o autor Geraldo Vietri chamou de “novela de comunicação”, atingindo a classe média.

Desde 1964, aquela era a nona novela da atriz e a terceira com grande audiência. Nas duas anteriores, Antônio Maria (1968) e Nino, o Italianinho (1969) – ambas também de Geraldo Vietri – ela catapultou a carreira televisiva.

E pensar que tinha só 22 anos quando foi convidada para compor o elenco que inauguraria a nova fase do TBC, Teatro Brasileiro de Comédia, na companhia de Lelia Abramo, Cleyde Yáconis e Carmen Silva em “Os Ossos do Barão”. 

Entre 1967 e 1970, antes dos 30 anos, ganhou diversos prêmios e foi eleita várias vezes a melhor atriz em troféus como o “Imprensa” e escolhida pela APCT, Associação Paulista dos Críticos de Teatro. Ela dizia que desde criança aprendeu a cantar músicas de Noel Rosa, e adorou quando surgiu a novela A Fábrica, o mesmo tema do samba “Três Apitos”, seu preferido. 

Como atriz, ela foi “artigo que não se imita”. 

Aracy Balabanian, ícone da TV brasileira, nos deixa, aos 83 anos Foto: VEJA

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