A minha primeira pauta policial que não sai da minha cabeça
Anderson Régis – Fotojornalista O fotojornalismo sempre fez parte da minha vida, desde a infância, juventude e, agora, na vida adulta, nos jornais Tribuna do Norte, Diário de Natal, Correio da Tarde e Revista Placar.
Anderson Régis - Fotojornalista
O fotojornalismo sempre fez parte da minha vida, desde a infância, juventude e, agora, na vida adulta, nos jornais Tribuna do Norte, Diário de Natal, Correio da Tarde e Revista Placar. Pelo que percebo no futuro, vai virar um arquivo de jornais em nossa casa. Sempre admirei o trabalho de fotojornalismo, exercido por meu pai, desde 1995 e que, ainda, trabalha na Tribuna do Norte.
O tempo foi passando, eu ingressei na mesma profissão de meu pai - Fotojornalismo -, e recebi um convite do secretário Marcos Alexandre, para trabalhar na Secretaria de Comunicação, da Prefeitura do Natal (Secom). O trabalho era bem simples e prazeroso: acompanhar e fotografar o gestor municipal nas reuniões e eventos da prefeitura. Meu salário era razoável, para um rapaz solteiro. Só gastava no McDonald's, jogos de videogame...uma parte, repassava ao meu pai para ajudar nas despesas domésticas.
Mas, no sábado, dia 14 de janeiro de 2017, o meu olhar fotográfico mudou. Meu pai entrou de férias do jornal e sugeriu ao então editor-chefe de redação da Tribuna do Norte, Carlos Peixoto para que o seu filho, ocupasse seu lugar de fotojornalista, no período de suas férias, o que foi prontamente aceito. Na época, tinha uns 21 anos de idade e vibrei em trabalhar no melhor jornal da cidade.
No dia seguinte, Carlos Peixoto pautou para eu ficar no plantão do jornal, durante o final de semana. Passei os dias na redação da Tribuna do Norte. Lá estavam grandes nomes do jornalismo da cidade: Paulo Macedo, Rubens Lemos e Aura Mazda, o diagramador Chiquinho, entre outros...
Olhando pelo canto do olho, percebi Chiquinho com uma garrafa de "Brahma" (era como pedíamos cerveja, na época), em cima da mesa de reuniões de pauta. Aceitei o convite e tomei duas cervejas, me desculpando por ter que ir embora, para ir ao aniversário de 15 anos.
Estava descendo as longas escadarias da Tribuna do Norte (quem conhece o labirinto do sobe e desce da TN?) para ir para casa, me preparar para o aniversário, quando recebi uma mensagem da repórter Aura Mazda avisando a aguardasse na redação, pois havia surgido uma pauta de emergência. Curioso, perguntei: - Qual é a pauta?
Ela me respondeu; - "Vamos para Presídio de Alcaçuz, em Nísia Floresta, onde está ocorrendo um motim entre os presos".
Entramos no carro e partimos em alta velocidade para o local da rebelião. No caminho a jornalista Aura Mazda me orientava sobre o registro e as imagens da máquina em que deveria focar. Admirei a maneira dela me orientar sobre o trabalho que iria desenvolver naquele motim.
Chegamos ao presidio de Alcaçuz já era noite. Ao nos aproximarmos do presídio, já havia familiares dos presos que sem saber da situação dos presos esperavam notícias de parentes. Havia muito barulho e confusão no interior do presídio. Bastante assustado, procurava apoio próximo a jornalista, companheira de pauta.
As horas foram se passando, parecia uma eternidade. Ao nosso redor, eu observava os familiares desesperados, se comunicando com presos pelo celular; ouvia-se choro dos familiares. Peguei minha câmera fotográfica e clicava a máquina, em direção dos familiares desesperados. Nisso apareceu na lente de minha máquina, uma menina sentada no chão e segurando um gatinho, cor branca. Imediatamente me veio a lembrança a cena do filme "Orfeu" (1998), enredo inspirado na mitologia grega, na história de Orfeu e Eurídice, onde Eurídice segurava um gato e cantava a canção "Orfeu sou Você" , interpretado por Tony Garrido.
Quando apertei o botão da máquina, disparou o flash no meio da escuridão assustando o gato, que saiu em disparada, do colo da garotinha. Só me restou, ir até ela e me desculpar.
Amanheceu o dia e, já bastante cansado, subi as dunas próximas ao presidio observando o movimento no interior da penitenciária. Encontrei o melhor ângulo, da Tropa de Choque entrando no presídio. Outro momento que conseguir captar foi a equipe do Instituto Técnico-Científico de Perícia (ITEP) fazer a contagem dos corpos e outros procedimentos. Imediatamente, enviei as fotos, por WhatsApp para o jornal. O editor-chefe gostou das fotografias. Finalmente cumprimos a pauta, e nós retornamos às nossas casas, para um merecido repouso, depois de horas, sem dormir.
Na segunda-feira cheguei logo cedo ao jornal e vi o colunista Paulo Macedo (in memória) observando as fotos da rebelião. Meio tímido, me aproximei e perguntei: - E então, Paulo, gostou das fotos?"
Ele olhou fixamente para mim e de pronto respondeu: "- adorei querido, fotos de jornalismo profissional puro. Tem fotos 'pesadas' mas, é isso mesmo".